Convidados sugerem substituição do modelo de concessão do transporte público

Discutir questões de mobilidade que envolvem meios de transporte de Belo Horizonte, com foco nos temas bilhetagem eletrônica, remuneração de operadores e tecnologia foi o objetivo principal da audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário realizada nesta quinta-feira (16/9), a pedido de Braulio Lara (Novo). O evento contou com a participação de representantes da empresa Planum – Planejamento e Consultoria Urbana Ltda., Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e BHTrans, que expuseram a necessidade de mudanças estruturais no sistema de transporte, como substituição do modelo de concessão por outro, como o de contrato; melhoria e amplificação das tecnologias para usuários, empresas operadoras e poder público; integração entre linhas e sistemas, dentre outras questões. Durante a reunião, Braulio apresentou o Plano “Mobilidade BH”, solicitado por ele à comissão com a intenção de “trazer BH para um novo patamar de mobilidade urbana”.
O objetivo do Plano é aprofundar e desenvolver análises sobre mobilidade urbana em BH nos seguintes eixos: modais de transporte aplicáveis a BH e a possibilidade de integração; otimização da rede de atendimento do transporte público (troncos viários e capilaridade regional); formas de financiamento do transporte público e integração tarifária; reestruturação concorrencial do mercado; uso de tecnologias para melhoria da qualidade dos serviços e fomento dos conceitos de cidade inteligente. Durante a reunião, Braulio Lara defendeu três pontos: remuneração das empresas operadoras por km, ampliação do índice de satisfação do usuário e bilhetagem integrando sistemas tecnológicos. O estudo corrobora opniões de vários convidados.
Sistema atual
Annie Oviedo, analista de Mobilidade Urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Ibec), falou sobre o modelo de transporte público atual, “financiado quase que exclusivamente pela tarifa”, em que “as empresas concessionárias são remuneradas por essa tarifa diretamente”, recolhendo o montante total e dividindo entre si. Com isso, o poder público tem controle sobre o número de usuários, mas não sobre “entrada dos sistemas”. Ela citou “colapso generalizado no sistema de transporte”, especialmente depois da pandemia, com redução do número de linhas e de frequência, dentre outros problemas. O modelo “por passageiro transportado”, vigente desde 2008, causa, para a representante, uma precarização do serviço, pois a diminuição do número de passageiros requer aumento de tarifas, resultando em aumentos cada vez maiores e redução do serviço e/ou perdas graves. Essa situação impacta diretamente no direito à mobilidade, pois, para o operador, compensa reduzir linhas. “É muito necessário que se caminhe de um modelo concessionário para um modelo de contratação”, um “modelo de remuneração que seja por serviço”, disse Annie. Segundo ela, a Prefeitura pagaria as empresas a partir do serviço, por km rodado, sem custo incorrido (custo registrado no período em que ocorreu, ou seja, independentemente da data do pagamento agendado).
Em relação à bilhetagem, a analista afirmou que “a Prefeitura dá a concessão de sistema sobre o qual não tem nenhum tipo de controle”, sujeito a fraudes e “na mão dos operadores”. A convidada aposta numa proposta de conceder a bilhetagem a uma terceira empresa. Quanto à tecnologia, relatou problemas como painéis de horários de ônibus apenas nos pontos centrais e dificuldade de recarregar o cartão, devido à centralização dos pontos de recarga, do pagamento geralmente em dinheiro e da falta de agentes de bordo. Por fim, defendeu um “sistema de código de dados abertos para se conectar a outros sistemas”, como os dos bancos.
Contratos e tecnologia
Contratos longos, mas não rígidos, foi uma ideia aventada por Renata De Filippo Machado, urbanista e coordenadora técnica da empresa Planum – Planejamento e Consultoria Ltda. Para ela, com base no modelo atual, citado por Annie Oviedo, “a decisão do ‘sim’ e do ‘não’ da tarifa acaba sendo política”. A urbanista também defendeu um novo modelo de transporte coletivo, com base na desvinculação entre receita e tarifa. “A bilhetagem não é um simples meio de arrecadação, mas uma meio de pesquisa ríquissimo” para “entender o desejo dos passageiros”. Renata destacou o “nível assombroso” da sobreposição de linhas e se queixou de estarmos atrasados, pois nosso “modelo de negócio” se baseia nos anos 1950.
A questão dos contratos também foi abordada pelo engenheiro da Planum, Luiz Wagner Dacache Balieiro: “o contrato de 35 anos é longo, mas tem que ter parâmetros de alteração desses contratos”, o “prazo não pode ser aleatório”. Ele é contra especificar um custo de transporte em um País com variações como inflação, impostos e outras perdas: “podemos discutir novas tecnologias, novos modelos”, mas nada pode ser “amarrado na última estrutura, porque estava previsto no edital”. Ainda segundo Luiz, a oferta hoje é 48% maior que a demanda”, e a cidade teria perdido 40% de usuários. O engenheiro chamou a atenção, ainda, para a necessidade de discutir de novo a integração entre sistema metropolitano e sistema municipal e, assim como Renata Machado, alertou para uma grande superposição de linhas.
Tecnologia foi o tema específico trazido por Gustavo Wagner Nunes Balieiro, também engenheiro e coordenador técnico da Planum. Ele contou que os “anos de ouro” do transporte foram na década de 1990, quando a única opção era o transporte coletivo. A grande mudança de mercado veio em 2013, quando a “hiperdigitalização proporcionou diversas facilidades” e, com ela, maior controle e eficiência, o que, “por si só já muda a estrutura do sistema”. Entretanto, o atraso na dicussão sobre transporte também foi apontado por ele, pois, enquanto estaríamos discutindo sistemas de bilhetagem e cobrança, países desenvolvidos debatem sobre carros autônomos. Gustavo defendeu, ainda, que o poder público tenha todos os dados sobre o transporte e os forneça de forma aberta, e que o dimensionamento da frota de ônibus municipal seja feito baseado na “curva de demanda”, com preços diferentes para diferentes horários, por exemplo.
BHTrans
O gerente de Controle, Estudos Tarifários e Tecnologia da BHTrans, Eriênio Souza, representando o presidente da empresa, Diogo Prosdocimi, afirmou que “a Prefeitura tem diversos dados abertos” e “todos os aplicativos têm livre acesso” para conseguir esses dados. Sobre a integração do transporte na RMBH, ele lembrou “algumas experiências que a gente pode estudar”, como uma tarifa menor para atrair usuários que não utilizam ônibus.
Também foi apresentado pelo representante o Sistema Inteligente de Transporte do Município de Belo Horizonte (SITBus), um sistema integrado de gestão, monitoramento e informação do transporte coletivo municipal que “utiliza uma lógica de automatização e sistematização de processos e sistemas necessários à prestação de serviços, informação aos usuários e gestão do sistema de transporte coletivo”. Entretanto, Eriênio apontou problemas, como o fato de que os sistemas integrantes do SITBus não mantêm um ligação tecnológica entre si; a concentração dos pontos de recarga de bilhetes eletrônicos na Região Central e Avenidas Antônio Carlos e Cristiano Machado, com vazio na provisão de serviços em outros locais; além de distorção na compra pelos canais digitais.
Além dos convidados e do vereador solicitante, particparam da reunião os vereadores Gilson Guimarães (Rede), Henrique Braga (PSDB) e Rogerio Alkimim (PMN).
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional