DIREITOS HUMANOS

Gestão de serviços públicos por ente privado deverá ser mais debatida

Diante das dúvidas manifestadas por sindicalistas e conselheiros, vereadores pedem mais diálogo

terça-feira, 11 Agosto, 2015 - 00:00
Vereadores Adriano Ventura e Pedro Patrus questionaram iniciativa da prefeitura e pediram mais diálogo  (Foto: Mila Milowski)

Vereadores Adriano Ventura e Pedro Patrus questionaram iniciativa da prefeitura e pediram mais diálogo (Foto: Mila Milowski)

A proposta de criação de uma entidade paraestatal autônoma com a finalidade de gerir a oferta de serviços nas áreas de assistência social e educação no município, prevista em projeto de lei do Executivo, foi questionada nesta quarta (11/8) em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor. Verificando o desconhecimento geral em relação à matéria, que não teria sido apresentada ou discutida com servidores, conselhos e outros órgãos e entidades pertinentes, o requerente Pedro Patrus (PT) solicitou maior esclarecimento dos envolvidos e mais diálogo com a prefeitura a respeito do modelo proposto, antes de sua apreciação em Plenário.

Na abertura do debate, Patrus e o colega Adriano Ventura (PT) comemoraram a aprovação, este ano, do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) na capital, elogiando a participação de vereadores, entidades e especialistas na formatação da proposta, sancionada sem vetos pelo prefeito Márcio Lacerda. Já o Projeto de Lei 1581/15, que institui o Serviço Social Autônomo Organização de Assistência Social e Educação (SSA-OASE) para o fomento de serviços especializados nessas áreas, segundo Patrus, teria sido elaborado de forma unilateral, sem a realização prévia de consultas, explicações ou debates com as partes envolvidas, a exemplo de outras propostas da atual gestão.  

O encaminhamento da proposta sem o devido esclarecimento e discussão sobre suas disposições, segundo o parlamentar, motivou a solicitação da audiência, proporcionando uma oportunidade de avaliação de sua pertinência e os possíveis impactos na qualidade do atendimento prestado aos usuários do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e da rede municipal de educação. Na reunião, vereadores, conselheiros municipais de assistência social e de educação, Fórum dos Trabalhadores do SUAS e representantes do Ministério Público manifestaram receio de que a delegação dessas atividades, especialmente no tocante à contratação de pessoal, resulte na precarização dos serviços.

No entendimento dos vereadores, a proposta constituiria uma “manobra” para burlar a determinação do Ministério Público, que proíbe a terceirização de funções inerentes ao poder público, especialmente em suas atividades-fim.  Eles criticaram ainda a composição do conselho de administração da entidade, prevista no texto, que inclui quatro representantes do Executivo e dois da sociedade civil – oriundos dos Conselhos Municipais de Assistência Social e de Educação, também indicados pelo prefeito. Os outros dois membros serão escolhidos entre pessoas com, no mínimo, três anos de experiência em grandes empresas privadas, exigência questionada pelos vereadores.

Além da não participação dos conselhos na elaboração da matéria, outra crítica apresentada diz respeito à destinação orçamentária da PBH para a execução da proposta, antes mesmo de sua aprovação, sinalizando pouca disposição ao diálogo e consideração pelas demais instâncias de debate e deliberação.

“Brecha” para terceirização

O texto prevê que, por meio de contratos e convênios celebrados com o poder público, a SSA-OASE execute serviços, programas, projetos e ações de assistência social e no âmbito da política educacional, a exemplo do Programa Escola Integrada. Representando a prefeitura, a assessora jurídica Luana Magalhães e os gerentes das secretarias municipais de Educação, Recursos Humanos e Assistência Social, Alexsandro Gomes, Daniele Queiroz e Shirley Pires, negaram que a proposta configure uma terceirização ou privatização de função pública.

Os servidores lembraram que a atuação de entidades e organizações na política de assistência social é um dos pilares do SUAS e defenderam a criação da entidade autônoma no modelo do chamado “Sistema S” para instituir e gerir essas parcerias. Para eles, o gerenciamento por meio de entidade paraestatal é uma experiência consolidada, que já se mostrou eficaz em outros setores, que não invade a competência ou retira das mãos do governo a definição de diretrizes e metas a serem alcançadas.   

O uso da expressão “serviços, programas, projetos e ações“, no entanto, foi apontado pelos participantes como a principal preocupação em relação ao projeto e seus possíveis desdobramentos. Para o presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Belo Horizonte (Sindibel), Israel Arimar, os termos utilizados não especificam ou delimitam a atuação da entidade, abrindo “brechas” para a delegação e terceirização de todas as atividades dessas áreas, legalmente atribuídas ao setor público. A mesma preocupação foi manifestada por diretores e membros dos Conselhos Municipais de Assistência Social e de Educação, que questionaram ainda a transparência e o controle social das ações da entidade.

Reunião entre as partes

As promotorias de Patrimônio Público e de Direitos Humanos do MP, por meio de seus representantes Júlio César Luciano e Cláudia Amaral Xavier, destacaram a vedação imposta ao órgão sobre a prestação de consultoria jurídica, que os impede de discorrer sobre a legalidade da medida, e a impossibilidade do órgão em fornecer pareceres sobre ações e iniciativas da prefeitura antes que elas existam ou ocorram de fato. De acordo com a Dra. Cláudia, a principal preocupação do órgão no momento diz respeito à urgência da contratação de recursos humanos para suprir as deficiências geradas pelo fim do convênio com a AMAS e a ausência de respostas ao chamamento público realizado pelo município, que poderá desguarnecer áreas importantes como o atendimento a pessoas em situação de rua.

Como encaminhamento da audiência, os participantes concordaram em agendar conjuntamente uma reunião com os titulares das secretarias pertinentes, com a participação de membros do Legislativo, Ministério Público, conselheiros, sindicato e servidores, no intuito de obter mais esclarecimentos e apresentar eventuais objeções à proposta, antes que ela seja encaminhada ao Plenário. A construção conjunta de uma política consistente para essas áreas, antes de sua implantação, evitará em um futuro próximo a necessidade de, nas palavras de Patrus, “trocar os pneus com o carro andando”.

Superintendência de Comunicação Institucional