RACISMO ESTRUTURAL

Acesso da população negra a políticas públicas é desafio, sobretudo na pandemia

Aspectos sociais do racismo estrutural foram discutidos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos

segunda-feira, 10 Maio, 2021 - 21:15

Foto: Bernardo Dias/CMBH

Além de apresentarem maiores taxas de desocupação e informalidade do que brancos, a população negra está mais presente nas faixas de pobreza e extrema pobreza e é a que mais sofre com a violência policial e a dificuldade de acessar as políticas públicas. Os aspectos sociais relacionados ao racismo estrutural foram debatidos nesta segunda-feira (10/5) pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor em audiência pública. Autora do requerimento, a vereadora Macaé Evaristo (PT) argumentou que a pandemia trouxe consequências graves para a população negra e pobre do país e que é preciso “avançar na redução das desigualdades, da fome, abordar a questão do trabalho e renda e também falar da necessidade de ter uma renda básica, um auxílio emergencial”. A vereadora explicou que nesta semana em que se comemora o Dia da Abolição da Escravatura, 13 de maio, “devemos nos atentar para esta data de luta e de denúncia e aprofundar nesta temática racial”. 

Ao destacar que a representatividade negra na Câmara Municipal é um avanço e que facilita a empatia quando se trata de questões raciais, Dandara Elias, fundadora do Instituto Todo Black é Power, salientou que é preciso discutir a vivência e não apenas a sobrevivência do povo preto. Para ela, é muito importante avançar em políticas públicas que possam promover a cidadania por meio de projetos estruturados a partir de uma pauta antirracista, que busque a emancipação das pessoas pretas.

Sócio Fundador do Back to Black Afro-Pub, Warley Barros questionou por que um espaço cultural que exalta a cultura negra foi visitado semanalmente pelo poder público, em especial pela Polícia Militar, por causa de denúncias de aglomeração, de descumprimento das normas sanitárias. “Mesmo sem identificação de qualquer problema e estando em uma rua com vários estabelecimentos comerciais, o meu era o único averiguado constantemente. O resultado foi a perda crescente de clientes e a consequente dispensa de funcionários”, denunciou. Macaé chamou atenção para esta forma de intimidação como maneira de externar o racismo. “A averiguação constante é um dos múltiplos mecanismos que faz com que o racismo estrutural se manifeste”, disse. 

Mercado de trabalho e discriminação

Ao informar que a cada quatro jovens assassinados três são negros, a militante do movimento negro e representante do Coletivo Nacional de Entidades Negras, Luana de Souza, afirmou que a população negra está em uma situação de miséria, de vulnerabilidade, sem acesso à informação, à educação e à cultura e que é urgente implementar políticas públicas que garantam a inserção de jovens negros no mercado de trabalho, por meio de ensino técnico. Com dados estatísticos, que mostram que a cada quatro jovens assassinados três são negros, ela solicitou que os vereadores garantissem a aplicação da Lei 10.639/2003 para que “as crianças e os adolescentes tenham acesso e conheçam a história do povo preto, para entender que o racismo existe de uma forma estruturada dentro da sociedade”.

Já a advogada Rayhanna Fernandes quer que os parlamentares reconheçam que o racismo estrutural existe para que possam trabalhar a questão racial de uma forma mais incisiva. Co-coordenadora do Grupo de Extensão e Pesquisa da UFMG, ela ponderou que a falta de reflexão sobre a pauta racial perpetua um sistema de discriminação que, baseado em estereótipos predeterminados, dita qual deve ser a ocupação dos negros no mercado de trabalho.

A falta de políticas públicas voltadas para o cuidado com as mulheres pretas, faveladas e mães foi o destaque da fala da atriz, diretora de teatro e dramaturga Herlen Romão. Formada em Assistência Social e mestranda em Educação, ela afirmou que as mulheres sempre cuidam da família e negligenciam o próprio cuidado e que neste momento de pandemia, muitas não têm com quem deixar os filhos, não raro pessoas com deficiência desamparadas pelo poder público. Ela argumentou que a maior parte das moradoras de favelas trabalham com estética – ramo muito afetado pela pandemia – e estão sem recursos para subsistência. “Da mesma forma, estão as comerciantes locais – a maioria preta –, e as artistas faveladas. E não há política pública com recorte para essa população. A maioria está voltada para não morrer de fome nem de covid”, afirmou Herlen Romão. Por fim, a atriz pediu que seja feito um levantamento estatístico com recorte racial para identificar os efeitos da pandemia na população preta e na população favelada que, de acordo com ela, são os mais atingidos e as maiores vítimas. 

Políticas públicas 

Diante do exposto, o subsecretário de Direito e Cidadania de Belo Horizonte, Thiago Alves Costa, afirmou que a Prefeitura busca combater os diversos tipos de racismo. Ele destacou a importância de trabalhar com estatísticas no combate ao racismo e o esforço conjunto com outras secretarias seja para implementar o Plano de Promoção da Igualdade Racial seja para capacitar agentes públicos para que eles possam perceber esses fenômenos de racismo e possam mudar essa realidade. 

Diretora de Reparação e Promoção da Igualdade Racial, órgão ligado à Subsecretaria Municipal de Direito e Cidadania, Makota Kizandembu informou que BH é pioneira na política de igualdade racial e destacou o trabalho de enfrentamento ao racismo institucional desenvolvido pela Prefeitura. “Das formas de racismo estrutural, o institucional é utilizado pelos racistas para impedir a população negra, indígena ou cigana de ter acesso às políticas públicas”, afirmou. A diretora argumentou que o Conselho Municipal de Igualdade Racial é a principal ferramenta para que a população negra de BH proponha, fiscalize e monitore políticas de igualdade racial e que é necessário pensar em um plano de desenvolvimento econômico para a população negra.

Ao ser indagada pela vereadora Macaé sobre a insistente e desnecessária fiscalização, por parte dos poderes públicos municipal e estadual, de estabelecimentos que valorizam a arte e a cultura negra, conforme relato do proprietário do espaço cultural Black to Back, a diretora Makota esclareceu que denúncias de abusos podem e devem ser encaminhadas ao Conselho de Promoção da Igualdade Racial. Segundo ela, a diretoria tem diálogo direto com a Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção e “esse diálogo tem mudado muito os rumos e os comportamentos da Secretaria de Segurança e Prevenção na cidade de Belo Horizonte”. 

Assista ao vídeo da reunião na íntegra. 

Superintendência de Comunicação Institucional 

Audiência pública para discutir o racismo estrutural em Belo Horizonte - 13ª Reunião Ordinária - Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor