Grupo recomenda rejeição de veto a PL que classifica igrejas como essenciais
O veto segue, agora, para apreciação em Plenário, que pode mantê-lo (arquivando o texto) ou derrubá-lo (transformando-o em lei municipal)
Foto: Cláudio Rabelo / CMBH
Em decisão unânime, a Comissão Especial constituída para apreciar o veto total do prefeito Alexandre Kalil (PSD) ao Projeto de Lei 1016/2021, que considera igrejas, templos e santuários religiosos como serviços essenciais, recomendou ao Plenário a sua derrubada. Contestando as razões apresentadas pelo prefeito para barrar a proposta, de autoria de Henrique Braga (PSDB), o relator Nikolas Ferreira (PRTB) argumenta que, conforme rege a Constituição Federal, a liberdade de culto é um direito inviolável, que contribui para a concretização da dignidade da pessoa humana. O parlamentar afirmou, ainda, que o Decreto Federal 10.292/2020 já assegura funcionamento e regular realização de atividades religiosas de qualquer natureza, exigindo-se, apenas, que sejam seguidos protocolos sanitários; e que Medida Provisória da presidência da República não afasta competência concorrente, em termos de saúde, de estados e municípios. A decisão final caberá ao Plenário, que poderá manter o veto (arquivando o texto) ou derrubá-lo (transformando-o em lei municipal); para derrubar o veto é necessário que 21 vereadores (maioria da Câmara) votem por sua rejeição.
O veto do Executivo foi publicado no Diário Oficial do Município (DOM) no último dia 24 de novembro, tomando por base a Lei Federal 13.979/2020, sob a alegação de que a matéria é inconstitucional e de que cabe somente à PBH o poder de classificar atividades essenciais durante uma pandemia.
Direito inviolável
Contestando as razões do veto apresentadas pelo Executivo, como inconstitucionalidade por transgressão de norma geral editada pela União (Lei Federal 13.979/2020); e violação ao princípio da separação dos poderes, tendo em vista o engessamento da atuação do Poder Executivo nas ações de combate à pandemia ao classificar as igrejas como essenciais, o relator argumenta, em seu parecer, que o direito à liberdade de culto é inviolável, conforme o art. 5° da Constituição Federal.
Nesse sentido, segundo ele, o exercício da religião é parte do minimo existencial para a concretização da dignidade da pessoa humana; e medidas que garantam apenas culto doméstico e privado, com permissão de transmissão on-line de cerimônias, passam a ideia de que o exercício público da religião é uma concessão do Estado, que o permite em determinadas circunstâncias; e não um direito da pessoa humana, reconhecido pelo Estado.
Ordenamento jurídico
Nikolas ressaltou, ainda, que a ordem jurídica brasileira já reconhece as atividades religiosas como essenciais. O Decreto Federal 10.292/2020 já assegura o funcionamento e regular realização das atividades religiosas de qualquer natureza, exigindo-se, apenas, que sejam seguidas medidas sanitárias.
Para o vereador, os decretos editados pelo Executivo são, estes sim, inconstitucionais, transgredindo decretos federais, a Consttituição e tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) da Organização das Nações Unidas (ONU), que defende o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião.
No relatório, Nikolas salienta também Medida Provisória da presidência da República, que não afasta competência concorrente, em termos de saúde, de estados e municípios. Assim, para o parlamentar, não há de se falar em vício formal de inconstitucionalidade, muito menos em violação ao princípio da separação dos poderes, tendo em vista decretos federais que estabelecem as atividades religiosas como serviços essenciais, aliado ao julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que estabeleceu a competência concorrente da União, estados, Distrito Federal e muncípios em termos de saúde. Desta forma, o vereador reafirma que a proposição somente suplementa a legislação federal à realidade do Município de Belo Horizonte. Em suma, argumenta que decreto municipal que não regulamenta nenhuma lei ou somente complementa outro decreto padece de vício de legalidade.
Diante do exposto, para Nikolas, a proposição que classifica igrejas, templos e atividades religiosas em geral como serviços essenciais está consubstanciada e amparada pela Constituição, bem como por legislação infraconstitucional, motivo pelo qual justifica-se a derrubada do veto.
Argumentações apresentadas
Na reunião, Professor Claudiney Dulim (Avante) avaliou como “genéricas e sem embasamento jurídico” as razões do veto do prefeito; e que é preciso haver uma flexibilização da interpretação do texto constitucional, respeitando-se a democracia e o contexto atual e garantindo-se o direito à vida, incluindo a vida espiritual. Além disso, apontou que a competência da matéria não é somente da União, mas também de estados e municípios; e que o Legislativo deve exercer o seu protagonismo.
Irlan Melo (PSD) defendeu, por sua vez, o direito à liberdade, à consciência, à crença e ao livre exercício de cultos religiosos, além da proteção a locais de culto e liturgias e a liberdade sustentada pelo Estado Democrático de Direito. Enfim, disse que o Direito precisa garantir o resgate de práticas religiosas na cidade.
Marcos Crispim (PSC) salientou a função acolhedora, a responsabilidade social da igreja e a importância do apoio da mesma nesse momento às pessoas, muitas vezes impedidas de realizarem velórios no contexto pandêmico. Professora Marli (PP), que preside a Comissão Especial, falou sobre os efeitos benéficos da religião no enfrentamento de doenças físicas e mentais; e da importância de convicções e práticas religiosas.
Veto
Ao vetar a proposta, Kalil afirmou que, por se tratar de medida direcionada à contenção e avanço da pandemia, a definição sobre a essencialidade de atividades e serviços constitui matéria afeta ao poder de polícia sanitária exercido por órgãos técnicos, submetendo-se ao princípio da reserva de administração, que impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em temas sujeitos à competência administrativa do Poder Executivo. Entre as razões do veto, o prefeito destacou que a gravidade e dinamicidade da pandemia exigem uma revisão contínua de ações de combate e adoção de providências urgentes. De acordo com o chefe do Executivo, por isso se faz imprescindível a regulamentação do tema via atos infralegais, os quais, diversamente das leis, podem ser rápida e sistematicamente alterados, de modo a acompanhar a evolução do contexto epidemiológico do Município, resguardando a saúde da população.
Parecer da Procuradoria-Geral do Município sustenta que não compete ao Poder Legislativo classificar, por meio de lei, a prática de qualquer atividade ou serviço como essencial em tempos de emergência sanitária, sob pena de esvaziamento e engessamento da atuação do Poder Executivo e de seus órgãos técnicos, em violação ao princípio da separação dos poderes, conforme artigo 6º da Lei Orgânica do Município e do artigo 6º da Constituição Estadual.
Projeto de lei
Aprovado em 2º turno no Plenário da Câmara, o PL 1.016/2021 tem como objetivo assegurar que igrejas, templos e santuários religiosos possam permanecer abertos e prestando ajuda espiritual e assistencial às comunidades religiosas. Para o autor do PL, Henrique Braga, cultos e serviços religiosos tornam-se ainda mais importantes durante a atual pandemia, dado que teriam a função de auxiliar pessoas que passam por perdas familiares, desemprego e falta de renda como consequências nefastas da atual crise de saúde pública.
Atualmente, as atividades religiosas coletivas estão permitidas em BH, desde que os templos garantam o cumprimento de regras sanitárias, como o uso de máscaras e o distanciamento de um metro entre as pessoas.
Participaram da reunião Professora Marli, Nikolas Ferreira, Irlan Melo, Wesley (Pros), Professor Claudiney Dulim e Marcos Crispim.
Superintendência de Comunicação Institucional