DIFÍCIL RESOLUÇÃO

Falta de efetividade nas políticas públicas agrava fenômeno de população de rua

Políticas deveriam garantir mais do que um lugar para dormir e alimento diário. Parcerias com comunidades terapêuticas podem ser caminho

terça-feira, 28 Março, 2023 - 17:45

Foto: Bernardo Dias/CMBH

Descaso do poder público e falta de efetividade nas políticas propostas foram apontados como os principais problemas enfrentados pela população em situação de rua durante a audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, realizada nesta terça-feira (28/3). A incapacidade de atendimento da demanda, a criminalidade, o preconceito e a dificuldade de inserção no mercado de trabalho foram abordados pelos participantes, que defenderam a necessidade de políticas que garantam mais do que um lugar para dormir e o alimento diário. Representante da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania enfatizou que o problema é multifatorial e as soluções exigem políticas públicas articuladas. Mencionando censo da população de rua realizado no ano passado, ele informou sobre as unidades de acolhimento, a busca ativa e o processo de inclusão no CadÚnico para recebimento de benefícios. Criticando a ausência de convidados, o requerente da audiência, Cleiton Xavier (PMN), vai apresentar indicação à Prefeitura sugerindo parcerias com entidades da sociedade civil e pedir informação sobre medidas efetivas, para além dos abrigos, para atendimento desta população.

Falta de trabalho

Eder de Oliveira Gonçalves, representante dos moradores de rua, alegou que grande parte das pessoas que ocupam as ruas vive de doações de igrejas, centros espíritas e transeuntes. Ao lamentar a situação degradante em que se encontram as Praças da Estação e Rio Branco, ele afirmou que há um descaso total dos órgãos públicos e assegurou que o “povo” quer voltar a integrar a sociedade novamente, pedindo mais atenção das autoridades. Segundo Eder, para ajudar efetivamente a população em situação de rua, “o poder público deve encontrar trabalho digno para as pessoas”. 

Essa é a proposta do representante da comunidade terapêutica Cidade Refúgio, Júlio Flavio Lacerda, que oferece  assistência para cerca de 100 pessoas. A instituição trabalha com 32 funcionários, entre eles, assistentes sociais, psicólogo, médico, psiquiatras, enfermeiras, entre outros profissionais, acolhendo quatro pessoas em cada quarto com suite. A unidade oferece seis cursos nas áreas de gastronomia, agronegócio e construção para que eles tenham condições de atuar no mercado de trabalho. “Hoje temos vagas apenas a partir de maio e acho que deveria ampliar essa visão de atendimento para outras pessoas também. Segundo ele, a instituição não tem parceria com a Prefeitura de Belo Horizonte, com o Estado de Minas Gerais nem com o governo federal e o trabalho é mantido por meio de doações. 

Cleiton Xavier pontuou que  existem outras organizações que fazem um trabalho de excelência na recuperação dessas pessoas e a PBH não viabiliza parcerias. “A ajuda seria mútua, uma vez que o município não tem como atender a demanda, profissionalizar todas essas pessoas”, afirmou. Ele sugeriu que a PBH abra uma oportunidade para que essas entidades sejam fortalecidas e possam ampliar o trabalho já desenvolvido. 

Atendimento da PBH

O diretor de Proteção Social Especial da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania, Marcel Belarmino, chamou atenção para a necessidade urgente de trabalhar o retorno à convivência familiar e comunitária e que as políticas públicas devem se desenvolver de forma articulada, sobretudo com a sociedade civil caminhando para o resgate da dignidade das pessoas com trajetória de rua, com atendimento humanizado. 

Maciel citou o censo da população de rua realizado no final de 2022, que trouxe informações sobre quantidade e características da população. Segundo ele, a partir da análise das informações trazidas pelo censo, foi possível avançar na oferta de atenção socioassistencial integrada a essa população na perspectiva de garantir o acesso a direitos fundamentais e cidadania. O diretor de Assistência Social fez um apanhado das estruturas físicas e de recursos humanos, além de ações e programas que atendem pessoas com trajetória de rua. Além das unidades de acolhimento, ele destacou o trabalho desenvolvido nas nove regionais da cidade por meio do Serviço Especializado e de Abordagem, que promove uma busca ativa todos os dias da semana, das 7h às 22h. A inclusão e atualização cadastral no Cadúnico, como objetivo de garantir direitos, também foi mencionada pelo gestor. Marcel também abordou o programa que pretende revitalizar o processo de inserção da população de rua no mercado de trabalho. Segundo ele, a PBH vai investir cerca de R$ 6 milhões na ação.

Cleiton Xavier quis saber se o prefeito, a secretária municipal de Assistência Social e o próprio diretor já foram pessoalmente nesses locais. Para o vereador, a percepção da comunidade é que a PBH “está enxugando gelo” e os abrigos não podem servir apenas para se alimentar e dormir. “Nós precisamos de políticas públicas mais efetivas para que este problema seja solucionado”, cobrou. Em resposta, o diretor de Proteção Social Especial da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania informou que a equipe conhece a rotina das unidades e ponderou que a questão é estrutural e multicausal. “As soluções virão a partir do esforço integrado. O enfrentamento do fenômeno e a forma de trabalhar no sentido de trazer maior proteção e mais direitos para populações em situação de rua só vai lograr êxito na medida em que possamos coordenar nossas ações em todas as áreas”, explicou. 

Forças de segurança

Representando a Polícia Militar de Minas Gerais, o coronel Lázaro frisou que a instituição tem protocolos específicos de abordagem para atender a população em situação de rua. Segundo ele, não são raros os casos de violência e preconceito que afligem essas pessoas e a PM atua de forma preventiva para garantir a segurança e tranquilidade da comunidade em torno dos locais ocupados por eles. O coronel concordou que essa é uma questão que perpassa várias políticas, mas defendeu que cabe à Assistência Social proteger e garantir os direitos das pessoas em trajetória de rua. “Temos um procedimento operacional padrão que trata com dignidade e busca proteger essa população, mas não temos mecanismos próprios para salvaguardá-la”, afirmou. 

Questionado por Cleiton Xavier sobre o aumento de furtos de cabos no Centro da cidade, Lázaro respondeu que a PM trata o morador de rua como cidadão e não como suspeito. “A abordagem é respeitosa e não busca humilhar quem já não tem nada”, afirmou, admitindo que, em caso de infração, as medidas são adotadas normalmente. Ao assumir que a PM não pode fazer mais do que já faz, ele assegurou que a instituição está disposta a colaborar e fazer parcerias com a PBH para apoiar ações e receber demandas. O coronel manifestou interesse em “estreitar laços” com o Legislativo para tratar do tema e o convite foi estendido ao diretor de Proteção Social Especial da PBH. 

Ao admitir que o  problema é multifatorial, Cleiton Xavier definiu como “descaso da PBH” o não comparecimento de convidados às audiências públicas na Câmara de BH, e afirmou que os vereadores querem ajudar o Executivo a encontrar soluções, “tendo em vista que hoje nós temos mais de 5 mil pessoas nesta situação". “Gostaríamos que a PBH viesse em peso e explicasse quais são as medidas efetivas, para além dos abrigos, para atendimento desta população”, cobrou Cleiton, dizendo que vai encaminhar pedidos de informações para conhecer as propostas em pauta da PBH. Ele sugeriu que o Executivo celebre parcerias com a sociedade civil antes que o problema se agrave ainda mais. Presidente da comissão, Gilson Guimarães (Rede) lembrou que trata-se de um problema social que assola diversas cidades e assegurou que o prefeito Fuad Noman (PSD) tem interesse em resolver a situação.

Superintendência de Comunicação Institucional  

Audiência pública para discutir a situação de rua na cidade de Belo Horizonte - 6ª Reunião - Ordinária - Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor