Projeto que proíbe linguagem neutra nas escolas foi vetado pelo prefeito
Proposição voltará à Câmara Municipal, que decidirá pela manutenção ou rejeição da decisão do chefe do Executivo
Foto: Cláudio Rabelo/CMBH
Proposição que pretende proibir a utilização e o ensino da linguagem neutra ou não binária na educação básica, pública e privada, em Belo Horizonte, foi integralmente vetada pelo prefeito Fuad Noman (PSD), conforme publicação do Diário Oficial do Município (DOM) do último dia 8. Com a decisão do chefe do Executivo, o veto volta à Câmara, e os vereadores terão que decidir pela manutenção ou rejeição da decisão do prefeito. A proposição vetada entende por linguagem neutra ou não binária aquela que descaracteriza, por meio da alteração morfológica das palavras na comunicação oral e escrita, o uso da norma culta da Língua Portuguesa e seu conjunto de padrões linguísticos, tendo por finalidade a não identificação ou a não definição de gênero masculino ou feminino. Conforme a proposição, a violação dos seus dispositivos acarretará em sanções administrativas às instituições de ensino público e privado a serem definidas por meio de decreto do Poder Executivo.
Gramática e linguagem neutra
A proposição vetada, que teve origem em projeto apresentado pelo então vereador e atual deputado federal Nikolas Ferreira, ainda pretende garantir aos estudantes do Município o direito ao aprendizado da Língua Portuguesa de acordo com as normas legais de ensino estabelecidas com base nas orientações nacionais de Educação, do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp) e da gramática elaborada nos termos da reforma ortográfica ratificada pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Já na linguagem neutra, a vogal temática e o artigo são substituídos, por exemplo, pela letra “E”, de modo que a frase “os professores brasileiros” seria substituída por “es professores brasileires” com as vogais temáticas sendo trocadas por uma letra que remeta à neutralidade, neste caso a letra “E”. Também a palavra todos, por exemplo, é substituída por “todes”. A linguagem neutra, de acordo com seus defensores, tem o objetivo de tornar a língua portuguesa inclusiva para pessoas transexuais, travestis, não-binárias, intersexo ou que não se sintam abrangidas pelo uso do masculino genérico.
Conforme o autor do Projeto de Lei 54/2021, ex-vereador Nikolas Ferreira, a linguagem neutra é “completamente errônea e descabida para a formação do aluno”, além de atender a uma “pauta ideológica específica que tenta segregar ainda mais as pessoas”. Nikolas afirma entender que “tal linguagem em absolutamente nada contribui para o desenvolvimento estudantil do aluno”.
Veto
Ao vetar integralmente a proposição que garante aos estudantes o direito ao aprendizado da Língua Portuguesa e proíbe a utilização e o ensino da linguagem neutra ou não binária na educação básica pública e privada, o prefeito argumenta que a matéria incorre em inconstitucionalidade formal do tipo orgânica ao transgredir a competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, o que está disposto no inciso XXIV do art. 22 da Constituição Federal.
Ao justificar seu posicionamento, o chefe do Executivo Municipal faz referência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, por unanimidade de votos, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.019, julgada em fevereiro deste ano, decidiu no mesmo sentido. O Supremo Tribunal, por unanimidade, julgou procedente a ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei do Estado de Rondônia 5.123/2021 e fixou a seguinte tese de julgamento: "Norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União”.
Tramitação
O Projeto de Lei 54/2021 foi apresentado em fevereiro de 2021, tendo sido objeto de audiência pública em julho daquele mesmo ano. Além disso, a proposição tramitou, em 1º turno, pelas Comissões de Legislação e Justiça; Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo; Direitos Humanos e Defesa do Consumidor; e Administração Pública, tendo recebido parecer favorável em todas. Em julho do ano passado, o projeto foi aprovado, em Plenário, em votação simbólica. Já na votação em 2º turno, havia 13 emendas ao projeto, tendo sido aprovado o Substitutivo 5, também de autoria de Nikolas Ferreira. Com a decisão do Plenário, tanto a votação do projeto original quanto das demais emendas ficaram prejudicadas.
Conforme parecer da Comissão de Administração Pública, a Emenda 5 trouxe “substitutivo ao texto originalmente proposto, contemplando emendas já propostas e aprimorando a proposição”. Já de acordo com parecer da Comissão de Legislação e Justiça emitido em agosto do ano passado, o substitutivo em questão observa “os preceitos e princípios das Constituições Federal e Mineira” e não viola a “competência dos demais entes federativos”, sendo constitucional.
Em Plenário, em 24 de abril deste ano, o Substitutivo 5 foi objeto de duas votações. Na primeira, os parlamentares aprovaram a parte não destacada do substitutivo por 31 votos favoráveis, 6 contrários e 1 abstenção. Já os artigos 1º e 2º do mesmo substitutivo foram aprovados com 32 votos favoráveis e 6 contrários. Com isso, o Substitutivo 5 foi integralmente aprovado em Plenário e encaminhado para análise do prefeito, que vetou o texto.
Caberá à Câmara Municipal decidir pela manutenção ou rejeição ao veto do prefeito. Caso mantido, o texto originado na Câmara será arquivado; em caso de rejeição da decisão do chefe do Executivo, a proposição será transformada em lei municipal, passando a vigorar na data de sua publicação no Diário Oficial do Município.
Superintendência de Comunicação Institucional