Audiência discutiu rumos para construção de uma política de cuidados em BH
Valorização de quem cuida e garatia dos direitos de quem necessita de cuidados estão entre as propostas
Foto: Barbara Crepaldi/CMBH
A Comissão de Mulheres recebeu, nesta terça-feira (29/8), agentes da sociedade civil e do poder público para tratar do fortalecimento das políticas de cuidado em Belo Horizonte. O termo designa trabalhos de suporte à vivência familiar e comunitária, como a preparação de alimentos, a limpeza e organização dos espaços compartilhados, bem como o apoio às atividades de pessoas com diversos graus de autonomia ou dependência, como crianças, idosos, pessoas com deficiência e enfermos. No encontro, que foi requerido pelos vereadores Cida Falabella (Psol), Iza Lourença (Psol) e Pedro Patrus (PT), a Prefeitura anunciou a criação de um grupo de trabalho que vai elaborar a proposta da Política Municipal de Cuidados.
Como lembrou a vereadora Marcela Trópia (Novo), na nossa sociedade, as atividades de cuidado tradicionalmente recaem mais sobre as mulheres, ponto de vista compartilhado por Cida Falabella e Iza Lourença, que destacam que as desigualdades raciais são outro elemento que se expressa na economia dos cuidados. Dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-c) do IBGE, trazidos pela Prefeitura de Belo Horizonte, corroboram esse cenário. Números de 2019 mostram que as mulheres dedicavam, na média, 21,7 horas semanais ao trabalho doméstico e de cuidados não remunerado, enquanto os homens dedicavam 11 horas. Para as mulheres brancas essa cifra era de 21 horas semanais e para as mulheres negras, 22,3 horas por semana. Entre as mulheres com renda inferior a 1/4 de salário-mínimo essa quantidade de horas semanais subia a 25 horas, e diminuía a 14 horas entre aquelas com renda superior a 8 salários mínimos.
Para a vereadora Cida Falabela, os cuidados são essenciais para a manutenção da vida, desde a infância até a velhice, razão pela qual esses serviços devem ser pensados como um bem público e tratados como tal, inclusive no âmbito da formulação das políticas públicas. Nesse sentido, defende a parlamentar, é fundamental pensar o “cuidado como direito” e também tratar dos “direitos de quem cuida”, como forma de fazer frente às desigualdades que estão presentes nas estatísticas relativas ao tema.
Cuidado em perspectiva ampliada
Para a professora Érica Dumont, do Departamento de Enfermagem Materno Infantil e Saúde Pública da UFMG, as políticas de cuidado envolvem não apenas a atenção à família e ao outro, mas também a dimensão comunitária e ambiental. Referem-se, nesse sentido, a tudo aquilo que fazemos para manter e reparar o nosso mundo, de modo a viver nele da melhor forma possível. Na audiência, foram apresentadas duas iniciativas da sociedade civil que exemplificam essa vivência. Uma delas é a Horta Comunitária Vila Pinho, no Barreiro, onde produtos agroecológicos são cultivados de forma coletiva, produzindo renda para as famílias envolvidas e garantindo a ocupação sustentável do espaço urbano, além de oportunizar alimentos de qualidade para a população do entorno. Outra iniciativa é o Coletivo Etinerâncias, que, entre diversas realizações, atua na tecitura de redes para garantir o fortalecimento recíproco de grupos e indivíduos que atuam na promoção de cuidados em âmbito comunitário.
A atuação da Prefeitura de Belo Horizonte para a promoção de uma política de cuidados no município também tem como norte esse entendimento ampliado do conceito. Conforme relata a servidora Alice Brandão, da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania (Smasac), o Executivo instituiu, neste ano, um grupo de trabalho intersetorial sobre o tema, coordenado pela pasta e integrado ainda por representantes das Secretarias Municipais de Saúde e de Desenvolvimento Econômico. Além de elaborar um diagnóstico com mapeamento de programas e serviços públicos de cuidado em BH, o grupo será responsável por propor a Política Municipal de Cuidados, voltada a garantir o direito ao cuidado a todas as pessoas que dele necessitam e, ao mesmo tempo, assegurar melhores condições de trabalho para quem cuida, reconhecendo e enfrentando as desigualdades estruturais que marcam a realização desse tipo de serviço. Criado em junho de 2023, o grupo tem 180 dias para concluir suas atividades.
Reconhecer e redistribuir
Adotando ponto de vista semelhante ao defendido pela representante da Smasac, Cida Falabella destacou que o fortalecimento das políticas de cuidado exige que o poder público e a sociedade civil atuem em conjunto com vistas a reconhecer o trabalho de quem cuida; a reduzir as horas não remuneradas de trabalho; a redistribuir o trabalho de forma mais justa; e a reorganizar políticas públicas de modo a garantir a ação integrada e complementar na esfera da oferta de cuidados.
Já o vereador Pedro Patrus (PT) apontou que a audiência foi uma importante oportunidade de aprendizado sobre o tema, que muitas vezes é mantido na esfera da invisibilidade. Segundo ele, debates como o promovido pela Comissão de Mulheres contribuem para lançar luz sobre o assunto e indicam que o parlamento também espera contribuir para a construção e a qualificação dessa política, inclusive no âmbito da produção de leis pertinentes ao tema.
Superintendência de Comunicação Institucional