Impedidas de funcionarem presencialmente, escolas infantis temem fechamento definitivo
Vereador vai sugerir à PBH criação de um grupo de trabalho para discutir o retorno programado do setor
Foto: William Delfino/CMBH
Professores, donos de escolas, diretores e outros representantes discutiram nesta terça-feira (7/7), em audiência pública, o fechamento das escolas durante a pandemia de Covid, durante reunião da Comissão Especial de Estudo - Enfrentamento da Covid-19. Foram destacadas questões como a saúde mental e física das crianças em isolamento social, a dificuldade em garatir os processos de formação de personalidade diante da falta de interações sociais, a necessidade de diálogo com o poder público e o perigo de encerramentos das atividades de muitas insituições devido à crise financeira decorrente da pandemia. A audiência foi proposta pelo vereador e líder de governo Léo Burguês de Castro (PSL), que sugeriu a formalização da criação de um grupo do trabalho pela Prefeitura de Belo Horizonte para discutir medidas de retorno às atividades, embora ainda não haja uma previsão.
Presidente do Sindicato das Escolas particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), Zuleica Reis Ávila queixou-se da falta de orientaçação, resposta ou diálogo dos órgãos públicos em relação à educação infantil, dada a sua importância para a formação das crianças. Segundo ela, das 873 escolas que oferecem educação infantil em Belo Horizonte, 687 são particulares, onde trabalham 10 mil professores. Mas 80% delas têm previsão de serem fechadas, por conta de problemas como o “excessivo cancelamentos de contratos” e inadimplência com taxas entre 30 e 46%. “O que nós estamos pedindo é um socorro urgente para a educação infantil”, “já que estamos quase no fundo do poço”, lamentou. Apontou, ainda, que um possível fechamento definitivo das escolas privadas infantis pode impactar a rede pública. Foram citados como auxílios possíveis a diminuição ou corte de impostos e a distribuição de vouchers para as famílias.
A educadora Letícia Fonseca Fernandes abordou problemas psicológicos e sociais que derivam do isolamento social expresso pelo fechamento das escolas infantis, focando na importância da escola para o processo de individuação do ser humano, ao propiciar conhecimento a partir do contato social: “Crianças são gregárias, aprendem pelo contato com as outras”. Após o fechamento das escolas e a consequente diminuição nas interações sociais, a “condução do pensamento” fica “totalmente prejudicada”, com riscos desconhecidos, declarou Fernandes.
Geração C
“Mamãe, eu não aguento mais brincar com adulto, eu quero brincar com uma criança”. Esse foi o apelo do filho de quatro anos da bioesteticista Luciana Dadalto. Ela afirmou que o filho “está fazendo parte da Geração C, geração coronavírus, que do dia para a noite foi retirada do seu convívio” e agora está “impulsionada nas telas” e dentro de casa, por falta de estrutura e planejamento, dentre outros motivos citados. Dadalto frisou a necessidade de pensar na escola como serviço essencial ao discutir a retomada das atividades presenciais.
A pedagoga Juliana Morais contou que a filha de três anos, Mari, também pede “todos os dias” para brincar com outros colegas. Ela ecoou a fala de Letícia Fernandes sobre o desenvolvimento das crianças enquanto indivíduos: “A interação que a gente precisa ter está sendo perdida e vai ser muito difícil recuperar”. Assim como outros representantes, não defende a abertura imediata das escolas, mas pede mais diálogo do Poder Executivo: “A Prefeitura não nos dá nenhuma palavra”.
Promotora do Ministério Público de Minas Gerais, Carla Maria Alessi Lafetá de Carvalho frisou a importância da escola infantil em nossa sociedade. Segundo ela, entre 2013 e 2016 houve um excesso de judicialização das vagas na rede de educação infantil, “com inúmeros processos de pessoas de classe média e alta querendo a vaga” [em escolas públicas infantis municipais]. Foi feito um levantamento da demanda por vagas em 2017, revelando que 38 mil crianças de zero a cinco anos tinham intenção de se matricular na rede pública municipal, mas o percentual “reduziu drasticamente nos últimos dois, três anos”. Entretanto, esse percentual pode ter mudado: “Já estamos recebendo demandas de pais que estão tirando (…) as crianças, várias escolas de educação infantil sendo fechadas” - o que ela também observou em conversas com conselheiros tutelares. A promotora contou que tem recebido denúncias contra a atuação de “crecheiras” (pessoas que tomam conta das crianças na falta dos responsáveis).
O médico Ricardo Cabral Santiago, da Rede de Cuidados de Saúde, considerou o retorno das atividades “com estratégias seguras, do ponto de vista sanitário”. Ele acredita que o retorno pode ocorrer “com restrições” e protocolos sanitários, afirmando que “[o vírus] não infecta gravemente as crianças. No mundo inteiro foi assim”.
Grupo de trabalho
Presidente da escola Ipê Amarelo, Allan Oliveira Mendes foi o primeiro a propor a criação de um grupo de trabalho com a participação das escolas, professores, sindicatos, do Ministério Público e de outros atores visando a criação de propostas conjuntas para a educação infantil: “Precisamos levar esse debate para o Estado”. Ele também externou a preocupação em obter informações claras dos poderes públicos para repassar às familias.
O vereador Jair Di Gregório (PSD) defendeu a criação de um grupo de trabalho que envolva o segmento da educação, o Executivo, o Legislativo e “principalmente, pais e mães”. Para ele, “é possível fazer o retorno bem discutido, com algumas normas bem adotadas”.
Cida Falabella (Psol) defendeu que, atualmente, não temos condições seguras de reabrir as escolas e o governo federal deveria liberar uma “linha exclusiva” para essas instituições.
Já o requerente da reunião, Léo Burguês de Castro, declarou que vai propor à Prefeitura que convoque, por meio de portaria, um grupo de trabalho composto por pessoas da área da educação para discutir as medidas de retorno às aulas presenciais: “Sobre o ‘quando’, nós vamos aguardar a questão médica; mas o ‘como’ é importante discutirmos. E se o médico falar: é amanhã?”. O líder de governo lembrou a importância de se discutir protocolos e medidas sanitárias.
“Ninguém discute a relevância da educação infantil”, afirmou o secretário municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, André Reis, ressaltando que vem conversando com os setores e que o prolongamento do isolamento social se deve à dificuldade de isolar as principais cidades. De acordo com ele, em 25 de maio de 2020 houve uma aposta na flexibilização por cobrança do comércio, mas em 30 dias a taxa de ocupação de leitos de UTI para pacientes com Covid aumentou de 40% para 91%. Ele não credita o aumento à flexibilização: “Não importa o que aconteceu, o que importa é que subiu”. Reis acredita que a ampliação quantitativa de leitos no mundo inteiro não é suficiente para enfrentar a pandemia: “Não foi a ausência de leitos que trouxe mais de 60 mil mortos no Brasil”.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional