APOSENTADORIAS E PENSÕES

Proposta de reforma da previdência é criticada por servidores públicos em audiência

De acordo com sindicalistas, vereadores e especialista, as pessoas terão que trabalhar mais e receberão menos quando se aposentarem

terça-feira, 16 Abril, 2019 - 19:30

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Caso a proposta de Reforma da Previdência do Governo Federal seja aprovada, as pessoas terão que trabalhar mais e receberão menos quando se aposentarem. Essa foi a ideia central exposta pelos participantes da audiência da Comissão de Administração Pública que debateu, nesta terça-feira (16/4), o impacto da reforma na vida dos servidores públicos. Participaram do evento, requerido pelo vereador Arnaldo Godoy (PT), representantes do Dieese e de sindicatos de trabalhadores.

A economista Maria de Fátima Lage Guerra, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), explicou que o mercado de trabalho enfraquecido como está agora leva ao déficit da previdência. Isso se dá porque há menos trabalhadores contribuindo para o sistema. De acordo com ela, uma série de medidas adotadas desde 2016 vêm prejudicando o atual sistema previdenciário, como a aprovação da PEC do teto dos gastos públicos, que congela os gastos com políticas sociais, a Lei da Terceirização, a reforma trabalhista e, agora, a proposta de Reforma da Previdência do governo Bolsonaro.

Para Arnaldo Godoy, a retirada de direitos dos trabalhadores teve início com a saída de Dilma Rousseff da presidência, em um processo que ele qualifica como "golpe", e vem tendo sua continuidade com a agenda proposta pelo atual presidente.

O vereador Pedro Bueno (Pode) também criticou a reforma proposta e afirmou que o governo, em vez de trabalhar pela erradicação da pobreza, promove a “irradiação da pobreza”. Ele também classifica as medidas propostas pelo Governo Federal como ultraliberais.

Mudanças previstas na Reforma

A proposta do governo Bolsonaro obriga estados e municípios a seguirem as regras do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) da União. De acordo com as regras, os entes federados poderão vincular receitas de impostos ao RPPS e terão de elevar as contribuições dos servidores, inclusive para os atuais aposentados e pensionistas, de modo a reduzir suas despesas com a previdência. O Governo Federal propõe ainda alíquotas progressivas para os trabalhadores contribuintes, que iriam de 7,5% para quem recebe até um salário mínimo a 22% para aqueles que ganham acima de R$ 39 mil e um centavo.

A diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede), Vanessa Portugal, classificou a proposta como um confisco de salários por parte do governo.

Outra alteração prevista é a mudança do cálculo do benefício. Atualmente, o valor recebido é calculado a partir da média dos 80% maiores salários de contribuição, sendo descartados para efeito de cálculo do benefício os 20% menores salários de contribuição. Com a reforma, o benefício previdenciário será calculado levando-se em consideração a média de todos os salários de contribuição, incluindo os 20% menores. Tal proposta, caso aprovada, irá reduzir os valores a serem recebidos. A garantia de correção dos benefícios previdenciários de acordo com a inflação anual também deixa de existir com a reforma, o que poderá levar à sua defasagem.

Além disso, o projeto do governo federal também acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição e institui idade mínima para a aposentadoria. De acordo com a proposta, os homens teriam que contribuir, no mínimo, até 65 anos de idade, e as mulheres até, ao menos, 62 anos. Além disso, para se aposentarem pelo RPPS, os servidores deverão contribuir por 25 anos - dez anos no serviço público e cinco anos no cargo. A idade mínima, entretanto, aumentaria a cada quatro anos a partir de 2024, de acordo com a sobrevida da população aos 65 anos. Com isso, a expectativa é que a idade mínima para aposentadoria seja aumentada ao longo do tempo.

A economista Maria de Fátima Lage Guerra explicou que a reforma é muito mais generosa com os servidores militares do que com os civis e, ainda, mantém isento de contribuição o agronegócio exportador. Ela também salientou que o trabalhador aumentará sua contribuição à previdência, mas não o empregador.

Pensão por morte

No caso de pensões por morte, o trabalhador também perderia direitos em relação às regras atuais. De acordo com a reforma, o benefício seria equivalente a uma cota familiar no valor de 50% do valor da aposentadoria, mais 10% adicional para cada dependente, incluindo o cônjuge, ao limite de 100% Assim, uma família composta por dois dependentes teria direito a uma cota de 50%, mais 20% referente aos dois dependentes, totalizando uma pensão de 70% do benefício. Pela proposta, a pensão poderia, inclusive, ser inferior a um salário mínimo. Em caso de morte por motivo relacionado ao trabalho, a pensão seria igual a 100% da aposentadoria.

Para Paulo Henrique Santos Fonseca, do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind UTE), um dos aspectos mais "nefastos” da Reforma da Previdência é a criação do regime de capitalização, que seria alternativo ao Regime Geral de Providência Social e ao Regime Próprio de Previdência Social. Pelo novo sistema, o trabalhador contribuiria individualmente para sua futura aposentadoria em uma conta individual, diferentemente do que ocorre hoje no sistema de repartição, em que os trabalhadores da ativa contribuem para o pagamento dos aposentados. Atualmente, os recursos arrecadados vão para o caixa da previdência, que os distribui entre os aposentados, uma vez que inexistem contas individuais.

O sindicalista afirmou que a transição de um sistema de repartição para um de capitalização oneraria enormemente os cofres públicos, uma vez que, caso o modelo venha a ser adotado, o número de contribuintes do atual sistema diminuiria muito, ampliando sobremaneira o déficit da do RPPS e do RGPS. Isso ocorreria porque os governos deixariam de arrecadar recursos com os trabalhadores da ativa para financiar os aposentados dos regimes atualmente em vigor, já que eles passariam a contribuir unicamente para sua própria aposentadoria em uma conta individual.

Déficit da previdência?

No Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) dos servidores públicos, concebido na Constituição de 1988, a aposentadoria era concedida por tempo de serviço, sem exigência de critérios contributivos. Com as mudanças da década de 1990, o princípio contributivo para os regimes próprios dos servidores públicos foi constitucionalizado ao prever que as aposentadorias e pensões passassem a ser custeadas com recursos provenientes do Estado e das contribuições dos servidores. Também na década de 1990 ocorreu a constitucionalização do pilar complementar de previdência privado e facultativo e a exigência de tempo mínimo de contribuição, além do tempo de serviço, para efeitos de aposentação.

Para Vanessa Portugal, essas mudanças ocorridas na legislação nos anos 1990 são as responsáveis por garantir o discurso de que o RPPS é deficitário. Além disso, a sindicalista afirma que o governo, por meio da Desvinculação de Receitas da União (DRU), retira recursos que, de acordo com a legislação, deveriam ser destinados à previdência social, o que reforça o discurso de que há um déficit no sistema. Ela também defende que, ainda que, em determinados momentos, houvesse déficit, este não deveria implicar em penalizações aos trabalhadores, uma vez que a previdência é a grande responsável por distribuir renda no país.

O representante do Sind UTE, Paulo Henrique Santos Fonseca, afirmou que, caso o país voltasse a crescer, em média, 2% ao ano, a previdência deixaria de ser deficitária, como já deixou de ser durante os governos do PT.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para discutir sobre o impacto da Reforma da Previdência na vida dos servidores públicos- 9ª Reunião Ordinária- Comissão de Administração Pública