Especialistas apresentaram alternativas para destinação de rejeitos de mineração
As recomendações mais urgentes foram para não misturar lama de processo com rejeito arenoso e dispor desse rejeito em pilhas confinadas
Foto: Bernardo Dias/ CMBH
Reunida nesta terça-feira (11/6), a CPI das Barragens recebeu o engenheiro de produção e mestrando em Engenharia de Materiais, Thomaz Valladares Mascarenhas Mourão, e Fernando Gabriel Araújo, coordenador da pós-graduação em Engenharia de Materiais da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e membro da Fundação Gorceix (instituição de apoio aos estudantes carentes e à Escola de Minas da Universidade). Eles apresentaram trabalho feito na universidade sobre alternativas viáveis para a destinação dos rejeitos de mineração, visando a dar fim às barragens de rejeitos e mitigar os riscos de contaminação dos cursos d'água. Os convidados proferiam uma verdadeira aula de engenharia aplicada, explicando sobre os tipos de minérios e de rejeitos e as alternativas às barragens atuais.
Recomendações
O professor Fernando Gabriel Araújo explicou que as barragens são compostas por dois tipos de rejeitos principais: as lamas do processo, que correspondem a 10% do material lavrado, e o rejeito arenoso, correspondente a 40%. A lama pode ser retirada quando se separa o rejeito do alto teor de ferro (a lama contém até 55% de minério de ferro) e é bem fina. O rejeito arenoso é mais grosso e tem muito quartzo. Segundo ele, a mistura dos dois escoa mais facilmente do que quando são separados. Portanto, a recomendação é não misturá-los, porque isso diminui a viscosidade, aumentando a liquefação de barragens e pilhas.
Dentre as recomendações urgentes, ele citou, além de não misturar lama de processo e rejeito arenoso: dispor do rejeito arenoso em pilhas confinadas, gerar produtos e co-produtos com 100% da lama do processo, amostrar e modelar os depósitos (imediato para barragens com alteamento).
O professor explicou, ainda, como fazer com cada tipo de rejeito. Para o arenoso, a construção civil não seria a solução geral, pois o volume e a logística para carregar o material tornariam o processo inviável - mas poderia ser usado em obras locais. As soluções seriam empilhar a seco, fazer estrutura de contenção e empilhar em grande escala. Já para a lama, pode-se recuperar o ferro contido nela e produzir mini-pelotas para sinter-feed (espécie de pelotas usadas como carga nos altos-fornos siderúrgicos), além de propantes (utilizados na indústria petrolífera). A lama do processo gera, anualmente, 50 milhões de toneladas, e até 20 milhões podem ser recuperados. A sugestão repassada foi evitar que a lama vire rejeito.
Para as barragens existentes, a proposta foi o monitoramento de deslocamento dos diques e pressão da água. “O monitoramento, atualmente, não é preventivo, é reativo. Temos que alimentar modelos com caracterização do material depositado”, explicou. Ele também citou o que já foi iniciado em algumas barragens, como o monitoramento de deslocamentos e pressão da água.
Cenário
Thomaz Valladares Mascarenhas Mourão explicou um pouco sobre o cenário da mineração em Minas Gerais: o setor minero-metalúrgico contribui com 8% do PIB do estado e emprega diretamente 50 mil pessoas; MG extrai 66% do ferro brasileiro, que é o produto mais exportado por Minas (40% das exportações); 9 das 29 usinas de aço brasileiro estão em Minas Gerais; cada vaga fechada no setor leva à extinção de 13 vagas na cadeia; antes de Mariana, a mineração representava 7,6% do PIB do estado, e, em um ano, atingiu 3,6%.
Pelos dados apresentados, ele considerou que “a solução não é acabar com o setor, mas buscar alternativas”. Segundo o mestrando, se a produção parasse, 27% do PIB estadual cairia. Além disso, haveria a retirada de 7,7 bilhões da balança comercial, somente com os cortes anunciados pela Vale e, segundo um estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) haveria, ainda, uma queda de 4,3% na arrecadação direta e 7,3% no acumulado – dentre outros problemas apresentados.
O mestrando falou sobre algumas limitações encontradas para mudar os modelos atuais da mineração: por vezes a granulometria (vulgarmente, o tamanho) do material disponibilizado não atende aos requisitos; haveria uma falta de incentivo ao desenvolvimento de novas tecnologias e do uso de rejeitos; e o mercado ainda não demanda produtos sustentáveis desde o início da cadeia.
Questões
O vereador Gabriel (PHS) questionou quais agentes públicos devem ser provocados para atuar na questão das barragens. O professor Fernando Gabriel Araújo disse que a demanda envolve o Ministério das Minas e Energia, na forma de recomendações às empresas, que seriam recompensadas se atendessem a essa recomendações. Também citou a Agência Nacional de Mineração (AMM) e o governo do Estado: “o problema do rejeito é do Estado. O problema é grave apenas em Minas Gerais”, afirmou o especialista.
“Uma das primeiras discussões surgidas na CPI foi de que o modelo de barragem poderia ser substituído pela mineração a seco. Por que vocês não trataram da questão?”, perguntou a vereadora Bella Gonçalves (Psol). “Processar minério a seco é difícil, ele já tem 20% de água”, explicou Araújo, que também citou o fato de estarmos em um país tropical. “Só para secar, são 12 a 17 dólares a tonelada, o aumento da energia seria estratosférico, não teria capacidade de produção”, completou.
Já o vereador Wesley Autoescola (PRP) perguntou sobre propostas de descomissionamento apresentadas pela Vale, mas os presentes disseram desconhecer os métodos para além do que já foi divulgado pela imprensa. O vereador Irlan Melo (PL) quis saber qual a receptividade das empresas, atualmente, às pesquisas realizadas pelos convidados. “Nossos estudos são feitos com apoio do meio empresarial. As questões têm mais eco agora. Por falta de percepção até técnica das questões, isso leva tempo”, afirmou Araújo. Ele citou o desastre de Brumadinho como “aglutinador”.
A questão do prazo da Vale para descaracterizar as barragens até 2021 foi levantada pelo vereador Pedrão do Depósito (PPS). “Cada caso é um caso. A aplicação da tecnologia pelas mineradoras está em fase de estudos, vários já foram feitos. O reaproveitamento de rejeitos está em estudo por algumas mineradoras”, sustentou o professor, sem citar a Vale. O presidente da CPI, vereador Edmar Branco (Avante), garantiu que as informações repassadas foram muito valiosas e serão incluídas no relatório final.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional