Com alegação de falta de clareza e inconsistências, relatório final é rejeitado
Novo relator tem até o próximo dia 4 para apresentar outra proposta para apreciação. Parlamentar defende apontamento de indiciados
Foto: William Delfino/CMBH
Após três votos pela rejeição, dois pela aprovação e três abstenções o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga os débitos do Município com a construtora Andrade Gutierrez foi declarado rejeitado pela CPI. No encontro, ocorrido na manhã desta quarta-feira (26/8), a principal alegação para o voto em contrário dada pelos parlamentares envolveu questões ligadas à falta de precisão e clareza das informações apresentadas no relatório. Após a rejeição, novo relator foi eleito para a função, e o parlamentar tem até o próximo dia 4 de setembro para apresentar outro documento para apreciação. Todos os vereadores participaram do encontro de forma presencial. O relatório final pode ser consultado aqui, juntamente com o resultado da reunião.
Indícios de vícios e irregularidades
O relatório final apresentado nesta manhã pelo relator acompanha as premissas expostas na minuta apresentada à Comissão no início do mês de agosto. Nele, o relator aponta “que todo o histórico que culminou no reconhecimento da dívida em 1999, e posterior quitação desta em 2013, é eivado de indícios de vícios e irregularidades, que carecem de adequada apuração e investigação pelos órgãos competentes.”
Para embasar a afirmação, o documento de 79 páginas lembra a “CPI das Empreiteiras”, realizada pela Câmara nos anos de 1993 e 1994, e ressalta que apesar de terem sido apontados indícios de atos lesivos e ilegais, e de terem sido instauradas denúncias, auditoria e inspeção pelo Tribunal de Contas, a Prefeitura e a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), na condição de rés na ação de cobrança proposta pela construtora, omitiram-se em apresentar tais informações ao Poder Judiciário. Segundo o relator, em função disto, a ação judicial à época seguiu seu curso, sem que as irregularidades constatadas nos contratos tenham sido consideradas, culminando assim no acordo que permitiu a celebração da Confissão de Dívida, em 1999, entre a Prefeitura e a empresa.
No item 350 do documento, o relator então questiona “por qual razão o Poder Público Municipal à época iria contrair uma dívida de obras e contratos que tinham indícios sérios e embasados de irregularidades, sob investigação pelos órgãos competentes?”. Dando sequência ao seu argumento, o relatório cita ainda a existência de um modus operandi da Andrade Gutierrez na contratação junto ao Poder Público Municipal caracterizado pela ausência de licitação para algumas obras; contratação genérica e irregular, ora sem prévia dotação orçamentária, ora posterior à própria execução da obra; celebração de diversos aditivos que aumentaram significativamente o escopo, o valor e o prazo dos contratos; indício de ocorrência de superfaturamento de obras; autorização legislativa para reconhecimento de dívida; ausência de informações financeiras consolidadas quanto aos débitos reconhecidos; e pagamento de valores em desconformidade com a Confissão de Dívida pactuada.
O relatório reconhece nos itens 355 e 356 a insuficiência de informações sobre os pagamentos realizados ao longo da execução dos contratos ou posteriormente à Confissão de Dívida, bem como a ausência de perícia técnica-contábil para apuração dos valores envolvidos, e a falta de informações sobre os processos instaurados no TCE/MG a partir das investigações da CPI das Empreiteiras. No item 357, o relator afirma que “embora persistam alguns pontos a serem oportunamente investigados pelos órgãos competentes, notadamente uma auditoria completa quanto aos valores objeto de todo o histórico contratual e de pagamentos realizados, é possível constatar a existência de diversos indícios que apontam para a ocorrência de prejuízo indevido ao erário”.
Em sua conclusão, o relator pede então que cópia do documento seja enviada aos órgãos de controle e fiscalização, e sugere ao TCE/MG que proceda “uma auditoria completa dos valores pagos pela Prefeitura a partir da Confissão de Dívida celebrada em 1999”, bem como “investigação cabível quanto a legalidade e regularidade da Confissão de Dívida”. À Polícia Civil, o documento sugere “que sejam investigados todos os elementos elencados que teriam dado ensejo à ilegalidade na contratação da dívida em 1999”. Já ao Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG), o relatório pede a “investigação e responsabilização cabível das autoridades administrativas, agentes públicos ou privados”. Ao MP/MG e ao TCE/MG o relatório pede prosseguimento acerca das apurações sugeridas no relatório final da CPI das Empreiteiras finalizada pela Câmara em 1994. Em função de repasses feitos pelo Governo Federal no período dos contratos, o relator pede ainda que cópia do relatório seja enviada também à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal para investigação e responsabilização civil ou criminal cabível.
Suposições e falta de clareza
Embora tenha recebido elogios por parte dos membros da Comissão, pelo esforço empreendido face à dificuldade de organização e da imensa quantidade de informações em tão pouco tempo, o relatório contém trechos como “indícios que apontam” e “embora persistam alguns pontos a serem oportunamente investigados” que refletiram imprecisão e contribuíram para a sua rejeição, na avaliação da maioria dos vereadores.
Durante a sua defesa pelo voto contrário ao documento, um parlamentar ressaltou que a CPI é dos instrumentos mais importantes da Casa Legislativa, que tem a função de investigar com profundidade e objetividade para que futuramente não seja objeto de questionamento. “O relatório é falho, não apresenta provas. Fala de possíveis irregularidades e não aponta quais. Afirma que não foi possível saber quanto foi pago em cada contrato. Como vamos assinar isto?”, questionou o vereador, que chamou tais questões de equívocos graves.
Outros três vereadores, dois que votaram contra e um que se absteve, tiveram entendimento parecido. Novamente citando a impossibilidade de se contratar uma auditoria técnico-contábil, os parlamentares falaram que o documento é genérico, não apresenta dados novos e apenas reforça denúncias feitas na CPI de 1994, contendo ilações e suposições (itens 340, 377, 356 e 357). “A Câmara não dá condições técnicas para a gente fazer a CPI. Fazemos isso com os nossos mandatos. O relatório apresentado é um estudo aprofundado, mas não conseguimos quem e quais são os responsáveis”, justificou um parlamentar, que propôs ainda que o novo relatório não aponte culpados e destine essa apuração aos órgãos de controle.
Falta de indiciamento e novo relator
O não apontamento para um ou mais responsáveis pelo possível dano ao erário foi, entretanto, o fator decisivo para a opção pela abstenção de um dos membros durante a votação do relatório. Para o parlamentar, que acabou sendo eleito novo relator, é possível aprofundar no relatório e apontar o gestor responsável. Para isso, ele defendeu que seja verificado se durante o atraso das parcelas 5, 6 e 14, que culminaram em correções e multas altíssimas para a Prefeitura, haveria previsão de dotação orçamentária no ano anterior para o pagamento, uma vez que os prefeitos à época alegaram falta de recursos para não honrarem com os compromissos. “Precisamos saber se houve provisionamento no ano anterior. Se houve, porque a parcela não foi paga? E se não houve (o provisionamento), então houve prevaricação; que se constatada pode levar ao indiciamento do gestor”, justificou o parlamentar, lembrando que isto pode dar robustez ao relatório final.
O relator eleito tem até o próximo dia 4 de setembro para apresentar nova proposta de relatório. A Comissão já deixou agendados dois encontros (dias 3 e 4/9), às 9h30, para a votação do relatório.
Assista ao vídeo com a íntegra da reunião.
Superintendência de Comunicação Institucional