Comerciantes cobram ações da PBH diante de problema complexo
Tema é discutido por grupo de trabalho criado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico
Foto: Abraão Bruck/CMBH e Fernando Frazão / Agência Brasil
A percepção do aumento do número de pessoas em situação de rua tem sido comum em Belo Horizonte. O Grupo de Trabalho (GT) BH sem Morador de Rua, criado no âmbito da Comissão de Desenvolvimento Econômico Transporte e Sistema Viário, vem discutindo o tema com vários atores (órgãos municipais, entidades comerciais, jurídicas, sociais e comunitárias) para formulação de políticas e ações articuladas de inclusão econômica e acesso a direitos básicos que possibilitem a reconstrução de uma vida digna, autônoma e a superação da situação de rua. Nesta quinta-feira (23/9), o debate prosseguiu em mais uma audiência pública, desta vez com foco na complexa relação entre comércio, consumidores e pessoas em trajetória de rua. A necessidade de falar sobre o problema e a dificuldade de encontrar soluções foram reconhecidas pelos participantes. Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH) e empresários do Barro Preto cobraram da Prefeitura ações em apoio a essa população. Convidada para a reunião, a PBH não mandou representante.
Solicitada pelo requerente e relator do GT BH sem Morador de Rua, Braulio Lara (Novo), a audiência teve como propósito analisar a fundo e debater os diferentes aspectos desse fenômeno complexo que afeta BH e outras cidades grandes e médias, decorrente das dificuldades de acesso à moradia, educação e oportunidades de trabalho, agravadas pela pandemia e pela afluência de pessoas de outros municípios. O encontro desta quinta, segundo ele, visa dar continuidade à série de visitas técnicas e audiências previstas na metodologia dos trabalhos.
Um dos convidados para audiência foi Wilson Campos, presidente da Comissão de Defesa, Cidadania e Interesses Coletivos ao Cidadão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Para ele, o tema é um dos mais relevantes a serem tratados no momento: “Este é um assunto que tem que ser debatido pela sociedade, por todas as pessoas que tenham humanidade e gostem da cidade. A interação é o caminho para resolver. As pessoas (moradores em situação de rua) são pessoas com personalidades e aspirações distintas, diferenciadas e precisam de ajuda. A população é solidária, mas a sociedade não quer estas pessoas na porta das lojas e residências”, explicou Wilson, exaltando exemplo da Finlândia, que conseguiu reduzir quase a zero o número de pessoas morando nas ruas. Segundo ele, que teve a informação reafirmada por outros participantes da audiência, a Finlândia adotou o que chamam de política de “habitação em primeiro lugar” e, segundo matérias divulgadas na imprensa, é o único país da Europa onde o número de pessoas em situação de rua está diminuindo. “É difícil, mas não é impossível. A boa vontade tem que ser a política”, disse Wilson Campos.
Para Maria Angélica Biondi, presidente do Instituto de Apoio e Orientação a Pessoas em Situação de Rua (Inaper), a complexidade do problema é um dos entraves para o encontro de soluções. “Entre os moradores em situação de rua há pessoas analfabetas e pós-graduadas. Há pessoas com 50 anos de rua. É uma situação antiga que existe em quase todos os países e precisamos pensar em soluções complexas. É um público com pessoas com a saúde integral comprometida. Pensar em solução é pensar também em saúde emocional”, destacou Angélica. O Inaper surgiu em 2016 e tem foco no resgate, na dignidade e na autonomia dessas pessoas. No instituto são oferecidos café da manhã, banho, barbearia, atendimento social e psicológico, oficinas pedagógicas, preparo para o mercado de trabalho. O projeto Casa Lar, mantido pela instituição, oferece moradia em caráter definitivo para oito pessoas em trajetória de rua.
Relação com comerciantes e consumidores é problema a ser resolvido
Um dos temas centrais é a relação entre os moradores em situação de rua, comerciantes e consumidores. “Esse é um assunto complexo. Um tema que incomoda há muito tempo e entendemos que deva ser feito um projeto mais resoluto. Entendemos que somos todos responsáveis, mas que a Prefeitura tem que ser protagonista e ter vontade política. Precisamos mudar o modelo e ter uma atuação mais firme”, afirmou Marcelo de Souza e Silva, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH). Marcelo, que foi secretário da Regional Centro-sul na gestão do ex-prefeito Marcio Lacerda, disse ainda que 72% do Produto Interno Bruto (PIB) da capital vem dos setores de comércio e serviços. “A cidade tem que estar bem cuidada e isso (o aumento do número de moradores em situação de rua) está criando problema grande”, disse. Perguntado por Braulio Lara sobre se há diferença entre as gestões do ex-prefeito e do atual prefeito Alexandre Kalil (PSD) em relação ao tema tratado, o presidente da CDL foi enfático. “A gente tinha cuidado com esse assunto. Atuava com as áreas de saúde e assistência social, parceria com institutos e com pessoas. O diálogo era mais intenso. A palavra (que deve guiar as ações) é cuidado com diálogo. Nosso prefeito é uma pessoa de difícil diálogo”, finalizou Marcelo.
Rebeca Pontello Pertence, Diretora de Qualificação e Intermédio de Mão de Obra da Prefeitura de Belo Horizonte, foi convidada para o debate, mas não compareceu à audiência. “A gente sente muito a falta de efetividade da PBH em enviar representantes para as audiências que estamos fazendo”, destacou o vereador Braulio.
Além do presidente da CDL, a audiência contou com dois representantes de comerciantes da região do Barro Preto. Eugênio da Fonseca é integrante da Associação Comercial do Barro Preto (Ascobap). Segundo ele, é importante cobrar uma solução do poder público. “Acho muito importante essa união para cobrar da Prefeitura que faça algo. Ninguém vai na minha porta perguntar o que fazer. O morador de rua precisa de apoio, mas nós (comerciantes) precisamos de um direcionamento”, afirmou Eugênio, informando que o comércio da região sofre e não há sinalização de investimentos na cidade por parte dos comerciantes do Barro Preto.
Para Maurício Moreira Junqueira, presidente da Associação dos Empresários do Barro Preto (Assempre), há muita demagogia ao tratar da questão. “A situação (aumento do número de moradores em situação de rua) vem crescendo desde a saída do Marcio Lacerda e a entrada do Kalil. Essas pessoas, na maioria das vezes, não querem sair das ruas. São raríssimos os casos. O comerciante se sente indefeso. Ouvimos as mesmas narrativas. A gente até vê que várias associações nem participam mais (de debates e audiências). A comida dada é remorso humano, pois não vai resolver e o comerciante fica vulnerável”, salientou Maurício, questionando também determinação do Ministério Público que proíbe que sejam recolhidos os pertences dos moradores em situação de rua. “Já pedimos ao MP que revogue lei específica. Deixo aqui meu desagravo”, afirmou, sugerindo que a principal ação a ser tomada é a revogação do que ele chamou de “lei dos carrinhos”.
Grupo de trabalho já marcou nova audiência
Focando nos eixos de atendimento e encaminhamento social, revitalização de centralidades e bairros degradados, fomento do turismo em regiões específicas e reinserção no mercado de trabalho, o Grupo de Trabalho busca o diálogo e a articulação com todos os agentes e entidades para encontrar soluções e encaminhamentos possíveis para a recuperação da autonomia e da dignidade dessas pessoas. Braulio Lara salientou que, embora a iniciativa de implementação de políticas municipais e medidas administrativas seja de competência exclusiva da Prefeitura, trazer os temas à pauta do Legislativo atende suas prerrogativas de intermediar demandas, propor soluções e fiscalizar as ações do Executivo.
“Estamos aqui para trazer para a Câmara essa perspectiva de diálogo. Esse projeto abrange várias áreas para o debate. Entre elas, igrejas, Ministério Público, Defensoria Pública, a administração da rodoviária e segurança pública, que será objeto de nossa próxima audiência”, afirmou Braulio. Criado no fim de julho na Comissão de Desenvolvimento Econômico Transporte e Sistema Viário, o GT realizou a primeira audiência no dia 26 de agosto e debateu temas como saúde, dignidade, trabalho e principalmente a moradia. A próxima audiência está marcada para o dia 21 de outubro, às 13h30, no Plenário Camil Caram. Foram convidados representantes da Guarda Municipal de BH, Polícia Militar de Minas Gerais, Polícia Civil e Ministério Público.
Também participaram da audiência os vereadores Henrique Braga (PSDB), Rogério Alkmin (PMN) e Gilson Guimarães (Rede).
Confira aqui a íntegra da audiência.
Superintendência de Comunicação Institucional