NÚMEROS DA VIOLÊNCIA

Falta de acesso a dados ainda é entrave no combate à mortalidade da juventude negra

Segundo a PBH, órgãos estaduais de segurança não divulgam informações. Plano Municipal de Combate à Letalidade Juvenil será lançado 

segunda-feira, 21 Fevereiro, 2022 - 14:15

Foto: Claudio Rabelo/CMBH

Órgãos de segurança ligados ao governo do Estado de Minas Gerais não estão permitindo, à Prefeitura de Belo Horizonte, acesso a dados sobre homicídios na capital. A situação foi relatada aos vereadores por representantes da PBH em audiência pública da Comissão Especial de Estudo – Empregabilidade, Violência e Homicídio de Jovens Negros, nesta segunda-feira (21/2), que teve como objetivo debater os avanços da política de enfrentamento e prevenção à violência contra a juventude negra. Segundo o Executivo Municupal, com a negativa da Polícia Militar em disponibilizar informações, a produção de dados sobre homicídios de jovens negros na capital é feita utilizando números do SUS-BH, o que pode dificultar o cruzamento de dados e a criação de políticas públicas na área. Com base em relatórios produzidos pela Câmara de BH e pelo Município sobre a morte de jovens, será apresentado durante a Conferência da Juventude o Plano Municipal de Combate à Letalidade Juvenil. O evento ainda não tem data marcada, mas foi confirmado pelo Conselho Municipal da Juventude.  

Lutando por informações

“Dados da PM são inacessíveis para a PBH. Utilizamos dados de homicídios produzidos pelo SUS-BH”, disse Márcia Alves, diretora de Prevenção à Criminalidade da Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção. Segundo Márcia, os registros de homicídios são diferentes, uma vez que a PM registra os casos a partir do lugar onde ocorreram e o SUS não. Márcia destaca ainda que o fato de não ter um Censo Demográfico do IBGE mais atual (o último é de 2010) também dificulta a proposição de políticas eficazes voltadas para a juventude, em especial a juventude negra, pois são necessárias informações como renda, gênero, cor, raça, entre outros. Ainda segundo Márcia, o cruzamento de dados mostra que há “muita desigualdade concentrada” em algumas regiões da cidade.

Para o vereador Gilson Guimarães (Rede), a falta de transparência da PM é inadmissível. “Porque não temos acesso? Eles teriam que disponibilizar os dados”, afirmou o vereador, que recebeu resposta imediata de Márcia Alves: “Dado da PM é exclusivo do governo do estado”. “Acho que a negativa da polícia não pode existir. Esse levantamento se faz necessário. A Câmara tem que solicitar estes dados à PM”, salientou Gilson. De acordo com o subcomandante da Guarda Civil Municipal de BH, Nedson Moreira, é fundamental o acesso às informações. “O Município ainda não tem acesso aos dados da PM. No âmbito municipal os dados (da Guarda Municipal) são abertos. Seria realmente importante ter acesso à base do estado. Teríamos uma visão muito mais ampla”, explicou o subcomandante. Iza Lourença (Psol), que solicitou a realização da audiência, disse que pode pedir oficialmente os números ao governo estadual e solicitar uma reunião.  

Secretário municipal de Segurança e Prevenção, Genilson Zeferino defendeu que é preciso buscar alternativas para obter as informações, cobrando dados do Instituto Médico Legal (IML), criando e ampliando vínculos com instituições como as universidades e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por exemplo. “Se a gente costurar e juntar essas pontas, a gente consegue sair dessa armadilha que é o estado não dar notícia”, disse Genilson. “Como vereador negro e periférico eu exijo que essas informações cheguem sim. Estamos fazendo um trabalho em conjunto e é nosso direito ter essas informações”, afirmou Gilson Guimarães. Para Macaé Evaristo (PT), esse acesso deve ser institucionalizado: “ não pode ser um favor; é uma questão de direito. Me preocupa a gente ainda estar no cenário de precisar de relações pessoais para resolver as coisas”.

Plano de combate ao homicídio

Mesmo com dificuldades de acesso a informações mais precisas sobre homicídios de jovens negros em BH, o Conselho Municipal da Juventude (Comjuve) e a Diretoria de Políticas para a Juventude de Belo Horizonte vão apresentar ainda neste ano um Plano Municipal de Prevenção à Letalidade Juvenil. Elaborado a partir de relatórios sobre o tema feitos pela Câmara e pela PBH, o plano será lançado durante a Conferência Municipal da Juventude, que terá sua data marcada ainda nessa semana, quando o conselho se reúne para definir as diretrizes de trabalho e eleger nova diretoria. “O Plano chega com informações importantes”, disse Paola Abreu, que é vice-presidente do Comjuve e diretora de Políticas para a Juventude da PBH.

Segundo ela, o trabalho foi desenvolvido a partir dos relatórios e de informações da Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção e tem como prioridade jovens em vulnerabilidade e expostos à violência urbana. Entre os eixos estabelecidos no plano estão segurança pública, educação, profissionalização, cultura, comunicação e relação com os territórios. As propostas foram reunidas e enviadas à Prefeitura para análise e execução de curto, médio e longo prazos. “O formato será decidido em reunião nesta quarta e o plano será apresentado à cidade na conferência deste ano”, disse Paola, destacando ainda que é preciso investir mais recursos na área. 

Coordenada pelo Conselho Municipal da Juventude, a comissão que construiu o plano foi criada em julho de 2020 e tem como funções analisar dados coletados nos diagnósticos oficiais da PBH, elaborar o documento e submetê-lo ao conselho, além de dar publicidade ao seu conteúdo. De acordo com Maurício Coleta, que integra a comissão, um amplo debate foi feito para que a proposta fosse finalizada. “Recebemos relatórios e durante um ano trabalhamos no desenvolvimento e aperfeiçoamento. No final do ano passado, entregamos o plano para a Secretaria (Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania)”, disse Maurício, observando que o trabalho foi feito com limitações e que é preciso contar com a Câmara para dar publicidade à proposta e levá-la aos territórios de menor desenvolvimento.

Segundo Thiago Alves, subsecretário de Direito e Cidadania, tudo está sendo feito a partir das demandas da juventude. “A política tem que acontecer de maneira institucional. Nada é feito para os jovens, mas sim com os jovens. É importante estar nesse espaço fazendo este esforço institucional, pois uma hora a gente não vai estar mais aqui, mas a política pública tem que continuar”, disse Thiago. Para Iza, a continuidade do debate é fundamental. “O nosso principal objetivo nessa articulação é sair do papel e implementar as políticas públicas. Após a conferência (Municipal da Juventude) deste ano, a gente volta a conversar sobre o plano”, disse Iza Lourença.

Também participaram dos debates o vereador Marcos Crispim (PSC) e Andréia Roseno (Makota Kissadembu), presidente do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial.

Confira aqui a íntegra da audiência.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública - Finalidade: Discutir o Relatório de Prevenção à Letalidade Juvenil e de Adolescentes - 11ª Reunião -  Comissão Especial de Estudo - Empregabilidade, violência e homicídio de jovens negros