TEA

Mães de autistas denunciam falta de profissionais especializados no SUS

Barreiras no acesso ao diagnóstico e tratamento em BH foram discutidas em audiência pública

quarta-feira, 9 Abril, 2025 - 19:15
criança autista desenha durante reunião da comissão de saúde

Foto: Cláudio Rabelo/CMBH

Compreender os desafios enfrentados no acesso ao diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista e na garantia da atenção à saúde pública para essa população em Belo Horizonte. Com esse objetivo, a Comissão de Saúde e Saneamento realizou audiência pública, nesta quarta-feira (9/4), que reuniu parlamentares, representantes do poder público, profissionais de saúde e também mães de crianças com autismo. A audiência acontece no mês de conscientização sobre o tema, estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como “Abril Azul”. O encontro foi solicitado por Arruda (Republicanos), que justificou a necessidade de entender como se organizam as ações e serviços de atenção à saúde para os autistas em BH. Confira aqui o resultado completo da reunião.

Dificuldades de acesso

As mães presentes na audiência compartilharam experiências semelhantes de dificuldades no acesso à saúde por meio do sistema público (SUS) da capital, sobretudo a consultas com profissionais especializados, como neuropediatras e terapeutas ocupacionais. Cíntia Lemos, mãe do menino Gabriel, lembrou o episódio em que uma pediatra de um centro de saúde disse que ela estaria “tentando achar cabelo em ovo” quando relatou os sinais e sintomas de seu filho. Anos depois, mesmo com o diagnóstico confirmado, Cíntia ainda encontra dificuldades para conseguir tratamento para seu filho. “Neurologista eu estou esperando desde 2019; psiquiatra para ajustar a medicação dele eu estou esperando desde 2022. Nunca consegui passar o Gabriel em um neuropediatra”, relatou a mãe.

Para Maria Gonçalves Souza, também mãe de um menino autista, as barreiras no acesso à saúde não diminuíram com o recebimento do diagnóstico. “Eu já consegui o diagnóstico, só que o SUS fala: ‘hoje não tem vaga’; não tem psicóloga, não tem nada; (...) e na escola, o que está acontecendo é que eles não estão aceitando que ele fique todos os dias, porque ele bate nas crianças”, relatou, pontuando a falta de inclusão “de verdade” e suporte para o cuidado com seu filho.

Falta de profissionais

Dra. Michelly Siqueira (PRD) falou às mães sobre a garantia de direitos conferida pela legislação. Ela lembrou o Artigo 18 da Lei Brasileira de Inclusão, que assegura atenção integral à saúde para a pessoa com deficiência em todos os níveis de complexidade. Porém, o problema, segundo a parlamentar, é a falta de profissionais. “Infelizmente, a gente não tem profissionais especializados no SUS em Belo Horizonte”, disse.

A parlamentar falou sobre pedido de informação que enviou à Prefeitura de Belo Horizonte, que confirmou a carência de profissionais, e defendeu a criação de um centro especializado em autismo e outras deficiências. “A minha orientação enquanto advogada especialista na defesa dos direitos das pessoas com deficiência é que reclamem na Ouvidoria e que reclamem também nesta comissão, para que nós, que temos o poder de fiscalizar, façamos o que a gente está fazendo agora - audiências - e tomemos providências se de fato a prefeitura não tiver as atitudes que se impõem a ela”, declarou.

Kelly Cristina Abrantes, do Conselho Municipal de Saúde, pontuou que as Conferências Municipais de Saúde, espaços de participação social na formulação de políticas públicas, têm levantado a necessidade de ampliação dos Centros de Referência em Reabilitação (Creab). “E para garantir que não entre e saia profissional o tempo todo, que esses profissionais sejam, de preferência, efetivos; contratados e capacitados pela prefeitura para fazer esse atendimento”, defendeu. Ela afirmou que a capacitação dos profissionais vem sendo feita, mas ainda é insuficiente para abarcar todo o número de crianças, adolescentes e adultos que estão chegando na busca de diagnóstico e tratamento. 

Promessa de campanha

Dr. Bruno Pedralva (PT) parabenizou Arruda pela realização da audiência e lembrou uma promessa da atual gestão do Executivo de criação do Núcleo de Atendimento aos Transtornos de Neurodesenvolvimento, com foco em Transtorno do Espectro Autista (TEA). O novo serviço do SUS em BH permitiria atendimento multiprofissional, com avaliação, diagnóstico e acompanhamento dos casos, integrados à rede assistencial da cidade. No entanto, a iniciativa ainda não teria saído do papel. “A gente tem boas evidências científicas de que algumas terapias de reabilitação, e também intervenções para apoio às mães, pais e cuidadores, são benéficas e, infelizmente, o Sistema Único de Saúde em Belo Horizonte — eu acho até que em todo o Brasil — não está dando conta de oferecer”, disse o vereador.

Rede SUS

Representante da Secretaria Municipal de Saúde, Rafaela Sardi de Almeida explicou que a questão do TEA perpassa por toda a rede de atenção à saúde do SUS municipal. “A gente tem atendimento multidisciplinar em todos os pontos da rede”, disse, e enumerou os estabelecimentos, equipes e profissionais envolvidos nesse processo: 153 centros de saúde com 597 equipes de Saúde da Família (eSF); cinco Centros de Referência em Reabilitação (Creab); nove Equipes Complementares de Saúde Mental; 83 pólos do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (Nasf); e três Centros de Referência em Saúde Mental (Cersam) — esse para o atendimento de urgência. 

Tendo os centros de saúde como porta de entrada, o usuário será encaminhado aos demais serviços da rede de acordo com a sua necessidade específica. “É uma rede robusta, mas que, evidentemente, ainda não dá conta de todas as questões”, disse a representante do Executivo. Ela informou que, somente de janeiro a março de 2025, foram atendidas 2.213 pessoas autistas no SUS em BH, número que é praticamente o dobro do total de pessoas atendidas em todo o ano passado, que foi de 4.577 pessoas. 

Também representante da Secretaria Municipal de Saúde, Anelise Prates disse que com a retomada do financiamento federal a expectativa é não somente ampliar o número de equipes profissionais, como aprimorar a capacitação dos profissionais existentes. O Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência prevê, para até o próximo ano, a habilitação de novos Centros Especializados em Reabilitação (CER), que contemplem o atendimento a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), e a inclusão de adicional de 20% mensal no custeio dessas unidades.

Também da Secretaria Municipal de Saúde, Sheila Novaes falou de um projeto itinerante lançado no último ano pela prefeitura, que conta com avaliação multiprofissional para realizar e acelerar o diagnóstico de pessoas que estão aguardando por esse esclarecimento. “Então, hoje, não temos crianças com mais de um ano aguardando nessa fila para o esclarecimento diagnóstico”, informou.

Considerações finais

Rafaela Sardi informou que a Secretaria Municipal de Saúde lançou no último domingo (6/4) uma cartilha para orientar pessoas com TEA e seus familiares sobre seus direitos, acesso a serviços gratuitos ofertados na capital e fluxos de atendimento em unidades da rede SUS-BH. Ela será disponibilizada nos centros de saúde para distribuição à população.

Maninho Félix (PSD) parabenizou Arruda (Republicanos) pela realização do debate importante e lembrou o Dia Nacional de Conscientização do Autismo, celebrado em 2 de abril. A conselheira Kelly Abrantes reforçou o papel do Conselho Municipal de Saúde e convidou as mães a participarem das comissões locais nos centros de saúde mais próximos de suas residências.

Por fim, Arruda agradeceu a todos os participantes, com destaque para as famílias presentes na audiência. “Quero agradecer às mães, que enfrentaram dificuldades para chegar até aqui, mas podem ter certeza que os seus problemas, o que vocês estão enfrentando, terão um acompanhamento”, assegurou o parlamentar.

Confira aqui a reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública - Finalidade: discutir o acesso ao diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista - TEA - 8ª Reunião Ordinária - Comissão de Saúde e Saneamento