Instalação de Casa de Passagem gera insatisfação de moradores do Floresta
Aumento da criminalidade e falta de estudo de impacto da vizinhança e de diálogo com a comunidade são reclamações
Foto: Cláudio Rabelo/CMBH
Os impactos da instalação de um equipamento para acolher pessoas em situação de rua no Bairro Floresta (Rua Flávio dos Santos) foram debatidos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, nesta terça-feira (21/3), a pedido de Wilsinho da Tabu (PP). Moradores e comerciantes dos bairros Floresta e Sagrada Família questionaram a existência de estudo de impacto de vizinhança, externaram a preocupação com a questão da segurança, se declararam espantados com o “pouco caso” da Prefeitura com o polo moveleiro que gera milhões em impostos e “pediram respeito”. Ao denunciar que a PBH está pagando um aluguel superfaturado e fazendo uma obra considerada irregular pelo próprio órgão fiscalizador, eles afirmam não ser contra a população de rua, e sim contra a falta de transparência e diálogo. O coordenador da Regional Leste, Elson Júnior, assegurou que o papel da Administração é equilibrar os interesses da cidade e apresentou um projeto de acolhimento que, segundo ele, vai contribuir para solucionar a questão. O presidente da Comissão, Gilson Guimarães (Rede), disse que vai levar as questões ao prefeito Fuad Noman (PSD) e espera que “ele terá boa vontade para encontrar a melhor solução.”
Obra irregular e aluguel caro
Comerciante da Avenida Silviano Brandão, próxima ao local, Eliane Reis deu um panorama da robustez econômica da via que abriga mais de 200 lojas de móveis, quatro supermercados, seis agências bancárias, sede do Sesc e de sindicatos, hospital e farmácias e uma grande variedade de pequenos comércios, “que nunca tiveram um olhar da Prefeitura que não fosse para multar”. Ao mencionar que a região não recebe a atenção merecida do poder público, ela questionou onde e quando foi feito um estudo de impacto na vizinhança que, segundo ela, “vai passar a conviver diariamente com cerca de mil homens na idade de 18 a 50 anos que ficarão perambulando pela região”.
Eliane afirmou que o prédio localizado na Rua Flávio dos Santos, Bairro Floresta, onde será implantada a Casa de Passagem, não tem estrutura necessária para abrigar 280 pessoas - inclusive com falta de banheiros - e, por esta razão, está passando por uma reforma. Ela denunciou que a obra já foi embargada pela Fiscalização da PBH, mas continua em andamento; que o imóvel, que era alugado por R$16 mil, passou para R$ 85 mil mensais e ainda vai exigir investimentos no valor de R $1 milhão para atender ao projeto da Casa de Passagem.
Wilsinho da Tabu leu o documento da Secretaria Municipal de Fiscalização que confirma que a obra não tem alvará de construção nem responsável técnico e afirmou que trata-se de uma “denúncia muito séria que precisa ser averiguada.” Em seu entendimento, há uma concentração de equipamentos desta natureza na Região Leste. “Precisamos diluir isso na cidade, afinal, é um problema de todos”, ponderou o parlamentar do PP ao afirmar que não acredita que o modelo proposto tenha êxito na recuperação das pessoas.
Falta de segurança
Moradora da vizinhança, Ione chamou a atenção para a insegurança que vai assolar os idosos. Para ela, a instalação do equipamento no bairro se deve a uma requalificação da área central, mas vai “acabar com o entorno do Centro". Marcos Tamietti, do Conselho de Segurança Pública da 2ª Companhia, afirmou que a Polícia Militar estaria preocupada com a situação, pois não tem efetivo para cuidar diariamente de mil pessoas concentradas em uma região. Os participantes também perguntaram se há algum estudo sobre o aumento da criminalidade na área e se a PM já se manifestou sobre a questão, quem está pagando pela reforma do imóvel e, se a obra já foi embargada, por que continua em andamento. Eles pediram que a PBH apresente um estudo de impacto de vizinhança, sugeriram outros locais para acolher o equipamento e querem uma atuação efetiva do Ministério Público. Também foram questionados a taxa de ocupação das casas de passagens já existentes, de profissionalização e de empregabilidade dessas pessoas, qual a série histórica da população de rua e os critérios adotados para escolha da Rua Flávio dos Santos .
Política pública abrangente e participação popular
Já a advogada Kenia Cristina Pontes, moradora do Sagrada Família, lamentou a pouca divulgação da audiência pública sobre a questão e ponderou que, se fosse realizada à noite e mais divulgada, propiciaria um amplo debate coletivo. Reconhecendo que “essas pessoas” precisam de ajuda, Kenia ponderou que a política pública deveria ser completa, com oferta de alimentação e atividades lúdicas e profissionalizantes. Ela reclamou que a PBH não divulga os dados sobre as políticas e ações voltadas para a população de rua.
Representante da Pastoral de Rua, José Davi foi enfático ao afirmar que não há solução sem investir “no cuidado com o indivíduo”. Apontando que o aumento da população em situação de rua é um fenômeno mundial, ele questionou a atuação dos Consultórios de Rua. O promotor de Justiça Francisco Ângelo Assis, do Munistério Público do Estado, lembrou que trata-se de uma pauta complexa que exige a atenção de diversos órgãos, e defendeu a retormada do comitê de população de rua e a realização de reuniões periódicas e debates constantes entre todos os envolvidos.
Pedro Patrus (PT) lamentou que o “público alvo” da discussão não tenha sido convidado para ser ouvido e contribuir com o debate. Ele compreendeu a demanda dos participantes, enfatizando que a implantação de um equipamento desse porte precisa ser precedida de apresentação de dados e de diálogo com a comunidade. O parlamentar reconheceu que a preocupação dos moradores e comerciantes é legítima, mas ponderou que a Casa “tem que ser instalada em algum lugar”.
Respostas da PBH
Representando a Guarda Municipal, Gilson Teixeira dos Santos garantiu que a instituição está disposta a colaborar com a segurança local e relatou que o trabalho da Guarda é desenvolvido de forma integrada com a Polícia Militar, responsável pelo patrulhamento ostensivo.
Elson Júnior salientou a importância de um espaço de diálogo e escuta para tratar do tema e se colocou à disposição para receber as demandas. Ele ponderou que a maioria das falas apontaram a necessidade de uma intervenção diferenciada da Prefeitura, “pois o que está sendo feito não estaria funcionando”. Ele explicou que a Prefeitura tem plano de atuação para mitigar o problema das pessoas em situação de rua e que a Região Leste foi escolhida por estar inserida em um "contexto macro". Discordando da falta de informações, ele mostrou que o portal PBH traz dados públicos.
Representando a Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania, Marcel Belarmino de Souza explicou que a proposta é descentralizar o atendimento do Albergue Tia Branca - que está instalado na região há anos, para melhorar a qualidade do serviço. Segundo ele, serão duas Casas de Passagem na Rua Flavio dos Santos, em imóveis contíguos, com equipe técnica e estrutura de recursos humanos distintas. “As duas juntas vão oferecer pernoite para 280 pessoas. Essas pessoas já são atendidas no Tia Branca. Então, não são mil pessoas circulando”, argumentou.
Insatisfeita com as respostas, Eliane Reis disse que o intuito da audiência pública é questionar as irregularidades atribuídas à PBH. “Estamos aqui discutindo a ilegalidade da obra e a concentração de cerca de mil homens de 18 a 50 anos na região", disse. Ao se defender da acusação de aporofobia, a comerciante disparou: “Não estamos travando uma guerra contra os moradores de rua, mas contra a Prefeitura. O projeto está lindo, mas foi feito um estudo do impacto?", questionou.
Elson Júnior propôs fomentar a aproximação entre o comércio do entorno, os moradores, a GCM e a PM, além de representantes do Executivo e do Legislativo, para que seja feita uma mediação de interesses. “Podemos criar um espaço de discussão permanente para tratar das questões que vão impactar a região, para que a gente consiga equilibrar os interesses”, afirmou.
Superintendência de Comunicação Institucional