CASA DA CIDADANIA

Crianças apresentam suas sugestões sobre a cidade que desejam ter

Mais áreas públicas de lazer, novas modalidades esportivas e voz ativa nas decisões da cidade estão entre as reivindicações

terça-feira, 24 Outubro, 2023 - 15:45

Foto: Bernardo Dias/CMBH

Um espaço na Câmara Municipal para que as crianças tenham voz nas decisões da cidade. Esta foi uma das várias sugestões apresentadas durante audiência pública que debateu os direitos e as percepções das crianças sobre Belo Horizonte. O encontro, realizado pela Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, discutiu com meninos e meninas, de 10 a 13 anos, suas principais reivindicações para a capital mineira. Solicitada por Wagner Ferreira (PDT), a reunião contou também com a participação de representantes da Prefeitura e de dirigentes de movimentos em defesa das crianças. Além do direito ao brincar, a partir do aumento do tempo de recreação nas escolas e da oferta de mais áreas de lazer nas praças, foram apontadas como demandas a ampliação da Escola Integral, a implementação da escola bilíngue em Libras e a oferta de diferentes modalidades esportivas. Crianças moradoras de regiões vulneráveis pediram ainda urbanização das vilas, vagas em creches, escolas dentro da comunidade e Wi-fi. Especialistas lembraram a importância de se cumprir a legislação vigente que determina que crianças são sujeitos de direitos e que políticas públicas para o segmento devem não devem prescindir da participação delas. Além disso, ressaltaram a necessidade de se pensar estratégias que alcancem a diversidade e a individualidade das crianças, como as que estão institucionalizadas ou em hospitais.

Cidade pensada também pelas crianças

A audiência é parte das ações que debatem no Legislativo a criação do Plano Municipal da Primeira Infância de Belo Horizonte. Objeto de proposta parlamentar, por meio do  PL 603/2023, o texto tem entre seus princípios o fortalecimento do vínculo e do senso de pertencimento familiar e comunitário; o desenvolvimento integral da criança, com foco nas interações e no brincar; e a articulação entre administração pública, família, comunidade e sociedade civil para efetivação da prioridade das crianças nas políticas públicas. A proposta foi aprovada, em 1º turno, na tarde de ontem (23/10) e agora as emendas apresentadas serão avaliadas pelas comissões.

Segundo Wagner Ferreira, que também assina o PL, o prefeito Fuad Noman já teria se comprometido com a sanção da medida e então é fundamental que as crianças, em suas diversidades, sejam ouvidas em suas necessidades a partir das políticas públicas ofertadas pelo Município. Precisamos saber o que pensam as crianças sobre a educação, a saúde, a cultura, a alimentação, o meio ambiente e a acessibilidade. Uma cidade que valoriza a infância é uma cidade boa para todo mundo, e temos que mudar essa cultura de fazer uma cidade só pensada pelos adultos”, afirmou o parlamentar ao abrir o encontro.

Desirée Ruas, integra a secretaria executiva da Rede Primeira Infância (Repi-MG) e ressalta a importância de dar visibilidade às demandas das crianças e de tornar compromisso do poder público pensar a cidade também a partir delas. Segundo a especialista, é comum a percepção de que elas não estariam capacitadas, mas isso trata-se de um equívoco. “Elas nos permitem ter uma visão sensível e completamente diferente. As crianças enxergam coisas que nós adultos não enxergamos e trabalhar juntos, adultos e crianças, nesses processos é de fundamental importância, para que elas não tenham apenas participações figurativas”, explicou, lembrando ainda ser importante criar e consolidar os espaços de participação infantil.

Crianças em suas diversidades

Ouvir as crianças implica em reconhecer suas individualidades e necessidades. Foi a defesa de Jacqueline Dantas, que se dedica à infância hospitalizada. Segundo a pedagoga, é preciso pensar que existem crianças que passam boa parte da vida em um hospital, e outras, entretanto, que passarão a vida inteira.  Para a especialista, é preciso pensar estratégias para que essa criança não perca a infância e que ela tenha acesso à bens que são comuns a todas as crianças. “Existe uma lei que determina a criação de brinquedotecas nas unidades que ofertam tratamento pediátrico e infelizmente ela não é cumprida. Negligenciamos estes espaços, que são locais onde elas poderiam ter um respiro da dor de um tratamento. Além disso, existem crianças em locais aos quais estamos acostumados, como escolas e praças, mas existem crianças institucionalizadas, nas prisões com suas mães e precisamos garantir o direito de todas ao brincar”, afirmou.

As irmãs Thayane e Thayná integram o Movimento Bilíngue e na audiência apontaram a dificuldade das crianças surdas em viverem em uma cidade não acessível. Filhas de pais também surdos, segundo Thayná, a rede da saúde, por exemplo, não é inclusiva. “Fomos ao médico, ele era só ouvinte e não tinha intérprete disponível. Agora quando vamos a uma consulta, pagamos pelo intérprete. Então é difícil”, contou, defendendo ainda a criação de uma escola bilingue para que professores possam ensinar em Libras.

Lazer, escola integral e infraestrutura

E se as crianças são diversas, o que elas querem da cidade e para a cidade parece espelhar isso. Lucas, Emily, Kaunany e Arthur são alunos da Escola Municipal Hebert José de Souza, no Bairro Novo Aarão Reis e trouxeram como demanda a criação de mais parques com bebedouros e banheiros; oportunidade para novas práticas esportivas, além do futebol e mais vagas na Escola Integral.

A Associação Buritis de Esporte e Cultura (Abesc) atua no esporte como forma de promover a atividade motora, a socialização e a cognição das crianças. O trio Clara, Julia e Luan é atendido pela entidade e trouxe como sugestões a ampliação do horário do recreio nas escolas e a criação de quadras públicas de handebol, além da manutenção das que já existem.

Moradores da comunidade Dandara, Esther, Rodrigo e Kiara disseram que seria importante que o bairro tivesse escolas próprias, já que é caro pagar escolar para o transporte para outros bairros; aulas de reforço nas escolas, além de criação de uma rotatória na entrada do bairro e asfaltamento das ruas, para que não haja alagamentos e lama no período chuvoso.

Escuta e espaço de voz

Dirigentes da Secretaria Municipal de Educação (Smed) concordaram com a importância e necessidade de uma escuta atenciosa das demandas das crianças. Vânia Machado, gerente de Coordenação Pedagógica da Educação Infantil ressaltou que no Município a prática é uma prioridade. “A criança já é um sujeito de possibilidades e na educação infantil a nossa proposta é essa de ouvir. Isso não acontece do dia para a noite, nossa estrutura não nos dá muita condição, mas com o que temos é para ontem”, destacou.

Para o encerrar o encontro, Júlia Bonitese apresentou algumas de suas demandas. A ativista ambiental, que tem 11 anos, defendeu o incremento dos espaços de lazer como forma da criança estabelecer vínculo e interesse com a cidade e a comunidade em que vive, a fim de gerar compromisso ambiental e social com o país e o planeta.

Após uma pesquisa com os seguidores na sua rede social, Júlia destacou como principais reivindicações das crianças: a falta de praças e de brinquedos, bancos e árvores nas que existem; a falta de manutenção nos parques e de opções de brinquedos que possam desafiar a inteligência das crianças, além da impossibilidade de brincadeiras com água. “Não temos um lugar onde possamos ligar uma mangueira e brincar. Temos os clubes e parques aquáticos, mas são espaços pagos e isto é um problema, porque nem todos podem pagar”, descreveu.

Júlia Bonitese finalizou o debate dizendo que irá trabalhar para que BH tenha um local para o debate e a escuta dos interesses das crianças. Segundo a ativista, o artigo 4º do Marco Legal da Primeira Infância prevê que as políticas públicas voltadas ao atendimento dos Direitos da Criança na primeira infância devem ser elaboradas e executadas de forma incluir a participação da criança na definição das ações que lhes dizem respeito e em conformidade com suas características etárias e de desenvolvimento. “Por isso vou lutar e já estou lutando para ter um Conselho Mirim aqui na Câmara Municipal.  São Paulo já possui desde 2019, e já tem muita mudança acontecendo lá. E eu tenho certeza de que também conseguimos fazer essas mudanças se a gente realmente se empenhar”, finalizou.

Assista à íntegra da reunião.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater com as crianças seus direitos e suas percepções sobre a cidade de Belo Horizonte - 35ª Reunião Ordinária - Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor