Primeiras testemunhas foram ouvidas em processo contra o presidente Gabriel
Wagner Ferreira, Miltinho CGE e Wesley Moreira se pronunciaram sobre supostas ofensas contra membros do PDT
Foto: Bernardo Dias/CMBH
A Comissão Processante que apura denúncias por suposta quebra de decoro contra o vereador Gabriel (sem partido), presidente da Câmara de BH, realizou a primeira oitiva nesta terça-feira (31/10), quando foram recebidos, na condição de testemunhas, os vereadores Wagner Ferreira (PDT), Miltinho CEG (PDT) e Wesley Moreira (PP), arrolados pela autora da denúncia, a ex-vereadora e hoje deputada federal Nely Aquino (Pode). Selecionadas por sorteio, integram a Comissão Processante as vereadoras Janaina Cardoso (União) e Professora Marli (PP) – presidente e relatora, respectivamente – e Iza Lourença (Psol).
No encontro desta terça, estiveram em foco, especificamente, os trechos da denúncia que fazem menção às palavras dirigidas pelo presidente a vereadores do Partido Democrático Trabalhista (PDT) em audiência pública da Comissão de Mobilidade Urbana. Nos termos do item II.3 da representação, dirigindo-se ao ex-secretário municipal de Governo, Josué Valadão, Gabriel disse que “a Câmara Municipal não é ‘um brinquedinho seu... talvez... se o senhor elegesse um lambe-botas do PDT”; e teria, ainda, se referido ao vereador Wagner Ferreira, também pedetista, como "resto de ontem". O ato levou o líder de governo, Bruno Miranda (PDT), a se manifestar em Plenário, onde afirmou que Wagner, “que é negro e periférico”, teria sido desrespeitado pelas palavras de Gabriel. Ainda segundo a denúncia, o presidente voltou a ofender os colegas vereadores, chamando-os de "pelegos" em oportunidade posterior.
Oitivas
Tanto Wagner Ferreira quanto o colega de partido Miltinho CGE e Wesley Moreira, que é membro da Comissão de Mobilidade Urbana, reiteraram os termos da denúncia, classificando as palavras proferidas por Gabriel como atos que atentam contra o decoro parlamentar. Questionado pela relatora da Comissão Processante, Professora Marli (PP), a respeito do impacto das ofensas, Wagner Ferreira, parlamentar diretamente atingido pelas manifestações do presidente, afirmou que a situação teria causado mal-estar, inclusive em âmbito familiar e social, uma vez que atingiu sua honra. “Temos divergências, mas não podemos perder o decoro”, afirmou o vereador. “Devemos ser exemplos para a sociedade como um todo e não praticar nenhum ato que possa configurar qualquer tipo de violência”, concluiu. Na mesma perspectiva, Miltinho CGE apontou que as intervenções do presidente teriam humilhado o colega parlamentar e prejudicando sua imagem, além de afrontar o Partido Democrático Trabalhista.
Defesa
Representante do denunciado, o advogado Ricardo de Oliveira retomou, na oitiva, apontamentos já apresentados na defesa prévia do presidente, sugerindo que as críticas dirigidas a colegas, “por mais ácidas que tenham sido”, seriam ocorrências comuns no ambiente de debate político, protegidas pelo direito ao livre exercício da atividade parlamentar. O advogado mencionou que o ex-governador do Ceará, Ciro Gomes, vice-presidente e figura de proa do PDT, agremiação que teria sido desrespeitada pelas intervenções de Gabriel, usou a mesma expressão adotada pelo vereador – “lambe-botas” – para se referir, em convenção nacional do partido, ao ex-ministro e hoje Senador da República Sérgio Moro.
Questionadas sobre o fato, as três testemunhas consideraram que as palavras de Ciro Gomes também seriam condenáveis e eventualmente passíveis de medidas de sanção, por afrontar a honra de outrem.
Responsabilização
Em seu depoimento, Wesley Moreira lembrou que, segundo o arcabouço jurídico brasileiro, parlamentares podem ser responsabilizados por falas proferidas no exercício da função, inclusive com perda de mandato. Como exemplo, ele citou o caso de Camilo Cristóforo, ex-vereador por São Paulo, que foi processado e perdeu o mandato, por decisão do Plenário, no último dia 19 de setembro, por ter se manifestado com expressões consideradas racistas durante os trabalho de uma CPI realizada pelo Legislativo paulistano.
Denunciado e defesa rechaçaram quaisquer equivalência entre os casos de Cristóforo e Gabriel, negando que as críticas externadas pelo presidente da Câmara de Belo Horizonte tenham quaisquer ligações com o fato de Wagner Ferreira ser um político negro e periférico. Na oitiva, Gabriel afirmou se identificar como um político envolvido na luta contra a discriminação racial. Já a defesa do parlamentar chamou a atenção para a necessidade de não se banalizar, no âmbtio dos trabalhos da Comissão Processante, causas importantes como a luta antirracista, por meio da criação de falsas similaridades entre o processo em andamento na CMBH e a situação ocorrida em São Paulo, que culminou na condenação de um parlamentar envolvido em episódio de racismo.
Racismo e Transfobia
Ao refutar ter cometido crime de racismo, o denunciado apontou que, em 2021, Wesley Moreira teria cometido contra a ex-vereadora Duda Salabert o crime de transfobia – ato enquadrado pelo STF na tipificação da Lei do Racismo. Segundo Gabriel, Moreira teria afirmado, em Plenário, no dia da posse dos vereadores eleitos para a atual legislatura (1º/1/2021), que a mulher mais votada de Belo Horizonte seria a Professora Marli (que obteve 14,5 mil votos) e não Duda (que recebeu mais de 37 mil). O gesto de negação da identidade de gênero da parlamentar, classificado por Gabriel como transfóbico, não deu origem à abertura de um processo de cassação por quebra de decoro contra o parlamentar.
Em resposta, Wesley Moreira afirmou que reconhece Duda Salbert como uma mulher transexual e que o episódio já foi superado, uma vez que mantém boas relações com a deputada, que hoje considera uma amiga.
Segundo Gabriel, a intervenção de Moreira seria indicativo da desproporcionalidade da sanção que se busca impor a seus atos: “hoje estou sendo julgado pelo o que eu falo, como se nesta Casa, outras pessoas, em algum momento, não tivessem falado coisas das quais se arrependem, pelas quais pedem desculpas, assim como o vereador Wesley colocou aqui”, concluiu o denunciado.
Próximas oitivas
Nesta quarta (1º/11), a vereadora Flávia Borja (PP) deve se pronunciar, como testemunha, sobre as ofensas que, segundo a representação, teriam sido dirigidas a ela. Felipe Espírito Santo, assessor de Marcos Crispim (Pode), e o próprio vereador, que serão ouvidos às 10h e às 11h, respectivamente, vão depor sobre a suposta utilização da estrutura e do pessoal da Câmara, pelo presidente, para obter indevidamente a assinatura do corregedor em decisão de arquivamento de representação.
As sete testemunhas restantes e o denunciado serão ouvidos na próxima semana, entre os dias 6 e 8 de novembro. Após finalizadas todas as oitivas, será aberto prazo de 5 dias para que o presidente apresente, por escrito, suas alegações finais. Na sequência, Professora Marli deverá elaborar um parecer final sobre o pedido de cassação, que será votado pela Comissão Processante. Posteriormente, a denúncia segue para apreciação do Plenário, onde são necessários os votos de 28 dos 41 membros do Legislativo para a cassação do mandato de Gabriel. A Comissão Processante tem um prazo total de até 90 dias para concluir seus trabalhos.
Superintendência de Comunicação Institucional