Lei Kandir

Município e sindicatos lamentam perda de receitas em decorrência da legislação

No ato de entrega do relatório, previsto para o dia 9 de outubro, comissão vai convocar toda sociedade para reivindicar recursos perdidos

quarta-feira, 13 Setembro, 2017 - 20:45
Comissão Especial de estudos sobre impactos da Lei Kandir recebe sindicalistas e representantes da PBH

Foto: Rafa Aguiar/CMBH

Em sua última audiência pública antes da elaboração e entrega do relatório final, a Comissão Especial de Estudo - Impactos da Lei Kandir recebeu nesta quarta-feira (13/9) representantes da Secretaria Municipal de Finanças, Conselhos Municipais de Educação e de Saúde e da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) para obter informações e conhecer o posicionamento desses atores a respeito do tema. Constatando o alinhamento geral em torno da necessidade de garantir o ressarcimento das perdas de receitas, o presidente e o relator convocaram a mobilização de todos para pressionar o Congresso Nacional e garantir os direitos do município.

Na abertura da reunião, o relator Gilson Reis (PCdoB) lembrou a finalidade dos trabalhos da Comissão Especial, cuja finalidade, além de apurar e avaliar as perdas trazidas ao Município de Belo Horizonte pela Lei Kandir, é unir forças com o governo do Estado, Assembleia Legislativa e outros setores políticos e econômicos prejudicados, contribuindo para pressionar os deputados federais e senadores pela aprovação de lei federal que garanta as contrapartidas aos entes federados e o pleno ressarcimento das perdas geradas pela isenção fiscal. Aprovada por 11 votos a zero, a decisão do Supremo Tribunal Federal dá prazo até novembro deste ano para que o Congresso Nacional regulamente a questão.

De acordo com dados levantados pela Secretaria de Estado da Fazenda e outras apurações já realizadas, o montante de recursos perdidos por Minas Gerais já atingiria mais de R$ 135 bilhões até 2016; por sua vez, o município teria deixado de receber entre R$ 3,8 e 4 bilhões, que de acordo com representantes dos Conselhos Municipais de Saúde e de Educação seriam suficientes para resolver problemas como a falta de vagas na educação infantil, possibilitariam a ampliação, reorganização e reestruturação das escolas públicas e da rede pública de saúde, promovendo um salto de qualidade na prestação de serviços à população, estimulando a economia como um todo e gerando emprego e renda para os belo-horizontinos.

Representando também a Secretaria Municipal de Governo, o auditor de Tributos Municipais da Secretaria Municipal de Finanças, Omar Pinto Domingos, e o auditor fiscal da pasta da Fazenda, Carlos Manoel Monteiro, afirmaram que a equipe econômica da PBH realiza um acompanhamento intenso e permanente das receitas transferidas (repasses) do estado e da união, importantíssimas para o orçamento da cidade. Esses repasses, segundo eles, integram o pacto federativo instituído pela Constituição de 1988, que delegou funções e competências aos estados e municípios.

Omar ressaltou o histórico do atual governador Fernando Pimentel, que atuou à frente da Secretaria Municipal da Fazenda (1994) e depois como prefeito da capital, conhecendo bem as dificuldades e as necessidades do município. Conforme o auditor, o atual secretário de Estado da Fazenda, José Afonso Bicalho, que também já ocupou a pasta municipal, também tem cooperado nos esforços para restabelecer o equilíbrio do pacto federativo, quebrado pela Lei Kandir. Os gestores ressaltaram que, na ocasião de sua aprovação, os representantes dos estados devem ter concordado apenas após obterem o compromisso de compensação das perdas decorrentes.

Recursos solucionariam problemas

De acordo com os participantes, do ponto de vista institucional, a competência tributária pertence ao estado, que detém o direito e a precedência na exigência da correção dessas perdas; porém, os municípios, a quem cabe o repasse de 25% das receitas de ICMS, também tiveram perdas e precisam se posicionar, reivindicando o ressarcimento e outras contrapartidas. Representantes dos Conselhos Municipais de Educação, Maria de Fátima Aguiar, e de Saúde, Eliane Pereira dos Santos, reforçaram a palavra do relator e dos gestores municipais, disponibilizando-se para esclarecer e divulgar o assunto junto aos membros dos conselhos e seus interlocutores.

O diretor jurídico da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Leonardo Catão, e José Eustáquio de Castro, do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo no Estado de Minas Gerais (Sitramico-MG), apontaram o agravamento da situação provocada pela crise fiscal “brutal” que atinge os entes federativos. Catão lembrou que o texto original da Constituição de 88 previa a incidência do ICMS sobre produtos não industrializados, e que a Lei Kandir gerou uma mudança profunda no mecanismo de tributação, desequilibrando o pacto federativo. Nos anos 90, segundo ele, “ainda se sonhava com um projeto nacional”, mas a opção por uma política macroeconômica que ancorou o combate à inflação no câmbio, que considera “um equívoco sobre qualquer perspectiva que se olhe”, acabou por engessar o desenvolvimento industrial.

Para eles, além de sanar o passivo, o que pode ser efetivado por meio do Encontro de Contas – proposta pela qual os valores devidos ao estado seriam abatidos das dívidas deste com a União – é necessário empunhar e defender a bandeira da revogação da lei, já que por meio dela abriu-se mão de um mecanismo fundamental para o desenvolvimento.

“Carta de Diamantina”

O relator e o presidente da comissão especial, Mateus Simões (Novo), mencionaram a reunião capitaneada pelos governadores de Minas Gerais e do Pará, cuja economia se encontra bastante ancorada na exploração e exportação de minérios em estado bruto (produtos primários e in natura são os beneficiários principais da isenção fiscal), desestimulou as atividades de beneficiamento e agregação de valor, inibindo a industrialização. Estados produtores de commodities, segundo eles, são os mais prejudicados pelo benefício fiscal concedido a mineração e outros produtos primários, que acarretaram na perda de receitas e desestímulo à industrialização, o que agrava as perdas econômicas. Do encontro, foi extraída a Carta de Diamantina, já divulgada pela imprensa.

Simões ressaltou que o governo federal é implacável ao cobrar ajustes e a correção orçamentária dos entes da federação, especialmente para garantir que sejam capazes de pagar suas dívidas para com a União, cujo pagamento em dia exige esforços muito grandes e retira recursos de setores mais relevantes e urgentes para a população e ações básicas de cidadania. Os participantes concordaram que, independentemente da fonte do recurso e da partilha pactuada de responsabilidades e receitas, à população - que na prática habita a cidade, e não o Estado ou a União - interessa apenas o exercício adequado das atribuições e competências de cada ente, que devem realizar da melhor forma o acerto de suas contas. Durante o debate, foi mencionado ainda que o preço de commodities não é determinado pelo custo, e sim pelas oscilações e dinâmicas do mercado internacional, o que torna sem sentido oferta do benefício em nome da viabilização do negócio.

Os vereadores criticaram o aumento da concentração de recursos nas mãos da União em detrimento das outras esferas de governo, que teriam passado de 64% para 78%, e demonstraram preocupação com o conteúdo do acordo proposto pelos governadores, o qual não sinaliza sobre essa questão nem contempla de forma explícita os direitos e interesses dos municípios. Em BH, segundo Simões, convivemos com déficit corrente da ordem de R$ 300 milhões ao ano, que vem se acumulando. A revogação da lei, no entanto, para ele demandaria uma discussão mais complexa.

Aprovação e entrega do relatório

De acordo com Gilson Reis, a reunião desta quarta encerrou a etapa de audiências públicas que, juntamente com o encaminhamento de pedidos de informação e colheita de dados, permitiram à Comissão Especial apurar números concretos e avaliar melhor os impactos gerados pela Lei Complementar 87/96 sobre as finanças do estado e do município, bem como obter os posicionamentos de entidades e setores envolvidos ou afetados. No total, foram realizadas dez reuniões, com e sem a participação de convidados, que segundo o relator criaram condições objetivas para a compreensão da questão e seu encaminhamento nos interesses do município.

O parlamentar informou que o próximo passo será a consolidação das informações e sugestões apresentadas durante os debates em um relatório, que deverá ser discutido e aprovado pelos integrantes do colegiado no próximo dia 27 de setembro. Já a apresentação do documento final e sua entrega às autoridades e à população serão feitas durante um ato público no dia 9 de outubro, a partir das 9h, no Plenário Amynthas de Barros, para o qual serão convidados o governador do estado, o prefeito da capital e outras autoridades, Fiemg, CDL, conselhos, entidades e organizações da sociedade civil.

Segundo os vereadores, é essencial o alinhamento e a mobilização de todos os setores políticos e econômicos e da sociedade civil em torno da questão, pressionando o governo federal e o Congresso no sentido de exigir as devidas contrapartidas pelo desequilíbrio fiscal produzido pela Lei Kandir e o ressarcimento das pesadas perdas já sofridas pelo município. “A ideia é encher a Casa para reforçar a reivindicação”, declarou Gilson Reis.

Superintendência de Comunicação Institucional

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