Comunidades reivindicam participação em gestão privada de feira e mercado
Em audiência, moradores defenderam a preservação da feira coberta e do mercado distritral, sob gestão privada
Foto: Bernardo Dias / CMBH
Espaços tradicionais das Regiões Leste e Noroeste de Belo Horizonte para a venda de produtos da agricultura familiar de todo o Estado, além de cultura e artesanato estãp hoje sob gestão privada. É o caso do Mercado Distrital de Santa Tereza e da Feira Coberta do Padre Eustáquio. A necessidade de preservação e de reforma e a maneira de funcionamento desses locais foram tema de audiência pública da Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo, na quinta-feira (20/8). Movimentos, Associações e Conselhos Municipais defendem, com o apoio de vereadores, a discussão de diretrizes, com ampla participação das comunidades envolvidas. Na audiência, a Fundação Doimo, vencedora de licitação para concessão dos espaços, comprometeu-se a realizar novas reuniões com pequenos produtores, moradores, usuários e Conselho Municipal de Cultura, a fim de definir ações imediatas, buscando atender aos anseios da população.
Na abertura da audiência, lembrou-se que o Mercado de Santa Tereza e a Feira Coberta do Padre Eustáquio são espaços tradicionais da cidade, que a Prefeitura de Belo Horizonte abriu um processo de licitação para a exploração desses espaços, vencendo a licitação a Fundação Doimo. Destacando a importância de se manter um compromisso com as comunidades dessas regiões, de acordo com o que regem os editais, valorizou-se, também, a preservação do aspecto cultural, da agricultura familiar, orgânica e agroecológica, e de manifestações artísticas nesses dois espaços.
Mercado Distrital de Santa Tereza
Conforme informou o vencedor da licitação e presidente da Fundação Doimo, Elias Tergilene Pinto Júnior, a entidade pretende manter toda a representação cultural, artística e gastronômica que existe em Santa Tereza e que irá chamar a comunidade para uma reunião no Mercado, para uma conversa com os arquitetos e a definição de questões conceituais. Ele sinalizou a intenção de realizar uma feira nos finais de semana no local, com uma área de gastronomia, incluindo um parque de diversões para crianças e horário de funcionamento que atenda melhor ao bairro; uma área para a agricultura familiar, com queijos, cachaça, linguiças, verduras e frutas; uma área de artesanato; e uma área destinada a cultura e arte, com música e apresentações culturais.
Para a implementação dessas ações, disse que a Fundação precisa se inteirar sobre a disponibilidade de artesãos no bairro para se manter-se uma feira; ou se seria necessário convidar pessoas da Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena ou de outras feiras, por exemplo. Outra questão apontada foi se há número suficiente de restaurantes interessados em se instalar no mercado, para se montar uma área de gastronomia.
Reafirmando o interesse em realizar uma gestão compartilhada com a comunidade, sugeriu, também, que seja feito um levantamento da área que cada profissional ocuparia no mercado, para que seja montado um layout. O empresário avalia que é possível que o mercado volte a funcionar sem uma reforma, que poderia ser feita gradativamente, já que intervenções levam no mínimo dezoito meses. Tergilene destacou que, num primeiro momento, poderiam ser reformados os banheiros, feita uma limpeza da área externa, contratando-se, ainda, o serviço de paisagismo. Ele propôs, também, que os muros do mercado sejam tombados, visando que o mesmo ganhe a aparência de um jardim, de uma praça de Santa Tereza, de modo que todos que por lá transitem vejam seu interior. Outra proposta apresentada foi a realização de uma feira na área externa do mercado, de segunda a domingo, com a participação do pessoal da Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena, por exemplo, em um dia da semana.
Memória do espaço
Brígida Alvim, do Movimento Salve Santa Tereza, resgatou, na audiência, a história do Mercado de Santa Tereza, na Região Leste da cidade, lembrando que este foi aberto em 1974, formando muitos laços com a comunidade e tornando-se um espaço de referência para a região, no fornecimento de alimentação saudável, vendida por pequenos produtores; e um espaço de convivência, socialização e lazer. Contudo, segundo ela, o mercado foi fechado há treze anos e, em 2009, houve, por parte da PBH, uma tentativa de dar um outro uso para o mesmo, tornando-o uma sede da Guarda Municipal; mas a comunidade não aceitou, manifestando-se por meio de abaixo-assinado. Em 2013, cogitou-se a cessão de uso para a Fundação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), sem consultar a população. À época, a Prefeitura efetivou a cessão, quando a comunidade reagiu, novamente, contra a privatização, discutindo o tema em audiências públicas e assembleias, junto ao Ministério Público, manifestando-se por meio de abaixo-assinado e na imprensa. Desta forma, não foi efetivada a ocupação, que, para Alvim, contrariava não somente a comunidade, mas a proteção do equipamento, que desde o final da década de 1990 é uma Área de Diretrizes Especiais (ADE), o que impede a verticalização.
A partir de 2013, quando surgiu o Movimento Salve Santa Tereza, que continuou a luta para reabertura do mercado, foram feitas várias assembleias públicas no bairro. Foi iniciado um trabalho para conhecer o desejo dos moradores quanto à questão, com grupos focais, que resultou na produção de um documento, que apontou que todo o bairro desejava a volta do mercado, tradicional, popular e distrital. De 2014 a 2018, foram realizados eventos periódicos nas ruas, com a participação de produtores da agricultura urbana e do interior de Minas, sobre o que seria esse mercado. Recentemente, tentou-se impedir sua privatização, sob pena de perder-se autonomia e liberdade de utilização; entretanto, a PBH deixou claro que não iria investir no mercado. A comunidade chegou a participar do processo de manifestação de interesse, para posicionar-se quanto às diretrizes de ocupação, mesmo sabendo que não teria condições de participar do edital e, assim, a Fundação Doimo foi a única interessada e em condições de investir na reforma e manutenção do mercado. Colocando o Movimento Salve Santa Tereza à disposição para contribuir com o projeto, Alvim salientou que o movimento conta com parceiros, como organizações de agroecologia e agricultura urbana, artistas do bairro e da região, incluindo artistas de circo, ceramistas e artesãos.
Edital de Concessão
Segundo a subsecretária de Segurança Alimentar e Nutricional, Darklane Rodrigues, o edital prevê a criação de um Comitê Comunitário Permanente com o concessionário, mediado pela gestão pública, com a participação do Conselho Municipal de Segurança Alimentar. Ela destacou que o Mercado de Santa Tereza possui uma área aberta, verde, mas que também tem uma área destinada à atividade produtiva coletiva da agricultura urbana, para funcionar dentro do mercado. Além disso, segundo Rodrigues, está garantido também no edital um espaço de comercialização no local, o Armazém da Agroecologia, onde serão acolhidos pequenos produtores, num espaço gratuito.
A gestora contou, por fim, que estão previstos, ainda, dentro do mercado, boxes incentivados, de baixo custo, voltados a pequenos empreendedores, da economia criativa e solidária e da agricultura familiar.
Feira coberta do Padre Eustáquio
No que se refere aos debates sobre a Feira Coberta do Padre Eustáquio, a Comissão destacou que, diferentemente, do Mercado de Santa Tereza, o espaço encontra-se em funcionamento, com a presença de permissionários e com um centro cultural, que oferece atividades para todas as idades. A Prefeitura pretende transferir o centro cultural para outro local, no Bairro Carlos Prates, o que é permitido no edital; mas a comunidade reivindica a permanência do mesmo no Padre Eustáquio, considerando que, com a mudança, o espaço atenderia a outras pessoas e não ao público do bairro.
Ações programadas
O vice-presidente da Fundação Doimo, Bernard Siríaco Martins, informou que, em relação aos permissionários, estes irão permanecer na feira coberta, pois já fazem parte da comunidade e da cultura do bairro e da região. Quanto ao centro cultural, afirmou que a Prefeitura procurou encontrar uma área próxima ao Padre Eustáquio para a realocação do espaço, com a construção de instalações mais modernas, acessíveis e funcionais. Para ele, o centro cultural não está diretamente relacionado ao mercado, principalmente porque metade de sua área destina-se ao centro cultural, ou seja, a outra atividade. Portanto, considera que, desta forma, o empreendimento não será efetivo para a cidade, não gerando segurança alimentar, consumo e renda, não atraindo público, nem tampouco novos operadores, mas limitando-se a uma “feirinha” abandonada e precarizada, como avalia a situação atual. Todavia, tranquiliza as pessoas que lá frequentam e os administradores, garantindo que o local será fechado somente quando o outro espaço estiver pronto.
Vereadores relataram a preocupação do setor cultural com a localização do novo espaço, para onde será transferido o centro cultural da feira do Padre Eustáquio, considerando que este está situado ao lado de um hospital e em frente a uma igreja, na Rua Padre Eustáquio.
Encaminhamento
No que se refere ao Mercado de Santa Tereza, a Comissão deliberou pela realização de reunião com o vencedor da licitação, juntamente com movimentos, associações comunitárias e Conselho Municipal de Cultura. Quanto à Feira Coberta do Padre Eustáquio, foi proposto um diálogo da Fundação com a comunidade, incluindo a de Santa Tereza, centro cultural e usuários, buscando, se possível, manter o espaço na área externa da feira.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional