DIREITO AO ENSINO

Comissão quer que estudantes frequentem escolas próximas de suas residências

Encaminhamento de alunos para escolas distantes de suas moradias contraria lei e foi tema de discussão em audiência

quinta-feira, 28 Abril, 2022 - 19:15

Foto: Abraão Bruck/CMBH

A inscrição de crianças e adolescentes na rede pública de ensino por meio de sistema virtual vem gerando grandes transtornos às famílias. O direcionamento das vagas escolares para os alunos, por vezes, está sendo realizado em desacordo com o que estipula o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), que prevê o acesso do estudante à escola pública mais próxima de sua residência. Durante audiência pública realizada pela Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo, nesta quinta-feira (28/4), mãe de duas crianças relatou que as filhas foram encaminhadas para escola estadual distante de onde moram, trazendo prejuízos para a vida escolar das estudantes. O caso é um entre muitos, conforme expôs representante do conselho tutelar ao contar que são comuns as denúncias de pais de alunos que não conseguem matricular seus filhos em unidades próximas às suas casas. Vereadores vão pedir esclarecimentos sobre o georreferenciamento das escolas e as listas de espera por vagas aos governos estadual e municipal, que não enviaram representantes à audiência. 

Cadastramento pela internet

Carlos Alberto dos Santos Junior, conselheiro tutelar da Regional Nordeste, explicou que em 2019 o governo do estado adotou, pela primeira vez, o cadastro escolar pela internet e, em 2020, chegaram ao conselho vários casos de famílias que ou não conseguiram vagas para os estudantes ou acessaram vagas em unidades muito distantes de suas residências. Segundo Carlos Alberto, este problema ficou suspenso durante a pandemia, quando as atividades escolares deixaram de ser presenciais, contudo, neste momento de retorno de estudantes para as salas de aula, a situação, que fere a legislação federal, volta à tona, e denúncias tornaram a ser feitas.

O problema se agravou, segundo o conselheiro, depois que também a PBH se adequou ao cadastramento escolar de estudantes pela internet. Ele salientou que famílias em situação de vulnerabilidade social por vezes não têm acesso à internet e, assim, apresentam dificuldade para inscrever suas crianças e adolescentes no sistema de ensino. Além disso, no cadastramento escolar pelo sistema digital, os pais não têm com quem conversar em caso de problemas para efetuar a inscrição e, com isso, diversas denúncias chegam ao conselho tutelar, órgão responsável por zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes. Chamados a agir por meio de denúncias de ameaça ou violação consumada de direitos da criança e do adolescente, os conselheiros atuam para que nenhum deles fique fora da escola.

Carlos Alberto afirmou que a falta de acesso a vagas escolares, além de impedir que as crianças estudem, retira de famílias em situação de vulnerabilidade social, beneficiárias de programa de transferência de renda, os recursos básicos para a sobrevivência, uma vez que o benefício não é concedido quando a criança não está matriculada. Outro problema vivido por pais que não conseguem vagas para seus filhos em escolas públicas ou conseguem apenas em unidades de ensino muito distantes de suas residências é a dificuldade de trabalhar, uma vez que ficam sem ter com quem deixar suas crianças.

Georreferenciamento

De acordo com o conselheiro tutelar Carlos Alberto, o problema do encaminhamento de crianças para escolas muito distantes de suas residências pode estar no georreferenciamento adotado pelo sistema de cadastramento escolar. Por exemplo, a casa pode ficar a menos de 1.200 metros de uma escola, contudo, a moradia pode estar em uma região diferente daquela onde se enconrtra a unidade de ensino, segundo critérios adotados pelo governo. Nesse caso, a criança seria mandada para uma escola distante de sua casa, porém, localizada na mesma região. Uma possível solução para o problema seria garantir que crianças e adolescentes fossem encaminhados para unidades de ensino localizadas a menos de 1.200 metros de suas residências independentemente da região em que cada uma estiver localizada.

Tatiane Cristina Gonçalves Barbosa, mãe de crianças de 10 e 8 anos, mora próximo a duas escolas públicas, contudo, as meninas foram encaminhadas para estudar na Escola Estadual Sagrada Familia I, no Nova Vista, que é distante de sua residência. “Situação muito preocupante”, afirma Tatiane, ao destacar que é muito cansativo pra as meninas percorrerem o longo trajeto entre casa e escola todos os dias de aula.

Encaminhamentos

Macaé Evaristo (PT) afirmou que há vários indícios de que muitas crianças estejam fora da escola, contudo, há dificuldade de obter dados sistematizados a esse respeito. Ela salientou que o próprio formato virtual para inscrição de alunos já é um entrave para a matrícula de estudantes em situação de vulnerabilidade social. Diante desse cenário, ela solicitou que os conselhos encaminhem à comissão dados com o número de famílias que vivem esta situação.

Marcela Trópia (Novo) afirmou que vai relatar ao governo estadual os casos especificados de crianças encaminhadas para escolas distantes do local de moradia para que o problema seja sanado.

Reinaldo Gomes Preto Sacolão (MDB), que solicitou a audiência, disse que, apesar da importância de que casos específicos sejam sanados, é necessário que o sistema seja corrigido para que problemas como esse não voltem a ocorrer. Ele lembrou que o ECA garante o acesso à escola pública e gratuita, próxima da residência do estudante. O parlamentar também repudiou a ausência das secretárias estadual e municipal de Educação na reunião.

Flávia Borja (Avante) afirmou que, apesar de a PBH dizer que há vagas nas escolas para todos os que as requisitam, relatos demonstram que isso não é verdade. Ela apontou que muitas escolas particulares de educação infantil fecharam suas portas durante a pandemia do novo coronavírus e, assim, um grande número de estudantes egressos da rede particular passou a ter que ser absorvido pela rede pública. De acordo com ela, apesar de as parcerias entre Prefeitura e creches conveniadas estarem sendo ampliadas, não é possível ter certeza de que a PBH esteja tendo o comprometimento necessário para receber todas as crianças que saem da rede privada e buscam a pública.

A Comissão de Educação se comprometeu a solicitar dos conselhos tutelares o número de crianças e adolescentes sem vagas nas escolas e a requerer dos governos do estado e do município de Belo Horizonte esclarecimentos quanto ao modo como é realizado o georreferenciamento das unidades de ensino no sistema de cadastramento escolar pela internet. Além disso, será solicitado que as unidades de ensino das redes pública estadual e municipal encaminhem as listas de espera por vagas.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para discutir sobre a destinação das vagas para crianças e adolescentes concedidas em desacordo com o Estatuto da Criança e Adolescente - 11ª Reunião Ordinária - Comissão de Educação