Atingidos pelas chuvas

Indefinição sobre retorno às suas casas angustia famílias no Jardim Alvorada

Comissão de Direitos Humanos recebeu denúncias de possível negligência do Poder Público que teria culminado em deslizamento e mortes

terça-feira, 18 Fevereiro, 2020 - 19:45
sofá sujo de lama; muro e parede caídos ao fundo

Foto: Karoline Barreto/ CMBH

“Não saber para onde ir depois do trabalho é muito angustiante. O que mais está matando a gente é a indefinição”. Assim resumiu Samuel Batista, morador do Bairro Jardim Alvorada (Pampulha), abrigado em pousada desde o dia 25 de janeiro, quando a forte chuva que atingiu a cidade deixou a sua casa e outras 65 famílias locais em situação de risco iminente. O problema foi verificado pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor na tarde desta terça-feira (18/2), em visita técnica ao local, nas proximidades das Ruas Flor da Verdade e Antônio Fernandes de Melo.

Morador antigo da região, Antônio dos Reis apresentou a geografia do bairro, que é construído em área de encosta, bastante íngreme, tendo, inclusive, acessos viabilizados por escadarias. Antônio lembrou que a praça de convivência (ponto de encontro para a visita), instalada no alto da Rua Antônio Fernandes de Melo, é uma área que foi planificada entre 2006 e 2009, com recursos do Orçamento Participativo, o que permitiu também a delimitação de um pequeno parque ecológico, pavimentação de um beco e a construção de uma passarela sobre o córrego, dando acesso de pedestres desde a praça até a parte baixa da Rua Antônio Fernandes de Melo.

No entanto, o morador alertou que, ainda em 2008, cobrara da Prefeitura que fizesse um muro de contenção para sustentar o beco pavimentado e a passarela, o que não foi feito. Para ele, isso poderia ter impedido que o barranco cedesse, desmoronando sobre as casas. Antônio lamentou a morte de cinco vizinhos, entre eles a Sra. Maria Stela e seus três filhos (de 4, 6 e 10 anos), que moravam abaixo da passarela, e foram soterrados no deslizamento do dia 25 de janeiro.

Possível negligência

Também a moradora Cleide Nunes, que tem sua casa construída às margens da passarela, ao lado do trecho que desmoronou, denunciou uma possível negligência do Poder Público, lembrando que a passarela já havia dado sinais de fragilidade em 2018, pouco mais de um ano antes da tragédia. Ela contou que a terra que sustentava a passarela havia cedido, formando um grande buraco, e que a intervenção da Prefeitura teria sido feita sem a devida atenção. “Colocaram uma terra no lugar, que agora cedeu de novo. Falaram (a Prefeitura, à época) que iriam reassentar a Maria Stela, mas esperaram ela morrer”, lamentou a vizinha e amiga.

Morador da parte baixa da Rua Antônio Fernandes de Melo, tendo os fundos de sua casa colados na base da encosta, Samuel Batista está em área de alto risco, bem próxima ao ponto da queda. O morador contou que os dutos de água e esgoto da Copasa, que passam próximos à passarela, já vinham apresentando vazamento há meses. Ele lembrou que, ainda em novembro de 2019, a comunidade havia solicitado atendimento da Prefeitura para solucionar o problema, mas não teria sido atendida.

As denúncias preocuparam a vereadora Bella Gonçalves (Psol), que anunciou que o tema será tratado junto aos órgãos públicos, solicitando as informações detalhadas na Sudecap, na Copasa e na Urbel para apurar o que aconteceu e se houve negligência. Pedro Patrus (PT) apoiou a iniciativa, lembrando que a Comissão de Direitos Humanos planeja realizar uma série de visitas a outros lugares da cidade afetados pelas chuvas, onde o atendimento da Prefeitura demora a chegar. Cida Falabella (Psol) lembrou que a retirada das famílias de suas casas afeta as suas vidas de forma muito complexa, envolvendo, por exemplo, a dificuldade de garantir o acesso das crianças às escolas.

Também moradora local, Cássia Mendes contou que está abrigada em uma pousada no Bairro Floresta (direcionada pela Prefeitura), mas não tem ajuda de custo para deslocamento. “Lá no abrigo não pode lavar roupa, preciso vir em casa para lavar. Tenho um filho de dois anos, que está matriculado na creche aqui no Jardim Alvorada. Fica muito difícil ficar indo e voltando”, afirmou.

Perspectivas

Representante da Urbel, Karla Marques se solidarizou com a dor das famílias, mas contou que o órgão está sobrecarregado, com mais de 2,7 mil pedidos de vistoria em toda a cidade. Apenas na região dos Bairros Jardim Alvorada, Jardim Montanhês e Antena foram mais de 100 pedidos, tendo sido vistoriadas 93 casas. Desse total, 66 famílias foram removidas de suas casas e ainda aguardam definição sobre seus destinos.

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A servidora explicou que é preciso uma segunda vistoria (de retorno) para avaliar as intervenções necessárias e o prazo para recuperação da área, antes que as famílias possam voltar. É também nesse momento que será definida a concessão ou não da bolsa-aluguel e a possibilidade de indenização e reassentamento. A Urbel também esclareceu que as áreas de atendimento do órgão são as ZEIS e AEIS, mas muitas casas no Jardim Alvorada estão edificadas no que chamou de cidade formal, onde não haveria mediação da Urbel para concessão da bolsa-aluguel e reassentamento das famílias.

Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Bella Gonçalves afirmou que o Colegiado vai pautar também esse debate junto aos demais órgãos, a fim de garantir que as famílias de baixa renda sejam atendidas pela política habitacional, uma vez que estão em áreas de risco, ainda que formalmente.

Representante da Diretoria de Manutenção da Sudecap, Luana Diamantino explicou que o órgão é responsável pelas obras de drenagem e deve, depois que o período de chuvas passar, trabalhar para reconstruir parte da rede local que foi soterrada pelo desabamento.

Assinam conjuntamente o requerimento para a visita técnica as vereadoras Bella Gonçalves (Psol) e Cida Falabella (Psol) e os vereadores Pedro Patrus (PT), Arnaldo Godoy (PT), Gilson Reis (PCdoB) e Edmar Branco (Avante).

Superintendência de Comunicação Institucional

Visita técnica para averiguar as áreas de afetação do Bairro Jardim Alvorada diante da situação de emergência e calamidade pública do município- Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor