Vereadores defendem políticas municipais de emprego e renda no pós-pandemia
Fomento à economia popular solidária, criação de frentes de trabalho e instituição de renda básica foram defendidos em audiência
Foto: William Delfino/PBH
A criação de políticas de geração de emprego e renda como medida para retomada da economia no contexto de pós-pandemia foi discutida, nesta segunda-feira (27/7), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, requerida pela vereadora Bella Gonçalves (Psol) e pelos vereadores Gilson Reis (PCdoB) e Pedro Patrus (PT). Na ocasião, os parlamentares, após ouvirem representantes da sociedade civil, do Executivo Municipal e da academia, informaram que defendem junto à PBH iniciativas como a implementação de um complemento municipal ao auxílio emergencial em vigor, que hoje varia entre R$600,00 e R$1.200,00; a criação de um espaço participativo para se debater políticas voltadas à economia popular solidária; bem como a instauração de frentes de trabalho em Belo Horizonte. Os parlamentares também lembraram que já tramitam na Casa vários projetos de autoria de vereadores de esquerda com o objetivo de enfrentar o desemprego e a falta de renda em decorrência do novo coronavírus.
Ações articuladas
O representante do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos-Minas Gerais (Dieese-MG), Fernando Duarte, defendeu que as políticas de isolamento adotadas pela Prefeitura de Belo Horizonte foram acertadas, tendo reduzido a contaminação pelo novo coronavírus, mas salientou que há a necessidade de políticas mais bem orquestradas entre os âmbitos federal, estadual e municipal para a elaboração e implementação eficazes de políticas de geração de trabalho e renda na capital mineira.Entre as políticas citadas pelo representante do Dieese, encontra-se a de sustentação emergencial da renda, que no Brasil está sendo executada por meio do auxílio emergencial de R$600 a R$1.200.
Outra possibilidade exposta pelo especialista é o aprofundamento das políticas de urbanização de vilas e favelas, que seriam capazes de gerar diversos postos de trabalho. Há, ainda, segundo Fernando Duarte, a possibilidade de se adotar medidas para a área da cultura, a fim de se gerar trabalho e renda, uma vez que, de acordo com ele, BH é um centro cultural importante no país.
Setor de serviços mais afetado
O representante do Dieese-MG também diz acreditar que Belo Horizonte deveria ter políticas de longo prazo para o enfrentamento do desemprego, que, em sua avaliação, tende a manter-se alto no pós-crise, caso as medidas necessárias não sejam adotadas. Ele explica que a indústria deve ter uma retomada muito rápida após a pandemia, pois a capacidade instalada está mantida e o câmbio está muito desvalorizado, o que facilita tanto as exportações quanto a substituição de importações. Já o setor de serviços, segundo o especialista, pode apresentar muito mais dificuldades para uma retomada, o que ampliaria o período de manutenção do desemprego alto.
De acordo com dados do IBGE, no segundo trimestre de 2015, por exemplo, mais de dois terços (67,7%) da população ocupada trabalhava no setor terciário da economia (serviços), o que evidencia o impacto desse setor sobre a taxa de desemprego.
O representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Paulo Henrique, elogiou a política de isolamento social contra o novo coronavírus adotada pela PBH, afirmando que o movimento sindical prioriza a defesa da vida. Ao mesmo tempo, ele criticou a flexibilização do comércio em Belo Horizonte, ocorrida, segundo ele, antes do momento correto, tendo em vista a alta no número de casos da doença e de ocupação de leitos hospitalares após a reabertura de estabelecimentos comerciais na cidade. Em relação à atuação federal na crise de saúde pública decorrente do novo coronavírus, Paulo Henrique criticou o presidente da República Jair Bolsonaro, que, conforme ele lembrou, foi denunciado no Tribunal Penal Internacional sob a acusação de genocídio e crime contra a humanidade por sua gestão da pandemia de Covid-19, que, no Brasil, já foi responsável por mais de 87 mil óbitos.
Em relação à economia, o sindicalista defendeu que a demanda por produtos não é gerada apenas pela redução nos preços, mas que ela se amplia quando as pessoas têm trabalho, emprego e renda. Daí a necessidade, segundo ele, da adoção de políticas que garantam tais condições para que o mercado consumidor se aqueça. Também no que tange à economia, o sindicalista criticou as políticas neoliberais, que, segundo ele, vêm sendo adotadas desde o segundo mandato da ex-presidenta Dilma Rousseff. De acordo com ele, tais políticas deixam a população desamparada pelo Estado.
O sindicalista apresentou, ainda, a situação da educação, a qual, de acordo com ele, precisará ampliar a contratação de profissionais na volta às aulas, uma vez que, segundo Paulo Henrique, parte das atividades deverá ser à distância e parte presencial. Além disso, ele espera que as turmas de estudantes sejam reduzidas de modo a garantir a saúde da comunidade escolar, ensejando, assim, um aumento no número de profissionais envolvidos.
Economia solidária
O membro do Conselho Estadual de Economia Popular Solidária e da Cáritas - Regional Minas Gerais, Samuel da Silva, defendeu o setor como alternativa para a retomada da renda. De acordo com ele, a economia popular solidária tem como características o trabalho cooperado autogestionário e a manutenção do respeito aos seres humanos e às outras formas de vida do planeta. Ele explicou que já há legislação em nível municipal e estadual que dispõe sobre a economia solidária, assim, seria necessário colocar em prática políticas públicas para o setor. Ele defende crédito para a compra de máquinas, equipamentos e insumos. A esse respeito, Samuel lembrou que as grandes empresas têm acesso fácil a crédito, mas a economia solidária convive com gargalos no financiamento. Além disso, o conselheiro cobrou assessoramento técnico, condições de comercialização, formação e qualificação de profissionais, bem como a ampliação das compras dos produtos dos grupos de economia solidária pelo Estado.
Samuel da Silva defendeu que a economia solidária representa uma forma importante de inclusão econômica, gerando riqueza para o município, enquanto que as empresas multinacionais levam os recursos financeiros aqui adquiridos para suas sedes no exterior.
Desenvolvimento e questão fiscal
O professor Frederico Gonzaga Jayme Jr., do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG (Cedeplar), criticou a política de teto de gastos públicos aprovada durante o governo Temer. De acordo com ele, tal política seria insustentável a partir de 2021, mas, em decorrência da pandemia, deixou de ser sustentável já neste ano. Além disso, o professor aponta que havia alternativas mais adequadas para se resolver a questão fiscal brasileira para além da política de teto de gastos.
Ele também defendeu que as médias e pequenas empresas precisam ser financiadas pelo setor público, seja por meio de bancos de fomento, seja por meio da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil, uma vez que, segundo ele, os bancos privados não cumpririam tal função.
Frederico Gonzaga Jayme Jr. explicou que seria possível aumentar a carga tributária do 0,5% mais rico da população ou, ainda, emitir moeda sem gerar inflação, dada a atual capacidade ociosa e o grande volume de reservas internacionais acumuladas durante os governos de Lula e Dilma. Ele lembrou também que não se pode comparar o endividamento público do governo federal com o endividamento de uma unidade familiar. Ele explica que o endividamento público, conforme apontava o economista John Keynes, pode vir associado ao aumento do PIB, fazendo com que o aumento da dívida não se torne necessariamente um problema.
Políticas municipais
O Executivo Municipal apresentou uma série de ações que vêm sendo tomadas no contexto da pandemia: distribuição de alimentos para famílias em situação de vulnerabilidade; produção de refeições nos restaurantes populares, as quais são gratuitas para pessoas em situação de rua; criação de vagas para acolhimento emergencial de idosos, mulheres e gestantes; distribuição de kits de higiene; disponibilização do atendimento do Sine para preenchimento de vagas de emprego por meio virtual; qualificação e capacitação profissional com parceiros como Sebrae e Fecomércio; entre outras.
Gilson Reis defendeu a adoção de programas de renda básica e lembrou que parte relevante do que é transferido para o cidadão volta ao Estado por meio de impostos. O parlamentar também defendeu a discussão acerca da adoção de frentes de trabalho para o enfrentamento do desemprego.
Ainda de acordo com Reis, a Câmara Municipal precisará interferir mais fortemente na lei orçamentária, de modo a garantir recursos para políticas de geração de renda, trabalho e emprego, de modo a aquecer a economia. Conforme o vereador, as políticas de geração de emprego e renda da PBH não atendem à demanda, e a área conta com poucos recursos orçamentários.
O parlamentar também afirmou que boa parte das políticas apresentadas na audiência pelo Executivo têm como objetivo garantir alimentos e não assegurar trabalho, emprego e renda aos belo-horizontinos.
Reis lembrou, ainda, que Europa e EUA aprovaram grande quantidade de dinheiro destinada a pacotes de recuperação de suas economias, enquanto que, de acordo com ele, no Brasil, nem mesmo o orçamento previsto para o Ministério da Saúde vem sendo executado integralmente durante a pandemia.
Bella Gonçalves defendeu a adoção de uma política de renda básica, mas reconheceu que esta e outras políticas necessárias à superação dos efeitos da crise gerada pelo novo coronavírus dependem também do governo federal. Ainda de acordo com a parlamentar, a distribuição de cestas básicas adotada pela Prefeitura não atende a todas as necessidades da população vulnerável da cidade, sendo necessário elaborar uma política de renda básica municipal para movimentar a economia local. Ela também disse ser favorável à ampliação das políticas sociais por parte da Prefeitura para o atendimento de setores vulneráveis, como, por exemplo, os catadores de material reciclável. A vereadora também defendeu a criação de um espaço participativo para se discutir políticas voltadas à economia popular solidária.
Pedro Patrus também defendeu a adoção de uma renda básica e lembrou que já foi apresentado na Câmara um projeto que dispõe sobre um complemento municipal ao auxílio emergencial O parlamentar afirmou, ainda, que a PBH já comprou produtos de grupos de economia solidária, como máscaras de proteção individual, mas disse que é necessário ampliar a aquisição de produtos de tais grupos.
Outras políticas apresentadas pelo vereador para enfrentamento da crise social e econômica decorrente da pandemia dizem respeito ao fomento da agricultura familiar com a compra de alimentos de produtores familiares para compor as cestas básicas distribuídas pela PBH, bem como a ampliação de investimentos em saneamento básico, o que geraria muitos postos de trabalho. Pedro Patrus ainda dedicou a audiência, que foi por ele conduzida, ao economista desenvolvimentista Celso Furtado. No último domingo (26/7) houve a comemoração dos 100 anos de seu nascimento.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional