MULHERES DE SUCESSO

Médicas, advogadas e empresárias enfrentam discriminação na carreira e sobrecarga em casa

Desigualdade foi tema na audiência; em pauta, participação em cargos de poder, salários diferenciados e divisão de tarefas domésticas

sexta-feira, 13 Agosto, 2021 - 20:30
Vereadoras Flávia Borja, Professora Marli, Fernanda Pereira Altoé, Marcela Trópia, Iza Lourença e Macaé Evarista, em audiência pública da Comissão de Mulheres, nesta sexta-feira (13/8)

Foto: Cláudio Rabelo/ CMBH

Mesmo ocupando posições de destaque nas mais diversas áreas de atuação, médicas, advogadas, empresárias da indústria alimentícia e especialistas em gestão de pessoas e em tecnologia da informação apontam dificuldades enfrentadas em seu dia a dia, no campo profissional e na vida pessoal. “Mulheres de sucesso: Reivindicando o espaço das mulheres no mundo do trabalho” foi o tema debatido pela Comissão de Mulheres, em audiência pública realizada nesta sexta-feira (13/8), quando estiveram em pauta desafios na carreira, como ampliação da participação em cargos de poder, equiparação de salários em relação aos homens, enfrentamento ao machismo, divisão de tarefas domésticas e valorização de habilidades femininas para o trabalho.

A vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Seccional de Minas Gerais e coordenadora da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica, Helena Edwirges Santos Delamonica, relatou que 50% de mulheres já possuem participação em todos os cargos da OAB. Segundo ela, em 90 anos de instituição, nunca uma mulher ocupou o cargo de presidente. Durante todo esse período, somente três se tornaram secretárias adjuntas, e uma, vice-presidente. Além disso, menos requisitos são exigidos dos homens em relação às mulheres para cargos de poder e decisão. Cenário que deve se reverter, agora, com a conquista da paridade, explicou.

Setor alimentício

Gestora de uma empresa familiar, no ramo da indústria de frutas congeladas, Aila Portugal destacou a necessidade da mulher contribuir no orçamento doméstico, contando que vendia polpa de frutas em lojas e que depois passou a comercializar produtos congelados em supermercados. Para a empresária, os serviços domésticos têm que ser divididos igualmente e a mulher precisa se qualificar para o mercado do trabalho. Aila Portugal contou sua experiência em uma concessionária de motocicletas em BH, lembrando que concorreu a uma vaga juntamente com ampla maioria masculina e somente três mulheres, alcançando, ainda assim, o primeiro lugar, batendo metas e recordes, à frente dos homens.

Gestão de pessoas

A relações públicas e especialista em Gestão de Talentos e em Capacitação de Pessoas, Morgana Linhares, afirmou na reunião que é preciso que as empresas coloquem em prática conceitos como diversidade, inclusão e equidade. Pontuou que as mulheres estão inseridas num mundo machista e que muitas vezes elas próprias reproduzem esse comportamento, em organizações constituídas e lideradas por homens. Morgana informou que, no Brasil, as mulheres ocupam 41% da força de trabalho, mas que somente 24% estão na gerência, sendo 19% CEO ou integrando conselhos administrativos.

No que se refere ao contexto atual, salientou que as mulheres têm sofrido mais que os homens na pandemia, o que demanda maior flexibilidade das empresas quanto à jornada de trabalho. Para ela, o papel feminino nas organizações é fundamental no trato com as pessoas, por exemplo, e é fundamental estabelecer parcerias e a conexão entre mulheres de diferentes áreas de atuação.

Psicologia

Já a psicóloga com MBA em Gestão de Pessoas, Patrícia Leiva, que atuou no mercado de mineração e engenharia, reafirmou o cenário machista das empresas na capital. Disse que na direção da Associação Comercial de Minas (ACMinas), onde trabalhou no Conselho de Mulheres do Empreendedorismo, observou um fortalecimento da comunidade feminina no Estado, mas que ainda não considera o quadro ideal. Ela reforçou a diferença de salários entre homens e mulheres, denunciando a prática e lembrando que as mulheres precisam, a todo tempo, provar sua competência no trabalho. Também reiterou o perfil feminino intuitivo e multi-tarefas, que agrega valores à organização.

Contudo, lembrou que, muitas vezes, são escolhidas para ocupar cargos estratégicos pessoas com perfis semelhantes aos dos homens. Patrícia informou, ainda, que mais de 60% das mulheres desejam assumir papeis de liderança nas organizações, entretanto, não encontram apoio das empresas; mas que muitas sentem-se representadas por mulheres que ocupam cargos de destaque.

Outro dado apresentado foi que a pandemia exigiu mais das mulheres que dos homens e que muitas delas tiveram que deixar o mundo corporativo, abrindo mão até mesmo da ascensão profissional, em função da vida pessoal. A psicóloga salientou, por fim, a importância de redes de apoio e a impossibilidade da mulher assumir várias jornadas de trabalho, incluindo a doméstica, sob pena de adoecimento emocional.

Tecnologia da Informação

A publicitária, fundadora e CEO da She’s The Boss (primeira plataforma digital de empreendedorismo e liderança feminina no Brasil), Renata Carvalho, discorreu sobre os desafios da sociedade patriarcal, como a insegurança e a competitividade entre as mulheres, salientando a importância de um apoio mútuo e de parcerias para o crescimento da economia. Apontou arquétipos de lideranças: a masculina, exercida com mais garra e dominação; e a feminina, com mais cuidado, colaboração e compartilhamento. Ela contou que iniciou o empreendedorismo aos 14 anos, sendo, aos 19, dona do próprio negócio, fazendo cursos básicos de informática para conseguir emprego.

Criou sites de busca, na área de tecnologia, para as antigas páginas amarelas dos catálogos, mas, como as pessoas ainda usavam a internet discada, não obteve sucesso. Depois, desenvolveu sites, projetos e sistemas de informação online, com a venda de soluções para empresas, mas encontrou vários obstáculos, já que a tomada de decisão cabia aos homens. Utilizou-se de autoritarismo e vestiu-se de terno para lidar com eles; e procurou grandes empresas para ganhar mais dinheiro, afirmando que conseguiu enfrentar os assédios.

Em um evento na área de TI, da América Latina, em SP, constatou que 90% do público era composto por homens, que não havia participação de mulheres. Então, resolveu buscar informações, apurando que somente 19% das mulheres ocupavam cargos de CEO e em conselhos administrativos; e que 76% estavam em licença maternidade.

Então, criou a plataforma shestheboss.com.br, com o objetivo de unir mulheres em torno da causa de mudar esse modelo de liderança e incentivá-las ao empreendedorismo, lembrando que muitas delas desistem durante processos de seleção. Renata informou que o número de mulheres no empreendedorismo cresceu em 30% na pandemia; em contrapartida, recebeu-se menos investimento (crédito): empresas start ups receberam, no período, somente 12% para projetos de tecnologia.

Medicina

A pediatra, cardiologista, intensivista e professora Carolina Capuruço contou que veio de família de extrema pobreza, foi arrimo de família, assumindo 70% das despesas da casa e tornando-se pediatra aos 18 anos. Posteriormente, enfrentou um câncer com metástases, tendo que submeter-se a cirurgias e a quimioterapia.

A médica, que atende em consultório particular e pelo Sistema Único de Saúde (SUS), afirmou que a maioria das mulheres abdicam de sua vida profissional e que as mais pobres não podem parar de trabalhar. Assim, se expõem ao risco no transporte coletivo, necessitando do auxílio de outras pessoas para cuidar de seus filhos durante a jornada de trabalho e sofrendo abusos verbais dos maridos ao sair de casa. Para ela, a mulher tem que fazer escolhas, como esposa, dona de casa, mãe ou profissional e muitas vezes se culpa por isso.

Carolina relatou o abandono do marido durante a pandemia, em função de sua grande dedicação ao trabalho, considerando-se mãe e profissional exemplar. Ajudou grupos de mães no SUS, com a inserção dos maridos na educação dos filhos. Apontou a defasagem do ensino público e do salário dos profissionais, bem como dificuldades enfrentadas com as múltiplas funções das mulheres no atual contexto. A médica relatou que, no Brasil, é a única mulher que representa o Estado de Minas Gerais no Comitê da Covid-19 em Belo Horizonte, onde já sofreu, inclusive, assédio moral.

Pontos destacados

Na audiência, as vereadoras Flávia Borja (Avante), Fernanda Pereira Altoé (Novo), Marcela Trópia (Novo) e Professora Marli (PP) reforçaram a dificuldade de se conciliar carreira e maternidade, destacando, também, as posições distintas ocupadas pelo homem (mais agressivo por resultados e mais corajoso) e pela mulher (mais delicada e dedicada ao ambiente familiar). Para elas, é necessário um movimento conjunto das mulheres para a conquista de oportunidades de destaque.

Também participaram da reunião das vereadoras Iza Lourença (Psol) e Macaé Evaristo (PT).

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública - Finalidade: Discutir o tema: "Mulheres de sucesso: reivindicando o espaço das mulheres no mundo do trabalho" - 23ª Reunião Ordinária - Comissão de Mulheres