CPI DA COVID-19

Gerente da PBH nega contato com dono do Shopping Oi em doação de respiradores

Declaração contradiz Mário Valadares mais uma vez. Adalclever também depõe e admite distância da pasta em ações de combate à covid

quinta-feira, 14 Outubro, 2021 - 16:45

Foto: Cláudio Rabelo/CMBH

“Não tive nenhum contato com o senhor Mário Valadares. Tratei apenas de questões técnicas com o João Vitor, que é do grupo”. A declaração é do gerente de Contratação de Serviços Gerais e de Engenharia da Prefeitura, Leonardo Vilete Matos e foi dada na manhã desta quinta-feira (14/10) durante reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 que investiga as ações e gastos do Município no combate a pandemia. Leonardo Vilete Matos foi citado pelo dono do Shopping Oi como sendo uma das pessoas com quem negociou a doação dos respiradores pulmonares para a Prefeitura. Este, entretanto, já é o terceiro nome que Mário Valadares faz referência em seus depoimentos, mas na sequência a informação é negada pelos mencionados. Ainda durante a reunião, foi ouvido também o secretário municipal de Governo, Adalclever Lopes, que frustrou os parlamentares ao mostrar total desconhecimento na relação da sua pasta com as ações de combate à pandemia na cidade.

Descritivo feito por engenheira

Convocado pela CPI, Leonardo Vilete Matos afirmou que sobre a doação de respiradores e acessórios feita pelo dono do Shopping Oi à PBH tratou apenas com João Vitor, que é funcionário do empresário. Segundo Vilete Matos, após chegar para ele um pedido para que fosse feita uma relação sobre qual tipo de equipamento a Prefeitura estava necessitando, ele, junto da sua equipe, elaborou um descritivo sobre que tipo de equipamento melhor atenderia o Município naquele momento. “Tenho uma equipe técnica que trabalha na descrição de equipamentos para a rede. Não tem médico na equipe. Fizemos o levantamento a partir da necessidade da rede”, afirmou.

Ainda segundo Vilete Matos, no caso dos respiradores a especificação foi feita pela coordenadora de Engenharia de Clínica Médica, Débora Morgado, que é engenheira eletricista. O descritivo teria apresentado várias marcas e uma foi escolhida pelos doadores para ser adquirida. Perguntado pelos membros da CPI se acreditava ter havido algum benefício ao empresário em troca das doações realizadas, Vilete Matos afirmou não poder dizer, pois não tem conhecimento.

Favorecimento e contradição em depoimento

A suspeita da CPI, entretanto, é de que Mário Valadares tenha sido favorecido após a doação de oito respiradores pulmonares, avaliados em cerca de R$ 100 mil/cada, tendo a possibilidade de abertura do seu complexo de lojas quando decreto da Prefeitura ainda mantinha todo o comércio da cidade fechado em função da pandemia. Questionado novamente se tinha conhecimento de algum favorecimento, Vilete Matos afirmou que não tinha informação e que seu envolvimento limitou-se aos aspectos técnicos da doação.

Perguntado ainda se outras doações similares haviam sido feitas, Vilete Matos informou que acreditava que uma doação semelhante foi feita pelo Banco Itaú, e que o mesmo descritivo foi enviado à instituição. Segundo o gerente, os três primeiros respiradores doados pelo dono do Shopping Oi foram encaminhados para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Norte e os demais para a UPA Nordeste e a UPA Venda Nova, sendo depois remanejados conforme a necessidade da rede. Questionado se tinha conhecimento sobre alguma intervenção do prefeito Alexandre Kalil (PSD) ou do secretário de Saúde, Jackson Machado, nas negociações, Vilete Matos afirmou não saber.

Embora o depoimento do gerente confirme as tratativas para a doação, membros da CPI avaliam que o fato de Mário Valadares ter afirmado que tratou com Vilete Matos sobre as doações mostra mais uma vez contradição em depoimento do empresário. Para Irlan Melo (PSD), esta tem sido uma situação que precisa ser considerada. “Ele (Mário Valadares) disse que o primeiro contato foi com o subsecretário. Depois disse que foi com o André Reis e depois com o senhor. Então ele está mentindo. Quero deixar registrado. Já foi chamado aqui duas vezes e vai colocando os funcionários públicos nesta posição”, declarou o parlamentar que é o relator da CPI.

Flávia Borja (Avante) e Nikolas Ferreira (PRTB) concordaram com Irlan. Para a parlamentar, que considera o ocorrido com o Shopping Oi um tratamento diferenciado, está cada vez mais difícil conseguir as informações. “Precisamos saber se a Prefeitura pediu ou se apenas recebeu estas doações. Foram mais de 270 doações e o único que teve doação com especificação foi o Shopping Oi, que por coincidência foi o único estabelecimento que pôde abrir durante a pandemia”, afirmou Flávia.  

Número de mortes orientou decisões

E a falta de informações foi também a queixa geral dos parlamentares em relação ao depoimento do secretário municipal de Governo, Adalclever Lopes. O ex-deputado federal que tomou posse no cargo em 1º de janeiro deste ano foi convocado pela CPI e alegou que grande parte das decisões tomadas em relação à pandemia ocorreu no ano de 2020, período em que ainda não estava na PBH.

Acompanhado do advogado, Bruno Cesar Gonçalves da Silva, e amparado por habeas corpus expedido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que lhe garantia o direito de não produzir provas contra si, Adalclever disse não ter participado de nenhuma reunião que tratou das ações para o combate da pandemia na cidade e afirmou que tudo foi decidido pelo prefeito, juntamente com o Comitê de Enfretamento da Covid-19. Questionado, porém, se entre as atribuições do seu cargo não estaria o ‘assessoramento ao prefeito em assuntos estratégicos’, o secretário disse que diante de tantas mortes e tragédias o prefeito optou por tomar suas decisões a partir de um comitê composto por médicos e cientistas e que não participou de nenhuma destas reuniões. “O prefeito fazia a reunião e depois dava todas as informações por meio de entrevista coletiva. Ficava à disposição da imprensa para perguntas e tudo estava à disposição da população”, afirmou.

A existência do comitê também foi a justificativa dada por Adalclever quando perguntado sobre a decisão pelo compra adiantada dos vales-transporte feita pelo Município junto às empresas de ônibus. Questionado por Flávia Borja se o prefeito fez alguma consulta à sua pasta sobre a possibilidade de suspender os repasses, uma vez que os valores deveriam garantir a circulação dos ônibus e isso não vinha acontecendo, o secretário afirmou que não houve nenhuma consulta por parte do chefe do Executivo. 

Conselhos e Colegiados

Outro assunto do qual Adalclever Lopes parece ter mantido alguma distância foi o acompanhamento dos conselhos e colegiados. A gerência, entretanto, segundo informações de membros da CPI, integra a Secretaria de Governo. Para o presidente da CPI, Juliano Lopes (Agir), o fato do secretário não realizar sequer uma reunião com estas instâncias de participação popular atesta a falta de função do cargo do secretário. Perguntado por que nenhuma reunião foi feita, com nenhum conselho ou colegiado, nos dez meses em que está à frente da pasta, Adalclever disse que todas as secretarias tiveram suas ações assumidas pelo Comitê da Covid-19. Quando Juliano insistiu, entretanto, que não houve reunião sobre nenhum outro assunto, Bruno Miranda (PDT) lembrou aos participantes que exatamente devido à pandemia diversos conselhos municipais tiveram suas atividades suspensas. “Estamos voltando agora com estas reuniões porque estávamos impedidos de nos reunir presencialmente”, afirmou.

Recado ao prefeito e venda de protocolo

Ao prosseguir com o questionamento, por parte dos parlamentares, sobre quais seriam então as prerrogativas da sua pasta e o que tem feito à frente da Secretaria de Governo, Adalclever Lopes respondeu que recebeu em reunião diversos grupos ligados a igrejas, escolas particulares e ao comércio em geral, querendo saber o que poderiam fazer para viabilizar a reabertura dos locais. “Então o senhor era tipo um garoto de recados”?, rebateu Flávia Borja, perguntando ainda se o secretário tinha conhecimento de que dois membros do comitê fazem parte de uma associação que vendeu protocolos para escolas particulares. “Existe um claro conflito de interesses. Criaram a dificuldade para vender a facilidade. O senhor tem ciência disso?”, indagou a parlamentar, ao que Adalclever respondeu que não, e que se isso ocorreu deve ser tratado pelo Comitê de Ética da Prefeitura.

Antes de encerrar a reunião, Juliano Lopes abriu a fala a outros vereadores que não integram a CPI e Léo (PSL) disse entender que o secretário de Governo fez seu trabalho, que é de esclarecer os parlamentares, e que a Casa fez a sua função, que é questionar e fiscalizar. Na sequência, entretanto, Gabriel (sem partido) pediu a fala e discordou do líder de governo. Gabriel afirmou que Adalclever Lopes não sabe o que se passa na sua pasta e que aguarda o dia em que ele abrirá mão do cargo pelo bem da cidade. “Espantoso como esta figura conta com a confiança do prefeito Kalil. Não sabe de nada, não tem ata de nada. Não me espanta que ele não tenha respondido nada. É sinônimo de incompetência e inabilidade política”, afirmou.

Assista ao vídeo com a íntegra da reunião.

Superintendência de Comunicação Institucional

26ª Reunião - Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI : COVID-19 - Oitiva - Finalidade: Intimar o Gerente de contratação de serviços gerais e de engenharia, Leonardo Vilete Matos, e o Secretário Municipal de Governo, Adalclever Ribeiro Lopes.