ENSINO

Novas abordagens para evitar a evasão e o abandono escolar foram debatidas

Especialistas sugerem projetos inovadores para tornar as escolas mais atrativas e garantir a permanência dos alunos

quinta-feira, 4 Novembro, 2021 - 19:45
Tela de celular com duas setas opostas. A seta vermelha indica evasão e a verde, escola

Foto: Karoline Barreto/CMBH

O abandono e a evasão escolar são problemas graves e recorrentes que foram acentuados pela pandemia da covid-19. A questão foi debatida em audiência pública pela Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo nesta quinta-feira (4/11). Marcela Trópia (Novo), autora do requerimento para realização do evento, afirmou que a educação não tem recebido a devida atenção em BH e lamentou a ausência da secretária municipal de Educação, Angela Dalben, no debate. Em sua justificativa para a realização da audiência, a parlamentar afirmou que a última avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) apresentou uma queda nos resultados dos alunos da Rede Municipal de Ensino de BH, interrompendo uma série histórica de crescimento. “A proposta desta audiência é apresentar as metodologias Nudge e Projeto de Vida que se forem aplicadas em BH podem ajudar a combater a evasão e o abandono escolar”, salientou Marcela.

Ao afirmar que a “PBH precisa trabalhar para que os jovens não desistam da educação, ainda que a pandemia esteja presente em nossa vida”, a vereadora contou que apresentou um PL que cria a política de combate ao abandono e à evasão escolar. O PL 142/2021 pretende estabelecer diretrizes para que a Prefeitura consiga atrair os jovens para a escola e evitar que eles desistam dos estudos.

Projetos inovadores

Marcela apresentou o conceito de Nudge - termo em inglês que poderia ser traduzido como incentivo e que possibilitaria capacitar os jovens para escolhas assertivas por meios de estímulos comportamentais capazes de evitar o abandono e a evasão escolar - e a metodologia intitulada como Projeto de Vida - cuja proposta é possibilitar ao aluno uma reflexão sobre o presente, as expectativas para o próprio futuro, o repertório de possibilidades existente, as formas de concretizar os desejos e o fortalecimento do senso de compromisso com a comunidade. Ela também apresentou casos exitosos da aplicação dessas metodologias no Caribe e em São Paulo.

Representando o Instituto Ayrton Senna, Roberto Campos defendeu a necessidade de se instituir políticas públicas sólidas para enfrentar o problema da evasão e do abandono escolar e afirmou que, ao longo do tempo, as instituições educacionais foram perdendo a conexão com os jovens. Roberto Campos reconheceu a perda de renda das famílias diante da pandemia e a necessidade de trabalhar para ajudar com o sustento da casa como razões para o abandono escolar, mas enfatizou que a raiz do problema é que os jovens “deixaram de ver significado na escola porque eles deixaram de ter motivação para ir para a escola”.

Motivação e suporte

Para ele, será necessário trabalhar de uma forma muito mais direta o emocional dessas crianças, a sua motivação para retornar às escolas. “O PL que vocês trazem é de suma importância, não só para que consigamos fazer com que o estudante pense no seu futuro para além da escola, mas para dar significado ao processo educacional, para que o estudante seja protagonista e escolha as atividades que fazem mais sentido para ele a partir da sua trilha de desenvolvimento” afirmou ao lembrar que as redes públicas de educação terão imensos desafios na  implementação do novo ensino médio.

O representante do Instituto Ayrton Senna elogiou a iniciativa de adotar em BH uma política pública que enfrente a questão do abandono e da evasão escolar a partir de novas estratégias, “de novas formas de abordar o problema que não é recente, mas foi muito agravado pelo contexto que nós estamos vivendo.”

Por fim, ele destacou as parcerias realizadas com as cidades de São Paulo e Teresina. “Temos muito orgulho dessas parcerias que além de trabalharem com a busca ativa, atuam no campo da motivação do estudante para ir e para permanecer na escola. Isso é importante porque o cognitivo e o emocional são partes deste motor da educação integral e o que movimenta esse motor é a motivação”, disse.  Roberto chamou a atenção para a necessidade de ter uma sustentação da política pública em um nível técnico. “É preciso ter multiplicadores de abordagens como essa, dando sustentação a longo prazo, com observações em sala de aula adaptando os instrumentos à realidade de cada escola”, disse. Para ele, é preciso pensar em todos os componentes da política pública como planejamento, governança, sustentação e apresentação de evidências que “são fontes do sucesso dos casos apresentados aqui.” Para finalizar, ele ressaltou que é preciso investimento, paciência e vontade política para que os resultados positivos apareçam.

Engajamento dos estudantes

Professora da Rede Estadual e representante da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, Viviane Pedroso falou da experiência como professora do Projeto de Vida e de como esse projeto poderia impactar o retorno do estudante para a escola. Ela explicou que além do Projeto de Vida, aplicado nos anos finais, a partir do próximo ano, será implantado o Projeto de Convivência para os anos iniciais, que vai desenvolver o emocional do ponto de vista coletivo. Segundo a professora, o impacto no desenvolvimento emocional dos alunos mais velhos foi tão positivo que motivou a adequação da metodologia para que fosse aplicada nas turmas iniciais. Para cada ano, há um material específico, desenvolvido em parceria com o Instituto Ayrton Senna. "Nessas escolas, a gente percebe o engajamento dos estudantes e a possibilidade de escolha - até mesmo para aquelas crianças que estão em uma situação de vulnerabilidade tão grande que não se permitem sonhar.”

Ela chamou a atenção para a necessidade de dar aos professores suporte pedagógico para desenvolver os trabalhos. “O suporte vai orientar esse professor para que ele se sinta apoiado nesse processo e ao mesmo tempo traz uma frequência em que a criança vai pensando e vai desenvolvendo seu projeto de vida”, afirmou.

Busca ativa

O secretário municipal Executivo de Teresina (PI), Cleiton Santos, ressaltou a preocupação com a forma de agir diante do cenário problemático trazido pela pandemia, o temor das famílias e a dificuldade de acessos tecnológicos. Segundo ele, a rede de educação em  Teresina já trabalhava com o projeto Diálogos Socioemocionais. “Os diálogos já serviram para que nossas equipes de profissionais tivessem de certa forma preparadas para esse cenário tão problemático que nós estamos vivendo”. Ele ressaltou o sucesso de iniciativas como a disciplina Protagonismo Juvenil e Projeto de Vida, na qual os alunos trabalham em equipes para aprender a lidar com situações adversas.

Ao explicar a baixa taxa de evasão, Cleiton destacou o projeto "A Escola está ON", que é uma busca ativa de alunos infrequentes. Nesta busca estão envolvidos desde a gestão escolar e plataformas digitais até as equipes da secretaria de Educação. Não sendo possível resgatar esse aluno, o Conselho Tutelar é acionado. “Tudo para garantir que o estudante esteja presente no ambiente escolar, pois acreditamos que um ou dois meses de ausência pode trazer efeitos negativos para o aluno.”

Cleiton também citou, entre avanços e desafios, o papel das famílias nesta proposta de reduzir a evasão escolar no município. “Ainda temos desafios, mas as medidas que têm sido adotadas têm tido um reflexo positivo em relação aos nossos alunos e à redução da evasão escolar . Acredito que, em Teresina, quando falamos de preocupação para a vida educacional, fazemos isso em todos os espaços: as famílias procuram identificar o que que está acontecendo e quando são procuradas pela secretaria ou pelas próprias escolas também demonstram a preocupação com a educação dos filhos", afirmou.

Marcela Trópia quis saber sobre os recursos envolvidos nesta busca ativa. Tanto Cleiton quanto Viviane informaram que as medidas adotadas não representam custos significativos tendo em vista que foram implantadas com os recursos já existentes na rede.

Educação em BH

A professora Marli (PP) concordou que a evasão e o abandono não são problemas recentes mas que foram agravados pela pandemia. “Os alunos substituíram o prazer de aprender pelo prazer de trabalhar e ganhar dinheiro”, afirmou. Já a vereadora Flavia Borja (Avante) lamentou que, durante a pandemia,  o município de Belo Horizonte não tenha priorizado a Educação. Ela revelou que durante reunião da CPI da Covid, realizada nesta quinta (4/11), com a secretária de Educação, foi possível constatar que a PBH não investiu o que deveria, não incentivou o retorno às aulas, além de não ter adotado critérios transparentes para o retorno à atividades presenciais, “que foi a última coisa que aconteceu nesta cidade”. Ao endossar a fala da colega, Marcela informou que, em BH, foram cerca de 400 dias sem aulas.

PL 142/2021

O Projeto de Lei 142/2021 institui a política de combate à evasão e ao abandono escolar e determina que ela seja complementada e desenvolvida por outras áreas além da educação, como saúde e assistência social. O PL propõe diretrizes como o desenvolvimento de programas, ações e articulação entre órgãos públicos, sociedade civil e organizações sem fins lucrativos que visem ao desenvolvimento cognitivo e de competências socioemocionais do aluno durante o ano letivo; a expansão de escolas inseridas na política de educação integral; e a aproximação da família do aluno com suas atividades escolares e planos futuros. Outras diretrizes elencadas são a promoção de disciplinas e atividades pedagógicas de Projeto de Vida; a estruturação de currículo complementar com disciplinas eletivas; a promoção de visitas aos alunos evadidos como forma de incentivo ao seu retorno escolar; além de identificação de alunos e famílias que precisem de apoio financeiro para despesas básicas e acionamento de secretarias responsáveis.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para discutir a importância dos temas de Nudge e Projeto de Vida para o combate ao abandono escolar e à evasão escolar - 36ª Reunião Ordinária:  Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo