Conceito de violência contra a mulher é atualizado em legislação municipal
Trecho que previa o encaminhamento de via da notificação compulsória de violência contra a mulher a vários órgãos foi vetado
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A ampliação do conceito de violência contra a mulher, assim como a classificação dos tipos de condutas que a caracterizam, foi definida em lei (11.289) sancionada e publicada no dia 1º de abril no Diário Oficial do Município (DOM). Passa a ser entendida como violência contra a mulher qualquer ação, omissão ou conduta, baseada no gênero, inclusive decorrente de discriminação ou desigualdade étnica, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual, psicológico, patrimonial ou moral à mulher. O ambiente doméstico e a autoria (pessoa da família ou que tenha com a vítima qualquer outra relação interpessoal no mesmo domicílio) também tipificam essa violência, que pode compreender estupro, violação, maus-tratos, abuso sexual e tortura. De iniciativa da presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte, Nely Aquino (Pode), o texto original foi vetado em parte pelo prefeito. O dispositivo rejeitado, que retorna à análise do Legislativo, previa o envio da Notificação Compulsória de Violência contra a Mulher à Diretoria Regional de Saúde, à Delegacia Especializada de Crimes contra a Mulher e, conforme o caso, ao Conselho Tutelar, à Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente e ao Conselho Municipal do Idoso.
A Lei 11.289 altera a Lei 8.570, de 2003, que dispõe sobre a criação da Notificação Compulsória da Violência contra a Mulher e da Comissão de Monitoramento de Violência contra a Mulher. O texto anterior caracterizava apenas três tipos de violência: física, sexual e doméstica. A nova redação já prevê cinco, estendendo suas definições:
I - violência física: qualquer conduta que ofenda a integridade ou a saúde corporal;
II - violência psicológica: qualquer conduta que a) cause dano emocional e diminuição da autoestima; b) prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento; c) vise degradar ou controlar as ações, comportamentos, crenças e decisões da mulher, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação da intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - violência sexual: qualquer conduta que: a) constranja a presenciar, manter ou participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; b) induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sexualidade; c) impeça de usar qualquer método contraceptivo; d) force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; e) limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - violência patrimonial: qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - violência moral: qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Outra mudança em relação ao texto original foi a inclusão de dispositivo que prevê infração de legislação referente à saúde pública em caso de inobservância das obrigações estabelecidas na lei, sem prejuízo das sanções penais cabíveis.
Veto à notificação aos órgãos competentes
Justificando inconstitucionalidade, o prefeito Alexandre Kalil (PSD) vetou trecho que determinava o encaminhamento de via da notificação compulsória de violência contra a mulher a vários órgãos, entre eles a Delegacia Especializada de Crimes contra a Mulher. De acordo com o Executivo, o assunto é regido pelo direito processual penal, e, portanto, reservado à competência legislativa da União. Kalil também argumenta que o dispositivo vetado não traz inovação ao ordenamento jurídico, mencionando legislação federal que estabelece comunicação à polícia que casos em que haja indícios ou confirmação de violência contra a mulher no prazo de 24 horas (Lei Federal 10.778/2003).
Histórico
O PL 865/19, que deu origem à 11.289/2021, gerou debate enquanto tramitou na Câmara Municipal. Durante sua votação em 2º turno, vereadoras contrárias ao projeto - Iza Lourença (Psol), Macaé Evaristo (PT) e Duda Salabert (PDT) - argumentaram que a compulsoriedade da notificação retira a autonomia da vítima e aumenta o risco de retaliação por parte do agressor, sendo necessário um apoio efetivo do poder público para encorajar a denúncia. Já a autora do texto, Nely Aquino, juntamente com Irlan Melo (PSD), Professor Claudiney Dulim (Avante), Rogerio Alkimim (PMN) e Rubão (PP), argumentou que o procedimento favorece a penalização do agressor, que pode ficar impune por não ter sido denunciado. “Por mais que a mulher esteja num momento vulnerável e apresentar a situação para a polícia seja uma coisa séria, mais sério é ela morrer dentro de casa sem a polícia ficar sabendo”, disse Nely.
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