CPI LAGOA DA PAMPULHA

Mau cheiro, lixo e poluição são queixas trazidas por moradores da região

Comunidade confirma que problemas se arrastam ano após ano e cobra soluções permanentes. CPI se compromete a buscar respostas

terça-feira, 7 Março, 2023 - 17:15

Foto: Cláudio Rabelo/CMBH

"A Pampulha virou um sorvedouro de dinheiro público"."Há anos vemos as coisas do mesmo jeito"."A população não vai mais tolerar isso". Estas são algumas das declarações ouvidas durante audiência pública da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) - Lagoa da Pampulha, ocorrida nesta terça-feira (7/3). Os depoimentos, dados por moradores e representantes de associações de bairros e de entidades que utilizam a orla, contam uma história de repetição assentada em inúmeras tentativas de se recuperar um dos grandes símbolos da cidade e em gastos de milhões por parte do poder público. Além das queixas quanto à falta de soluções, a comunidade denuncia o mau cheiro, o acúmulo de lixo, a poluição e o depósito intencional de material, criando áreas assoreadas que interferem na preservação do espelho d'água. Parlamentares mostram descrença com ações que estão em andamento, se queixam da demora e incompletude das respostas da Prefeitura e prometem não apenas levar as demandas para o Executivo, mas também cobrar e propor soluções que sejam permanentes.

Medidas precisam de urgência

Presidente da Associação Pro-civitas, o coronel reformado dos Bombeiros Matuzail Martins da Cruz conta que há 30 anos levava seus alunos da academia para treinar na Lagoa da Pampulha. Remo, natação e lazer eram comuns nas águas limpas da lagoa. Mas de lá pra cá muita coisa mudou e, segundo Matuzail, que há 49 anos reside na região, os moradores convivem com o risco de inundação, já que há pontos completamente tomados pelo assoreamento, como nas proximidades do Bairro Céu Azul e em frente ao Zoológico . "Assoreamento é o que vem com as águas das chuvas. Mas não foi o que ocorreu. Empresas que foram contratadas para retirar resíduos deixaram ali mesmo os depósitos", afirmou. Ainda segundo o representante dos moradores, a região é muito bonita mas precisa ser cuidada tanto do ponto de vista do lazer, quanto da segurança de quem vive ali. "Não dá mais para esperar, é preciso trazer algo que seja uma solução mais efetiva. Queremos uma Pampulha que seja altiva, que as pessoas tenham orgulho de visitar e de morar", declarou.

A urgência na solução dos problemas também é uma cobrança do presidente da Associação dos Moradores do Bairro Ouro Preto (Ascobop), Márcio Saldanha. Para o dirigente, é lamentável o que a cidade assiste ao longo dos anos em relação à Lagoa da Pampulha. "A população não atura mais este comportamento do poder público. A Pampulha virou um sorvedouro de dinheiro público", declarou Saldanha, referindo-se aos diversos contratos feitos pela Prefeitura, ao longo dos últimos anos, para a recuperação ambiental do cartão postal.

Audiência pública para colher depoimentos da sociedade civil e representantes de classe com relação à degradação do Conjunto Arquitetônico da Lagoa da Pampulha - 6ª Reunião - Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI - Lagoa da Pampulha

Ralo por onde escorre dinheiro

Quem também tem visto a história da recuperação da lagoa se repetir ano após ano é Décio Chami. Morador da região desde 1977, o  engenheiro civil conta que escolheu BH para morar em função da qualidade de vida que a cidade oferecia. Chami, que chegou a integrar um grupo criado pela Prefeitura para tratar da recuperação da bacia, coleciona dezenas de recortes de jornais, com reportagens publicadas nos principais veículos da cidade, entre os anos de 1999 e 2004. Nos títulos das notícias, as mesmas promessas do poder público de retirar o esgoto, as denúncias sobre os altos custos dos contratos e a mesma demora e ausência de informação. Para o morador, é preciso encontrar uma solução que 'feche o ralo' da Pampulha por onde escoa tanto dinheiro. "Sempre lutei pela Pampulha e tenho muita documentação sobre ela. Que possamos acoplar na CPI uma CPS – para acrescentar uma comissão parlamentar de soluções, porque não é apenas apontar os responsáveis, mas também as soluções para que a Pampulha volte a ser o que era", propôs.

A CPI dará resultados. Este foi o retorno dado por Flávia Borja (PP) já após os primeiros depoimentos. Para a parlamentar, que disse se colocar no lugar dos moradores que há anos escutam as mesmas promessas, esta CPI é diferente e irá sugerir inclusive indiciamentos, caso seja necessário."Estamos comprometidos com isso. Não temos nenhum medo e levaremos isso adiante. Conte com o nosso compromisso total", afirmou aos presentes.

Também o presidente da CPI, Professor Juliano Lopes (Agir), assegurou a atuação da comissão no sentido não apenas de apontar responsáveis, caso hajam, mas também de propor soluções. O parlamentar que agradeceu a disponibilização dos documentos apresentados por Décio Chami, disse que já tinha ouvido falar disso tudo (contratos, falta de informação) e que agora há provas. Juliano também lembrou que a população pode enviar contribuições à CPI por meio do e-mail: cpilagoadapampulha @cmbh.mg.gov.br e de formulário eletrônico.

Permeabilidade do solo, vetor de doenças e mau cheiro

Já a capacidade de permeabilidade do solo é a preocupação apontada pela vice-presidente da Ascobop. Segundo Virgínia Fernandes, as ruas do entorno da lagoa são originalmente de paralelepípedo para se garantir a permeabilidade do solo. Mas, entretanto, a própria Prefeitura estaria realizando recapeamento asfáltico nas vias. "Nós moradores temos que manter 30% de área permeável de nossos imóveis, mas a PBH não mostra critério para o asfaltamento. As vias estão sendo pavimentadas com asfalto e o paralelepípedo deveria ser mantido, não apenas pela caracterização do conjunto arquitetônico, mas pela permeabilidade do solo", justificou.

A vice-presidente também se queixou da demora em se conseguir respostas junto à Prefeitura e da ausência de campanhas educativas, por parte do Município, sobre a importância de se preservar o patrimônio da Pampulha. "Daqui a pouco, se nada for feito, estaremos vendo apenas brejo e um vetor de doenças. Teremos perda no valor dos imóveis e perda do patrimônio ambiental", lamentou.

Os esportistas Gustavo Dioclecioano e João Batista Filho falaram de uma queixa comum, que é o mau cheiro em diversos pontos da lagoa. Gustavo, que integra um grupo de ciclistas, também cobrou campanhas educativas por parte da PBH, já que os próprios usuários muitas vezes não zelam pelo patrimônio. "A população tem pouca educação para usar a estrutura que ainda temos. Com este tanto de dinheiro, não se vê campanhas de educação para os ciclistas, donos de pets, corredores e visitantes em geral", declarou.

Já o corredor de rua João Batista Filho, que integra a Equipe Galo Runneres, confirma que há dias que a prática é finalizada mais cedo por causa do mau odor. "Tem horas que você vai correr e tem que prender a respiração. Tem dia que é muito lixo. Às vezes terminamos o treino e queremos ficar conversando, mas com o mau cheiro vamos embora", contou.

Novos ecossistemas e trabalho contínuo

E se a solução para a recomposição ambiental não aparece, novos desafios vão surgindo. É o caso dos novos microecosistemas que já estão se formando no entorno da Lagoa da Pampulha. Thiago Mafra Gomes, preside a Ecoaves, ONG de observação de aves, e afirma que, além das cerca de 150 espécies de aves já catalogadas na região, outras têm migrado para utilizar os habitats em deselvolvimento, como os que surgem com os depósitos de sedimentos. "O assoreamento é crime grave, mas criou um ecossistema próprio, da taboa (planta subaquática), e a sua retirada, se não for feita com responsabilidade, é prejudicial, pois são criatórios de aves migratórias", explicou o ambientalista, pedindo atenção dos parlamentares também para a fauna, a flora e o ecossistema como um todo.

Já Carlos Augusto Moreira, presidente do Consórcio Recuperação da Lagoa, defende a continuidade dos trabalhos. Segundo o dirigente, que afirma não ter vínculo político-partidário, o mau cheiro não seria da lagoa e estaria apenas em três pontos: nas chegadas dos Córregos Sarandi e Ressaca, que são de responsabilidade da Copasa para retirada do esgoto; na altura da trincheira da Antônio Carlos, em função de uma falha de construção do canal que leva as águas do córrego para a Estação de Tratamento de Esgoto (Ete) Onça; e na altura da Avenida Fleming, onde há descarte dos restaurantes e limpeza da fossa. "Sou voluntário e não sou de partido político, não conheço o prefeito de agora, nem o anterior. Mas a realidade é que o mau cheiro não é dali. Não sei quem contratou (a limpeza da lagoa) e se contratou bem ou não. Mas a lagoa está melhor", afirmou dizendo ainda esperar que a CPI chegue ao seu objetivo.

CPI irá onde for preciso

Para os parlamentares que integram a CPI, os depoimentos colhidos foram de grande importância. Sérgio Fernando Pinho Tavares (PL) ressaltou que, pelo caráter metropolitano da Pampulha, é preciso envolver a Prefeitura de Contagem, e que não é possível limpar a lagoa apenas com produtos químicos. "Não acredito na retirada do esgoto em até cinco anos, porque isso foi prometido em 2016, na época das Olimpíadas. Então qual é a solução? Estação de tratamento? Porque acho que temos que tratar antes de chegar na lagoa", considerou.

Também o relator da CPI, Braulio Lara (Novo), destacou a inoperância do poder público e cobrou ações que são responsabilidade do Município. "Atribuir responsabilidade a outros é fácil. Mas se foi feita movimentação de terra em BH, a PBH tem a informação, porque precisa de alvará. A PBH sabe quais são as moradias que têm esgoto clandestinos e as ocupações feitas no espaço urbano sem fiscalização", afirmou.

Professor Juliano Lopes encerrou a audiência ressaltando que os vereadores não medirão esforços para mostrar um resultado para a cidade. "Reportagens indicam que desde 1992 a Copasa dizia que limparia a lagoa até 2013. São 10 anos. Vamos parar de falácia. Não temos nada contra o atual prefeito. Mas se fosse eu o prefeito encerraria esses contratos de imediato, até resolver o problema. Pelo menos suspensão de 90 dias, até entendermos os contratos", afirmou, relembrando a importância de uma resposta à sociedade.

Além dos citados participaram da audiência Cleiton Xavier (PMN), Rubão (PP), Irlan Melo (Patri) e Jorge Santos (Republicanos)

Assista à íntegra da reunião.

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