TRANSPORTE COLETIVO
Falta de ônibus noturno tem impactado setor de bares e restaurantes de BH
Apesar da oferta de vagas, donos de estabelecimentos não têm conseguido contratar e estão encerrando o expediente mais cedo
quinta-feira, 24 Julho, 2025 - 18:45

Foto: Denis Dias/CMBH
“Belo Horizonte é a capital dos bares, só que na 'capital dos bares' eles fecham muito cedo”, afirmou Iza Lourença (Psol), uma das solicitantes da audiência pública realizada pela Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços na tarde desta quinta-feira (24/7). O colegiado reuniu donos de bares e restaurantes, entidades de classe e representantes do Executivo municipal e das concessionárias de transporte coletivo para debater a falta de circulação de ônibus noturno em Belo Horizonte. A situação, segundo os proprietários de bares presentes, tem impactado a contratação de pessoal, apesar da oferta de vagas. O representante da PBH garantiu que o Projeto de Melhoria do Transporte Coletivo está em andamento, com a realização de uma pesquisa sobre o serviço ofertado no período noturno, e que esses dados possibilitariam intervenções no sistema já a partir do mês de setembro. Trópia (Novo), que presidiu audiência pública, demonstrou interesse em acompanhar os dados obtidos e fazer indicações para a melhoria do serviço. O debate foi realizado também a pedido de Helton Junior (PSD) e Luiza Dulci (PT).
Efeitos da pandemia
Segundo Trópia, após a pandemia, houve uma “redução drástica” dos horários noturnos dos ônibus da capital em diferentes linhas, sendo “raras”, segundo ela, aquelas que mantêm a circulação depois das 23h. “E quando isso acontece é de ‘hora em hora’. Se demorar 15 minutos a mais para fechar o caixa, o funcionário perde o ônibus”, disse a parlamentar.
“Meu sonho é que a gente tenha linhas noturnas, inclusive; que a gente possa conectar os grandes corredores de bares e restaurantes às estações e ao metrô (...), porque isso promove mais integração e fica mais fácil contratar, não só em Belo Horizonte, mas na Região Metropolitana, e a gente devolve essa vida noturna para a cidade", declarou Trópia.
“Belo Horizonte é a capital dos bares, só que na “capital dos bares” eles fecham muito cedo, fecham antes da meia-noite, antes de 11 horas, porque não tem como as pessoas voltarem para a casa”, declarou Iza Lourença. A parlamentar destacou que a ampliação de horários do transporte, além de fomentar o comércio e o turismo da capital, é capaz de oferecer mobilidade com segurança, sobretudo para as mulheres.
Direito à mobilidade
Para Luiza Dulci, a mobilidade em Belo Horizonte seria “o principal problema” da cidade. A parlamentar fez menção também às pessoas que vão assistir a jogos à noite no Estádio Mineirão; aos estudantes, muitos deles jovens, que têm aulas no período noturno; e os trabalhadores da capital que residem na Região Metropolitana. “Falar de transporte público é falar também de integração com a Região Metropolitana; porque quando a gente fala de trabalho em Belo Horizonte, todos os bairros, qualquer negócio de BH tem um trabalhador que é de [Ribeirão das] Neves, Contagem, Ibirité, Betim. Quantas horas essas pessoas demoram para chegar em suas casas?”, questionou Luiza Dulci.
Morador do Bairro Lindeia, na Região do Barreiro, Helton Junior fez coro à colega e destacou a falta de integração do transporte metropolitano com as linhas de ônibus da capital, com horários “ainda piores”. Helton contou que, aos domingos, o ônibus que atende seu bairro para de circular às 16h, impedindo os moradores da região, sobretudo os mais vulneráveis, que não teriam condições de custear um transporte particular, de acessar lazer e cultura no Centro da capital.
“Se a gente não tem uma rotina na qual o ônibus funciona também na parte da noite, uma série de direitos estão sendo negados: direito à educação, direito ao lazer, direito a viver a cidade e a pertencer; direito de ir e vir, que são direitos fundamentais”, afirmou Helton.
Impactos no setor de bares e restaurantes
A presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel), Karla Rocha, disse que a ampliação de horários noturnos no transporte da capital é um pleito antigo do setor. Segundo ela, foi enviado a todos os candidatos à última eleição para a Prefeitura de Belo Horizonte um manifesto assinado por donos de bares e restaurantes, no qual essa demanda “estava em primeiro lugar”. Ela destacou a dificuldade para contratação de trabalhadores, apesar da oferta de vagas. “Tem demanda, mas não existem pessoas para poder trabalhar”, disse ela.
Vinícius Freitas, dono do Querida Jacinta, bar localizado no Bairro Santa Efigênia, na Zona Leste da Capital, disse que a situação tem trazido “bastante restrições” e prejuízos ao negócio. Ele disse vir “fechando a cozinha às 22h30” e encerrando as atividades do bar antes do desejado para permitir a volta para casa de seus funcionários. “É uma conversa constante no ambiente de trabalho, que traz bastante preocupação, inquietação e ansiedade para os trabalhadores que dependem dos ônibus noturnos”, disse ele.
Além dos clientes e trabalhadores de bares e restaurantes, Trópia lembrou de profissionais que atuam em padarias; profissionais de saúde de UPA’s e hospitais; da construção civil e da limpeza urbana. “A gente tem várias pessoas que ficam ‘reféns’ de pouca opção para poderem trabalhar”, lembrou. A parlamentar pediu um “compromisso” da prefeitura com o restabelecimento do quadro de horários anterior à pandemia.
Pesquisa do transporte noturno
Lucas Colen, subsecretário de Planejamento da Mobilidade da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, afirmou que, atualmente, tanto o número de viagens quanto a rede de transporte é bem semelhante à de 2019, mas que desde o início deste ano a PBH percebeu a “necessidade de adequar”. Uma das ações do Projeto de Melhoria do Transporte Coletivo é uma pesquisa “origem-destino” iniciada no mês passado. Ainda em andamento, ela irá mapear horários de maior demanda, rotas mais utilizadas e padrões de deslocamento dos usuários de bares, restaurantes, padarias e shoppings da capital. Ainda de acordo com o subsecretário, a PBH ampliará a pesquisa, no mês de agosto, para hospitais e universidades. “A partir dessa resposta, nós vamos trabalhar a nossa rede noturna, adequar a rede existente e propor também novas linhas, quando for o caso”, afirmou ele, que completou dizendo que a segurança, vigilância e iluminação dos abrigos de ônibus também está contemplada no Projeto de Melhoria do Transporte Coletivo.
O representante do Executivo informou que a análise dos dados obtidos será iniciada no mês de agosto, e as primeiras adequações identificadas a partir da pesquisa já poderiam se iniciar em 30 dias após essa avaliação, ou seja, entre o final de agosto e início de setembro. Lucas Colen informou também que, até o momento, 30% dos participantes desse levantamento são moradores de cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte, motivo pelo qual os dados seriam compartilhados e apresentados pela PBH à Secretaria de Estado de Infraestrutura, Mobilidade e Parcerias de Minas Gerais (Seinfra-MG).
Divergências
De acordo com Célia Macieira, assessora técnica do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH), com o fim da pandemia, houve uma queda de 41% no número de usuários do transporte coletivo da capital no período noturno. Em um mês típico de 2020, segundo dados do sindicato, 123.300 passageiros faziam uso do serviço, número que hoje não chegaria a 73 mil usuários. No entanto, o quantitativo de viagens realizadas, ainda segundo o sindicato, foi “mantido”, com redução de apenas 3% no número. Célia Macieira disse acreditar que a pesquisa da PBH poderá esclarecer se a solução para o transporte coletivo noturno na capital seria simplesmente o aumento de viagens, uma vez que, segundo ela, caso haja mudanças elas “vão impactar, com certeza, no orçamento”.
Para Trópia, porém, o usuário do transporte coletivo noturno ainda “não existe” aos olhos do Setra-BH, uma vez que, dada a baixa oferta, os usuários estariam ou deixando de circular à noite ou buscando outras soluções, como carona ou transporte por aplicativo. “Não tem demanda pelo que eu já estou atendendo ou será que não tem demanda porque, já que não tem a oferta, eu nem consigo contratar e vocês nunca vão saber se a pessoa precisa pegar o ônibus?”, questionou a parlamentar. Ela sugeriu aos representantes das empresas a adoção de veículos menores com maior número de viagens, “em vez de manter um ônibus grande, que vai vazio, e de meia em meia hora, e não atende”, propôs. Iza Lourença também acredita que há uma divergência entre os números apresentados pelo Setra-BH e o que, na prática, “as pessoas vivem na cidade de Belo Horizonte”.
Trópia disse que irá formalizar questionamentos sobre a questão ao Setra-BH por meio de pedido de informação, para facilitar “análises e cruzamentos” dos números apresentados pelo sindicato, além da indicação para uma experiência com ônibus do tipo suplementar no período noturno. A parlamentar disse também que uma próxima audiência pública sobre o tema deveria contar com a participação dos representantes do transporte coletivo metropolitano. Trópia ainda deixou “pré-marcado” um novo debate no mês de setembro para a apresentação dos dados obtidos pela pesquisa da PBH.
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