IGUALDADE RACIAL

Avança em 1º turno PL que proíbe censura contra a arte e a cultura

Texto impede que a administração municipal analise mérito de composições artísticas para dar acesso a financiamento público

terça-feira, 21 Outubro, 2025 - 15:00
jovens se apresentam em palco diante de plateia

Foto: Prefeitura de Belo Horizonte

O projeto de lei que busca instituir, em Belo Horizonte, o Programa de Prevenção à Censura contra a Arte e a Cultura obteve aval da Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor em reunião realizada nesta terça-feira (21/10). O objetivo do PL 360/2025, de autoria de Juhlia Santos (Psol) e Pedro Patrus (PT), é coibir mecanismos que dificultem o acesso da população a manifestações de cultura popular, em especial àquelas ligadas às comunidades periféricas e tradicionais. Para o relator Pedro Rousseff (PT), a proposta “consolida o compromisso” do Município com a liberdade de criação, a diversidade cultural e a democratização do acesso à cultura. O projeto de lei ainda será analisado por duas comissões de mérito antes que possa ir a Plenário. Confira aqui o resultado completo da reunião.

Realidade das favelas

O PL visa incentivar a produção da cultura popular nas periferias; combater o preconceito contra manifestações artísticas vindas das favelas; e estimular incentivos públicos à cultura periférica. Nesse sentido, o PL 360/2025 proíbe que a administração municipal avalie “o mérito” das composições artísticas e culturais como critério para acesso a recursos públicos, atendo-se tão somente a “questões técnicas e formais”. A intenção dos autores da proposta é evitar que o poder público impeça contratações e financiamento de artistas que exponham, em letras de músicas, “a realidade das favelas e periferias”.

Na justificativa à proposta, os parlamentares defendem que a cultura é “uma ferramenta importante” para que a juventude das periferias, em sua maioria negra, possa se expressar, “inclusive denunciando as estruturas sociais que, por vezes, condicionam sua sobrevivência ao crime organizado”, apontam.

“Censurar essa ferramenta, através da criminalização do funk, do rap, do trap ou de qualquer outro gênero musical, vai não só restringir o acesso e as oportunidades que a cultura gera, como também vai privar-nos de olhares que dizem sobre uma realidade que carece de transformação social”, defendem Juhlia Santos e Pedro Patrus.

Liberdade de expressão

Em seu parecer, Pedro Rousseff opina que o PL 360/2025 se alinha com normativas internacionais nas temáticas de direitos humanos e liberdade de expressão, com destaque para a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. O projeto de lei, segundo o relator, também “se harmoniza” com os princípios e objetivos fundamentais da Constituição Federal, que assegura, como direito fundamental, a liberdade de expressão da atividade intelectual e artística, independentemente de censura ou licença. “Ademais, o texto constitucional estabelece que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização das manifestações culturais”, completa o relator.

Rousseff também aponta que, no plano normativo municipal, o PL 360/2025 “vai ao encontro” da Lei 10.854, de 2015, que institui o Plano Municipal de Cultura de Belo Horizonte, e da Lei 11.010, de 2016, que implementa o Programa Cultura Viva. Ambas as normativas, segundo o parlamentar, “reconhecem a cultura como direito e instrumento de cidadania, valorizando as expressões artísticas populares e periféricas e incentivando políticas de fomento descentralizadas”. 

“O projeto reforça o alcance dessas políticas, consolidando o compromisso do Município com a liberdade de criação, a diversidade cultural e a democratização do acesso à cultura”, aponta Pedro Rousseff em seu parecer.

Retrato da realidade x apologia ao crime

Dois outros projetos de lei tramitando na Câmara de BH têm colocado o tema das manifestações culturais na pauta de debates da Casa. O PL 25/2025, assinado por Vile Santos (PL), quer vedar a contratação, com recursos públicos, de artistas ou grupos cujas músicas ou apresentações contenham “apologia ao crime, conteúdo sexual explícito ou incitação ao uso de drogas”. No mesmo sentido, o PL 89/2025, de autoria de Vile e Flávia Borja (DC), pretende proibir a execução de músicas com esse tipo de conteúdo em escolas públicas e particulares da capital mineira

Os autores dos projetos defendem que a “exaltação de comportamentos ilegais ou violentos” pode contribuir para a normalização dessas práticas na sociedade e influenciar os jovens, deixando também as crianças desprotegidas. Ambas as propostas foram tema de audiência pública na Câmara, que contou com a presença do rapper Djonga. Na ocasião, vereadores e artistas afirmaram que as medidas querem “silenciar” a cultura periférica e “criminalizar” ritmos como o funk, o rap e o hip-hop. 

Para Juhlia Santos e Pedro Patrus, autores do PL 360/2025, a “insistência” em relacionar essas expressões artísticas à apologia ao crime ou associação ao tráfico demonstra “completa incapacidade” de compreender a linguagem metafórica frequentemente utilizada em músicas. “São discursos que frequentemente confundem narrativa artística com incitação ao crime, ignorando que muitas músicas retratam a realidade, não a promovem”, afirmam na justificativa da proposta.

Tramitação

O PL 360/2025 ainda será analisado pelas Comissões de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo; e de Administração Pública e Segurança Pública antes que possa ser levado à primeira votação no Plenário. Para se tornar lei, a proposta depende do voto favorável da maioria dos vereadores (21), em dois turnos, e da sanção do prefeito Álvaro Damião.

Superintendência de Comunicação Institucional