Empresa contratada pela PBH pagou contas particulares do ex-prefeito Kalil
Segundo proprietária da Unitour, empresa arcou com hospedagens no Copacabana Palace, tendo sido posteriormente ressarcida
Foto: Bernardo Dias/CMBH
O ex-prefeito de BH, Alexandre Kalil, teve hospedagens no Copacabana Palace Hotel, em 2019, pagas pela Unitour Universal Turismo Ltda e pela sua proprietária, Eloá Maria Starling Mendes Ribeiro. A informação foi confirmada pela própria dona da empresa, que prestou depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito – Abuso de Poder na PBH, em reunião realizada nesta quinta-feira (16/2). Segundo Eloá, Kalil é amigo íntimo da família há anos e a prática de efetuar o pagamento, e somente depois receber do ex-prefeito, seria comum. A Unitour é uma empresa de consultoria em viagens e já prestou serviços na área para a PBH, outros órgãos públicos municipais e estaduais, como também para empresas como a Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Tratex e Clube Atlético Mineiro, com quem deixou de atuar em 2021. Eloá foi ouvida na condição de testemunha e seus advogados se comprometeram a enviar para a CPI diversos documentos como notas fiscais, e-mails e outras informações, principalmente sobre contrato firmado entre a empresa de turismo e a PBH durante a administração de Kalil.
A CPI Abuso de Poder na PBH realizou nesta quinta sua primeira oitiva. Em quase três horas de depoimento, Eloá Mendes, atual proprietária da empresa Unitour, que presta consultoria em viagens, apresentou informações e respondeu questionamentos dos vereadores, principalmente sobre os serviços prestados para a Prefeitura de Belo Horizonte em 2017, quando Alexandre Kalil era prefeito, e sobre o pagamento por parte da empresa e da própria Eloá, de hospedagens do ex-prefeito no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, em diferentes datas do ano de 2019.
Contrato milionário
Esposa do antigo proprietário da empresa, Frederico Mendes Ribeiro, falecido em 2019, Eloá afirmou, em vários momentos, que todo o processo de licitação emergencial do qual a empresa participou em 2017 foi lícito, não tendo havido favorecimento. Eloá explicou que a Unitour sempre teve muito cuidado no atendimento de órgãos públicos e que esse contrato em específico foi feito para durar seis meses, mas foi rescindido pela PBH com 3 meses. O contrato citado, registrado sob o número 01.056.148.17.65, que se encontra disponível no site da PBH, tem o valor de R$ 1.243.721,75 e tinha vigência de 180 dias. Ele prevê a “prestação de serviços sob demanda, de reserva, emissão, remarcação, alteração ou cancelamento e entrega de bilhetes de passagens aéreas, terrestres, nacionais e internacionais, reserva de hospedagem em todo o território nacional, com utilização de sistema informatizado de gestão”.
Segundo membros da CPI, a vencedora da licitação foi a SX Tecnologia, que teria sido eliminada por não ter um sistema que pudesse ser utilizado pelo Executivo internamente para solicitação e compra das passagens. “Uma empresa ficou na frente da Unitour. Não falaram pra senhora que o primeiro lugar tinha sido desclassificado?”, perguntou Fernanda Altoé. “Não. Só falaram que fomos aceitos nessa emergencial”, respondeu Eloá. “O argumento da PBH é que a SX tinha sistema de gestão incompatível com a Prefeitura”, disse Fernanda voltando ao tema. “Eles pedem um sistema que é colocado dentro da PBH. Estou imaginando que seja isso. Um sistema que a gente coloca e eles já fazem o pedido, que já chega pronto para a empresa”, explicou a empresária. Perguntada se ela era a responsável pelo recebimento das propostas, disse que o contador, que também já faleceu, recebia as propostas e ela assinava o contrato.
Os vereadores apresentaram ainda, notas de empenho assinadas pela Prefeitura com valores redondos de R$ 15 mil, R$ 30 mil. “Temos várias faturas com valores redondos. O contrato previa valores reais”, disse Fernanda. “Nossas faturas apresentam valores reais gastos”, disse a depoente afirmando não ter conhecimento de empenhos com valores redondos. Eloá informou ainda que, com a finalização do contrato antes do previsto, a empresa recebeu cerca de R$ 300 mil da PBH e, por meio de seu advogado, vai enviar todas as informações e documentos pedidos pelos vereadores no prazo máximo estabelecido de 10 dias úteis.
Pagamentos de viagens particulares
Eloá também foi questionada sobre a relação de sua família com a família do ex-prefeito e sobre o pagamento, pela empresa e também por ela mesma, de hospedagem de Kalil no Copacabana Palace em 2019. “Ele é amigo da família há muito tempo, principalmente do meu marido”, disse Eloá, informando aos vereadores que achava que já tinha se reunido com o ex-prefeito na sede da Prefeitura. “Se me recebeu, foi uma vez”, afirmou. Sobre a prestação de serviços para o Clube Atlético Mineiro, ela afirmou que foram quase 20 anos de trabalho, que teve início na administração do ex-presidente do Galo, Ricardo Guimarães, e que se encerrou em 2021. “Qual o motivo de ter deixado de atender ao Atlético em 2021?”, questionou Uner Augusto (PRTB). “As pessoas tem o direito de mudar. Nunca tive problemas no atendimento ao Atlético”, disse a depoente.
Sobre as viagens do ex-prefeito ao Rio de Janeiro em 2019, Eloá afirmou que foram “particulares, solicitadas por ele” e que Kalil nunca esteve no Copacabana Palace pela PBH. O questionamento foi feito em função de algumas das datas em que Kalil esteve hospedado no hotel serem em dias normais de trabalho e não em finais de semana e feriados, e terem sido pagas pela empresa. Eloá confirmou que pagou por hospedagem e também pelo consumo do ex-prefeito. “Dr. Alexandre já o conheço há anos. Sempre foi meu marido quem o atendeu. Eu tinha ordem de não deixar de atender o Alexandre”, disse a depoente explicando aos participantes que tinha uma espécie de “caderneta” onde anotava os custos e pagamentos feitos com Kalil. “Mas a senhora pagava despesas pessoais bem altas. Tinha contrato com Kalil para fazer dessa forma?”, perguntou Fernanda. “Como meu marido tinha amizade antiga com o pai do Kalil, a gente atendia. Nesse caso, uma parte foi paga com o cartão da empresa e outra no meu cartão. Ele me mandava o dinheiro”, explicou Eloá dizendo que o ex-mandatário municipal fazia o pagamento “devagar” e que o escritório recebia.
Eloá respondeu também a questionamentos feitos pelos vereadores Cleiton Xavier (PMN), Wesley (PP), que preside a CPI, e Ciro Pereira (PTB). Em vários das respostas, ela disse não se lembrar de algumas informações como valores, nomes de pessoas e datas de contratos, mas se prontificou a enviar todas as informações solicitadas pela CPI. O depoimento, que durou quase três horas, foi o primeiro de uma séria de oitivas que serão feitas pela Comissão. A próxima está marcada para o dia 2 de março, com o presidente do Conselho de Ética Pública de Belo Horizonte, Rodolfo de Lima Gropen.
Ao final da oitiva, o vereador Wesley agradeceu à depoente e disse que o trabalho da CPI é algo sério. O parlamentar ainda demonstrou descontentamento com o atual prefeito Fuad Noman (PSD), que teria dito em veículo de imprensa de BH que a “CPI é ruim”. “Ele menosprezou nosso trabalho, nossa função de fiscalizar”, disse Wesley.
A CPI- Abuso de poder na PBH tem prazo de 120 dias, prorrogável por mais 60, para determinar diligências, convocar autoridades, tomar depoimentos, ouvir indiciados, inquirir testemunhas, requisitar informações, documentos e serviços, inclusive policiais, e transportar-se aos lugares onde se fizer necessária a sua presença. O relatório final dos trabalhos será encaminhada pelo presidente da Câmara ao Ministério Público ou à autoridade competente para que se promova a responsabilização civil, criminal ou administrativa do infrator.
Assista a íntegra da reunião.
Superintendência de Comunicação Institucional