No mês da mobilidade, a Câmara de BH segue pautando a ausência dos cobradores
Primeira matéria especial da série Mobilidade aborda a atuação dos parlamentares em defesa do transporte coletivo de qualidade
Foto original: Breno Pataro/ Portal PBH
Um espaço urbano planejado e humanizado, com estruturas preparadas para oferecer serviços de qualidade, seja nas instituições públicas ou estabelecimentos privados, seja no transporte coletivo ou em modais alternativos, é garantia de respeito ao direito de ir e vir, à liberdade e à dignidade do cidadão. Engajados nessa luta, movimentos populares e ativistas de BH comemoram, neste mês de setembro, o Mês da Mobilidade Urbana, com uma programação variada, incluindo passeios ciclísticos, caminhadas, rodas de conversa e ônibus gratuitos. Na Câmara de BH, os vereadores estão fazendo a sua parte, com a apresentação de projetos de lei, realização de audiências públicas e seminários, além das discussões diversas no âmbito das comissões temáticas. Nesta primeira edição da série especial de notícias sobre “Mobilidade Urbana” – que prevê publicações semanais durante todo o mês – serão apresentados alguns dos debates, propostas e ações pautadas no Legislativo pela construção de uma cidade mais justa e cidadã.
A presença dos cobradores no transporte público coletivo da cidade vem dividindo opiniões entre a Prefeitura de Belo Horizonte, o Conselho Comunitário de Segurança Pública (Consep), o Movimento Tarifa Zero e o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra/BH). Se a ausência do agente de bordo é considerada, por um lado, uma economia para as empresas, por outro, é alvo de questionamentos, alegando-se o risco de acidentes pela sobrecarga dos motoristas.
Diante da situação, tramitam na Câmara Municipal projetos de lei sobre o tema. Uma das propostas prevê a cassação da concessão das empresas que reincidirem na conduta irregular (ausência de cobrador); outra proíbe o motorista profissional de exercer, cumulativamente, as funções de motorista e cobrador. Há também um PL que determina a disponibilização de tomadas para recarga de celulares e acesso à internet aos usuários do transporte público. Por iniciativa de acadêmicos, especialistas e líderes comunitários, foi apresentado, ainda, à Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário, estudo técnico com propostas de melhorias para o sistema de transporte da capital.
Estudo para reestruturação do transporte coletivo
Na reunião da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário do dia 13 de junho deste ano, foi aprovado o encaminhamento, à Prefeitura e à BHTrans, de estudo técnico realizado por acadêmicos, especialistas e líderes comunitários de diferentes regiões da cidade (Grupo Belo Horizonte Transporte e Trânsito - BHTT), que diagnosticou problemas, propondo melhorias no sistema de transporte coletivo de BH.
O estudo ouviu e analisou sugestões de 10 mil usuários e associações de bairro, embasando-se em análise do sistema de transporte desde outubro de 2018 e abrangendo aspectos como itinerários e vias utilizadas, localização de pontos de parada e tempo de espera dos usuários. O principal problema apontado foi que, buscando atender às áreas de maior demanda ou priorizar vias mais largas, diversas linhas de ônibus têm os itinerários concentrados em regiões mais movimentadas dos bairros, deixando desassistidas outras áreas.
A proposta, debatida no dia 13 de agosto, em audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário, mostra que o Sistema de Transporte Público de Belo Horizonte possui atualmente 295 linhas que fazem juntas mais de 600 mil viagens por mês, percorrendo um trajeto de aproximadamente 14 milhões de quilômetros mensais. Cerca de um milhão de usuários utilizam o transporte público diariamente nos 2856 ônibus existentes. O sistema de transporte gira aproximadamente R$ 1,1 bilhão por ano.
As principais queixas apresentadas no estudo referem-se à demora nas viagens, à má prestação de serviços noturnos e à falta de padronização de informações das linhas em placas informativas e letreiros auxiliares. As sugestões envolvem a revisão do itinerário de diversas linhas de ônibus que podem estar infladas ou ociosas, revisão dos locais dos pontos de parada, especialmente na região central da cidade e dos horários de circulação, melhoria dos atendimentos existentes, redução do intervalo das viagens e do custo operacional global do sistema.
A proposta foi aprovada pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Belo Horizonte (Setra-BH) e, segundo a BHTrans, ela será avaliada pelos técnicos da empresa.
Ausência dos cobradores
Em reunião da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, no dia 8 de julho, representante do Tarifa Zero BH, movimento que advoga que o transporte público não seja pago no momento do uso, mas, sim, por todos os cidadãos, por meio de impostos, afirmou que, caso 20% dos agentes de bordo fossem retirados do sistema, as empresas economizariam R$ 22,6 milhões.
A estimativa é resultado de um estudo realizado pelo Tarifa Zero BH e entregue ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) no último dia 11 de junho. De acordo com o estudo, para que as multas decorrentes do descumprimento da norma que exige a permanência dos agentes de bordo nos ônibus desestimulassem a prática ilegal por parte das empresas, seria necessária a aplicação de 32,8 mil multas. Segundo o movimento, as empresas receberam 8,7 mil multas em um ano, totalizando cerca de R$ 6 milhões.
Para o movimento, o potencial de economia anual com a demissão dos agentes de bordo seria de R$113 milhões. O cálculo foi feito tendo em vista que, de acordo com o Tarifa Zero, o custo mensal de cada agente de bordo para as empresas seria de R$2.168,74, sendo R$1.090,37 referentes ao salário; R$408,78 a encargos sociais; e R$669,59 a benefícios.
Exigência legal
O Conselho Comunitário de Segurança Pública (Consep) solicitou à Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário que sejam tomadas providências emergenciais para que seja cumprida a exigência legal de presença de agentes de bordo nos ônibus. De acordo com a Lei 8.224/01, cada veículo destinado aos serviços de transporte público coletivo e convencional de passageiros por ônibus deverá ser operado por um motorista e um agente de bordo. As exceções são os veículos das linhas troncais do sistema de Bus Rapid Transit (BRT), dos veículos em operação em horário noturno e nos domingos e feriados, e dos veículos dos serviços especiais caracterizados como executivos, turísticos ou miniônibus, que podem funcionar sem a presença do agente de bordo.
Além de agir para que as concessionárias garantam a presença dos agentes de bordo, o Consep solicita que a comissão fiscalize se as empresas de ônibus estão sendo devidamente autuadas e multadas nos casos de comprovado descumprimento da legislação a respeito da presença dos agentes de bordo.
Contratação de 500 cobradores neste mês
A Prefeitura determinou, no último dia 27 de agosto, aos representantes das empresas de ônibus, a contratação imediata de 500 cobradores, sem desvio de função e de maneira definitiva. Todos os cobradores terão que ser contratados até o final de setembro. Foi acordado ainda que as listas dos contratados sejam enviadas semanalmente para acompanhamento e fiscalização da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário da Câmara de BH e da BHTrans. No dia 24 de agosto, a PBH havia declarado que sem o retorno dos agentes de bordo para os coletivos não haverá aumento da passagem em 2019 na capital.
Por lei, a BHTrans só permite a saída do agente de bordo no horário noturno, a partir das 20h30 até as 5h59, definido pela comissão paritária e registrado em ata, mas a lei não tem sido cumprida em Belo Horizonte. Em 2019, foram aplicadas 5.098 multas em seis meses, média de mais de uma por hora na cidade.
Questionamentos
O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra/BH) mostra-se favorável à diminuição gradativa dos chamados agentes de bordo, discordando das autuações aplicadas pela BHTrans e alegando que existem mais linhas além das 25 troncais do Move, que também são consideradas do sistema, e por isso poderiam rodar em qualquer horário sem cobradores.
Outro questionamento do Setra/BH diz respeito ao horário da obrigatoriedade dos agentes de bordo. Para as empresas, a liberação deveria ocorrer a partir das 18h e não das 20h30, pois esse é o período de maior percentual de uso do cartão BHBUS nas viagens. O Setra informou que vai acatar a determinação do prefeito Alexandre Kalil de contratar 500 novos agentes de bordo até o final de setembro.
Com novo fôlego desde o início deste ano, a proposta de criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar os contratos da BHTrans junto às empresas concessionárias do transporte coletivo já soma 11 assinaturas. Para viabilizar a CPI é necessário o apoio de 14 parlamentares. No momento, assinam o documento Arnaldo Godoy (PT), Bella Gonçalves (Psol), Cida Falabella (Psol), Fernando Borja (Avante), Gabriel (PHS), Gilson Reis (PCdoB), Mateus Simões (Novo), Dr. Nilton (Pros), Pedro Bueno (Pode), Pedro Patrus (PT) e Ronaldo Batista (PMN).
Desde 2017, os parlamentares vêm cobrando transparência nas planilhas de custos e lucros das empresas. Reivindicação antiga de movimentos sociais, a apuração dos contratos foi tema de Comissão Especial criada pelos parlamentares para acompanhar a auditoria contratada pela Prefeitura. Segue em debate na Câmara a demanda pela criação de uma CPI que permita a abertura da “caixa preta” da BHTrans.
Projetos de lei em tramitação
As empresas concessionárias do transporte coletivo que reincidirem no descumprimento de norma que determina a contratação e manutenção de agentes de bordo nos veículos podem ter as concessões públicas cassadas. A punição está prevista no Projeto de Lei 723/19, de autoria do vereador Pedro Bueno (Pode), que tramita na Casa em 1º turno.
Tramitando também em 1º turno, o Projeto de Lei 745/19, de autoria do vereador Jair Di Gregório (PP), proíbe o motorista dos ônibus de exercer, cumulativamente, as funções de direção e cobrança, à exceção dos veículos das linhas troncais do BRT e dos veículos dos serviços especiais caracterizados como executivos, turísticos ou micro-ônibus. Para o autor, a duplicidade de função resulta em fator de desatenção do motorista para conduzir o veículo, podendo causar acidentes de trânsito, além de constituir-se em desvio de função.
Já o PL 1627/15, de Fernando Luiz (PSB), que também tramita em 1º turno, determina que o serviço de transporte público coletivo e convencional de passageiros por ônibus seja oferecido pelo Município de forma adequada e compatível com as necessidades dos usuários, de modo que os veículos utilizados na prestação do serviço atendam a alguns requisitos. Entre as exigências, o serviço deve apresentar tomadas para recarga de celulares, acesso a internet, ar condicionado e acessibilidade. Para o autor, a proposta cria possibilidades para que o Município coloque gradualmente em circulação veículos modernos, sem onerar os cofres públicos.
Superintendência de Comunicação Institucional