Infectologista explicou risco de contágio dos pais, que afetou reabertura de escolas
Membro do Comitê de Enfrentamento à Covid-19, Carlos Starling alertou que pandemia já deixou mais de 130 mil órfãos no Brasil
Foto: Bernardo Dias/CMBH
Informações fundamentais sobre o funcionamento do Comitê de Enfrentamento à Covid-19, criado pela Prefeitura em março de 2020, foram repassadas aos vereadores durante depoimento do infectologista Carlos Starling à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, realizado nesta quinta-feira (12/8). O médico, que faz parte do Comitê, disse que, entre os motivos para a reabertura mais criteriosa de escolas em BH, está a possibilidade de transmissão das crianças para os pais, mais propensos a desenvolver a doença. “A incidência em crianças vem aumentando no mundo inteiro. Já são 130,3 mil órfãos no Brasil”, lembrou Carlos Starling, citando estudo publicado na Revista Lancet, importante periódico sobre pesquisas científicas. “Nesse número, temos 25.608 óbitos de mães”, disse o médico. O infectologista afirmou, ainda, que a PBH tem monitorado a variante Delta, que é oito vezes mais contagiosa. A CPI debateu também outros temas, como a redução nos prazos de respostas, veja aqui como foi.
Infectologista com mais de 30 anos de carreira, Carlos Starling é referência nacional e internacional na área, sendo responsável por inúmeras pesquisas e autor de diversos artigos científicos. Ele foi convocado a depor a pedido dos vereadores Nikolas Ferreira (PRTB) e Flávia Borja (Avante). Starling também é especialista em medicina preventiva e social pela UFMG e compõe o Comitê de Enfrentamento desde a sua criação, em março do ano passado.
Um dos assuntos mais tratados durante a oitiva foi a função do Comitê de Enfrentamento e se ele fiscaliza o que está acontecendo na cidade. Segundo Starling, o grupo é consultivo e tem como principal função debater e orientar o Executivo sobre assuntos ligados à pandemia. “Não é função do comitê fiscalizar. Nossa função é orientar, não é fiscalizar comércio e escola. Somos orientadores de princípios técnicos. Nossa recomendação é de redução de mobilidade social”, explicou o infectologista. De acordo com o médico, as questões de execução do plano são de responsabilidade dos secretários das pastas e do prefeito. “Houve omissão do prefeito quanto à fiscalização?”, perguntou Flávia Borja, que foi respondida prontamente pelo depoente. “Não posso afirmar isso. Não é função minha julgar e fiscalizar. Essa é uma função da senhora”, disse o médico.
Critérios para abertura e fechamento de atividades
Flávia Borja também quis saber sobre os critérios utilizados para definir o funcionamento das atividades na cidade. Segundo ela, o Comitê adotou recomendação do CDC (Centro de Controle e Doenças dos Estados Unidos) por mais de um ano e, quando as escolas iam abrir, o protocolo deixou de ser adotado. “É preciso contextualizar a sua fala. O controle CDC foi adotado por causa da respeitabilidade do órgão. Depois vimos que a nossa realidade epidemiológica é outra. O CDC recomendou retirada de máscaras, julgando que haviam avançado na vacinação, assim como Israel. Medidas específicas para estes países podem ser incompatíveis com a gente, longe da nossa realidade”, explicou Carlos Starling, contando que BH passou a usar os chamados velocímetros, que levam em consideração a ocupação de leitos e os índices de transmissão. “Trabalhei no CDC. Todos nós estamos aprendendo e não há nada demais em propor estratégias diferentes dos EUA”, disse o especialista. Sobre o avanço da variante Delta, preocupação também levantada pelos parlamentares, o médico afirmou que ela é de 5 a 8 vezes mais contagiosa e, como não há vacinas suficientes para imunizar pelo menos 80% das pessoas rapidamente, medidas de isolamento devem continuar sendo tomadas.
“Não poderíamos manter outras medidas do CDC?”, voltou a perguntar Flávia Borja, querendo ainda saber em qual estudo científico o Comitê tem se embasado. “Os velocímetros estão sendo usados em várias cidades, inclusive no Minas Consciente. Nós publicamos este trabalho no Congresso Europeu de Doenças Infecciosas, ocorrido em Viena. Utilizamos métrica usada pela John Hopkins (instituição de ensino superior localizada em Maryland – EUA) e pela Universidade de Oxford (Inglaterra)”, explicou o médico. Citando as escolas fechadas, Flávia quis saber ainda por qual motivo é utilizada métrica diferente de outros estabelecimentos para o funcionamento. “As escolas estão preparadas. O senhor foi às escolas?”, perguntou a vereadora. “Recebemos documentos e fizemos reuniões com amplos setores da sociedade. O protocolo da PBH foi feito e publicado. Nós adotamos essa métrica para ter algo mais palpável e mais sensível. O conhecimento de trás pra frente é fácil, mas fomos aprendendo e evoluindo ao longo do ano passado e desse ano. Devemos cada vez mais nos preocupar com as crianças, pois há um avanço cada vez maior sobre elas”, defendeu Carlos Starling, explicando que os protocolos definem 2 metros de distância entre os alunos quando houver 200 casos por 100 mil habitantes.
O papel do Prefeito Kalil e a formação do Comitê
Outro tema tratado durante a reunião foi o papel do prefeito Alexandre Kalil (PSD) no fechamento e abertura da cidade. Perguntado por Nikolas Ferreira (PRTB) se o prefeito acatou todas as orientações do Comitê, Carlos Starling explicou que “a grande maioria sim. Não me lembro de uma oportunidade onde não tenha acatado. Há muito debate. Um debate veemente, principalmente quanto à mobilidade e ao comércio. As aberturas e os fechamentos que ocorreram sempre aconteceram por determinação dele”, disse o depoente. “É o Comitê que define horários e fechamento?”, voltou a perguntar Nikolas. O infectologista explicou que há uma recomendação genérica e algumas, como sobre a venda de bebidas, estão em contexto de evitar aglomerações. Sobre a vacinação, Carlos Starling afirmou que não há participação do Comitê, que este somente orientou a PBH no sentido de seguir o plano nacional de vacinação. A informação foi dada em resposta ao vereador José Ferreira (PP).
Starling respondeu ainda sobre a formação do Comitê. Segundo a vereadora Fernanda Pereira Altoé (Novo), há orientação do Ministério Público de Minas Gerais para que o Comitê seja interdisciplinar, o que não estaria sendo cumprido. “A composição do Comitê não fomos nós quem definimos. Somos convidados a participar. Se nós fôssemos fazer o comitê multifuncional, com o espectro da doença, seria muito difícil tomar decisão. Ele é multifuncional e multidisciplinar na medida em que temos amparo de toda a máquina pública para dados e intervenções”, disse Carlos Starling. De acordo com ele, secretários de todas as áreas do Executivo participam dos trabalhos quando o tema a ser tratado é de sua esfera de competência.
Relatório vai ser feito conforme o escopo da CPI
Relator dos trabalhos da CPI da Covid-19, Irlan Melo (PSD) fez questão de se limitar a perguntas direcionadas aos gastos da Prefeitura com a pandemia. “Considero que o foco da CPI são os gastos do dinheiro público e por isso gostaria de saber se o senhor definiu qualquer gasto, indicou ou participou da definição?”, disse Irlan. Segundo o depoente, não é função do Comitê definir gastos. “Não. Não tenho acesso a nenhum tipo de informação nessa área e nem tenho a menor noção de onde e quanto a PBH gasta. Não é nossa atribuição”, explicou o médico, respondendo ainda que não recebeu nenhum valor da PBH e também não participou de negociação entre PBH e UFMG para doação de recursos por parte do Executivo. “Como pesquisador, sou ligado à Fiocruz, como professor e sem remuneração”, disse Starling.
A explicação sobre o escopo da investigação, dita por Irlan, foi questionada por Flávia Borja. Ela afirmou que é importante que todos desempenhem com profissionalismo o trabalho na CPI e que não se deve fazer apenas “perguntas brancas para o gestor falar bem de seu trabalho”. Irlan respondeu à vereadora explicando que cabe a cada parlamentar fazer a pergunta que melhor lhe convém, mas que ele, ao perguntar e ao fazer o seu relatório, vai “respeitar o escopo da CPI. Não estou aqui para passar pano pra ninguém”, garantiu o relator.
Participaram da reunião os vereadores Jorge Santos (Republicanos), José Ferreira, Bruno Miranda (PDT), Nikolas Ferreira, Flávia Borja, Irlan Melo e Professor Juliano Lopes (Agir), presidente da Comissão.
Confira aqui a íntegra da reunião.
Superintendência de Comunicação Institucional