Por falta de clareza, proposta que prevê subsídio às passagens não é recebida
Texto do Executivo foi enviado no último dia 15. "Rua para todos", que amplia áreas de lazer, é aprovado em 1º turno
Foto: Karoline Barreto/CMBH
Após identificar falta de clareza e uso de termos ambíguos e expressões inespecíficas no texto, a presidente Nely Aquino (Pode), amparada no Art. 99 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Belo Horizonte, concluiu pelo não recebimento do projeto de lei que autoriza a concessão, por parte do Município, de contribuição pública para a modicidade tarifária no transporte coletivo. De autoria do Executivo, a medida concede subsídio ao valor da passagem de ônibus para a população economicamente mais vulnerável da Capital. A proposta seria viabilizada a partir da utilização de parte do montante de cerca de R$ 220 milhões que a Prefeitura repassou às empresas de ônibus durante a pandemia, quando os empresários justificaram que a queda da quantidade de passageiros poderia inviabilizar a continuidade dos serviços. Ao não receber o PL, Nely destacou que o texto necessita de correções e que as urgências do prefeito não podem atropelar o processo legislativo. Na reunião do Plenário desta quinta-feira (3/3), parlamentares divergiram sobre a decisão; maioria manifestou concordância. Na reunião, também foi aprovado, em 1º turno, PL que cria o programa Rua para todos, que prevê a possibilidade de fechamento, total ou parcial, de trechos de ruas e avenidas, aos domingos e feriados, em cada um das nove regionais da cidade. Objetivo é ampliar as áreas destinadas ao lazer, atividades culturais, esportivas e de recreação nas vias públicas da cidade.
Falta de clareza e expressões ambíguas
Em dezembro do ano passado, o prefeito Alexandre Kalil (PSD) anunciou a diminuição de R$ 0,20 nas passagens, reduzindo a tarifa para R$4,30 a partir de fevereiro de 2022. Segundo a proposta da PBH, a gratuidade seria efetivada a partir de projeto de lei a ser encaminhado por ele e aprovado pela Câmara Municipal. Entretanto, desde o retorno dos trabalhos legislativos, no início do mês de fevereiro, a Casa tem buscado informações sobre o projeto, inclusive por meio do envio de ofícios, porém a medida acabou por chegar à Câmara apenas no último dia 15.
Após considerar ressalvas ao texto feitas pela equipe técnica da Casa, a presidente decidiu por não receber a proposta. Em ofício dirigido ao prefeito, a chefe do Legislativo ressalta que, dentre outros trechos, o Art. 2° padece de falta de clareza, pois remete regra geral a contrato inespecífico, em decorrência do uso da expressão "previstos em contrato". Já o Art. 5° determina que o subsídio proposto deverá ser objeto de termo aditivo ao "contrato de concessão", tratando-se de expressão inespecífica, o que impossibilita determinar quais contratos de concessão serão afetados pelo novo subsídio.
Decisão atende a técnica
Nely lembrou o disposto no Art.99 do Regimento Interno, que estabelece que o (a) presidente somente receberá a proposição que esteja redigida com clareza, observância da técnica legislativa, do estilo parlamentar e não constitua matéria prejudicada. Com a decisão, a medida retorna ao Executivo, que poderá promover ajustes ao texto e reapresentá-lo.
Ao repercutir a posição da presidente, o líder de governo, Léo (PSL), se disse surpreso com a decisão, afirmou não ver falta de clareza no texto e defendeu a necessidade de discussão. "Quando se diz que não tem clareza, a gente tem apenas que lamentar, porque questões levantadas estão descritas no texto. Se há alguma dúvida, podemos melhorar, é por isso que o PL tramita em dois turnos, para ser debatido pelos vereadores aqui da Casa", afirmou.
Também o vice-líder Bruno Miranda (PDT) e Bella Gonçalves (Psol) lamentaram a impossibilidade de iniciarem o debate em torno do projeto. Segundo a parlamentar do Psol, a cidade vive um caos na transporte coletivo, com empresários sabotando e chantageando com retiradas de ônibus e interrupções de viagens. Para ela, a falta de diálogo só aumenta o transtorno vivido pela população. "Há uma dificuldade de se construir um diálogo entre Câmara e Prefeitura. E esta é a primeira vez que vejo um PL ser devolvido sem ser lido e discutido. Este é um debate político que deve ser feito entre a Prefeitura e os vereadores eleitos", destacou.
Caos construído ao longo dos anos
Replicando Bella Gonçalves, Nely lembrou que o diálogo com o prefeito foi buscado e que não é possível, pelas regras regimentais, debater projeto que já contém erros. "Venho pedindo o diálogo desde o início. Mas eu não posso agora atropelar o regimento para atender as urgências do prefeito. Não existe nada de político nesta fase, a política não intervém. A análise é tratada e decidida pela equipe técnica desta Casa", afirmou a presidente, ressaltando que não irão jogar para a Câmara Municipal a responsabilidade de um caos conduzido com incompetência ao longo dos anos.
Também Professor Juliano Lopes (Agir), Wanderley Porto (Patri) e Braulio Lara (Novo) se posicionaram a favor do não recebimento da proposta do Executivo e lembraram que o diálogo foi interrompido pelo prefeito com o encerramento unilateral das atividades do comitê conjunto que iria analisar a questão das tarifas de ônibus na cidade. Segundo Braulio, após encerrar o comitê, o prefeito começou a se reunir a portas fechadas com os empresários de ônibus e não se sabe o que está em discussão, sendo prudente que a proposta não venha a tramitar da forma como chegou. "Quando o assunto é transporte público não abro mão de que as contas sejam colocadas sobre a mesa e sejam transparentes; tratadas com seriedade. A proposta (do Executivo) apenas cria mais uma 'caixa preta'. Hoje pela manhã entramos com uma ação pedindo a suspensão dos efeitos destes acordos (dos repasses dos R$ 220 milhões) até que tudo isso fique claro e transparente", afirmou.
Democratização dos espaços de lazer
Na pauta do Plenário e com 36 votos favoráveis e apenas 1 contrário, os parlamentares aprovaram, em 1º turno, o PL 183/2021, que institui o Programa “Rua para todos". A proposta, de autoria da Professora Marli (PP), prevê que trechos de ruas e avenidas nas nove regionais da cidade sejam fechados, total ou parcialmente, aos domingos e feriados, de 10h às 16h, com o objetivo de oportunizar espaços de lazer, prática esportiva e atividades culturais. Conforme o projeto, os trechos a serem fechados serão definidos por decreto do Executivo, sugerindo-se ao menos um trecho por regional e em vilas e favelas, conforme demanda dos moradores. Nos locais onde for implantado o programa será proibido o trânsito de veículos, de forma total ou parcial.
Wanderley Porto, Claudio do Mundo Novo (PSD), Rubão (PP) e Bruno Miranda parabenizaram a autora da medida. O vice-líder de governo lembrou que quando foi secretário de Esporte da PBH, em 2013, fez um esforço para que o programa No Domingo a Rua é Nossa fosse ampliando para outros pontos da cidade e celebrou a iniciativa da parlamentar. "Expandir para outras regionais implica em algum trabalho de logística, porque é a BHTrans quem faz estes fechamentos, mas é muito válido e adianto meu voto sim", declarou.
O voto em contrário veio da vereadora Fernanda Pereira Altoé (Novo), que justificou reconhecer a relevância da medida, mas acreditar que ela poderia ser construída por meio de indicação ou uma conversa com a Prefeitura.
Professora Marli recordou que a ideia do projeto surgiu ainda durante campanha eleitoral, quando moradores da Pedreira Prado Lopes pediram por mais áreas de lazer com segurança e acessíveis às famílias da comunidade. "Existe o 'Domingo a rua é nossa', mas está concentrado na Região Centro-sul e mais uma vez a população das regiões mais carentes ficam à margem, convivendo com perigos do trânsito. O objetivo é democratizar os espaços de lazer, direito previsto na Constituição Federal", concluiu.
O PL tramitou na Comissão de Legislação e Justiça, recebendo parecer pela constitucionalidade, legalidade e regimentalidade, com apresentação de emenda; e teve parecer favorável da Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo; da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário; e da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana. A matéria retorna agora às mesmas comissões para análise de emenda que retira do texto determinação de dia e horário do fechamento das vias, o que seria de competência exclusiva da Prefeitura.
Assista ao vídeo com a íntegra da reunião.
Superintendência de Comunicação Institucional