UPAs da capital sofrem com sobrecarga de demanda e carência de especialistas
Remuneração pouco atrativa e condições inadequadas de trabalho foram citadas como principais motivos da falta de profissionais
Foto: Dara Ribeiro/CMBH
Deficiências no atendimento de pediatria, cirurgia geral e ortopedia nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Belo Horizonte foram debatidas nesta quinta-feira (28/11) na Comissão de Saúde e Saneamento. Dr. Bruno Pedralva (PT), autor da audiência, disse que recebeu diversas reclamações relacionadas às especialidades mencionadas, como falta de profissionais para suprir as demandas e poucos equipamentos que atendem ortopedia. Problemas estruturais, de qualificação da equipe e precariedade das ferramentas de trabalho também foram mencionados na audiência. O vereador alertou que o novo concurso público para a área da saúde anunciado pela Prefeitura não pode repetir o erro do certame anterior, que ofereceu poucas vagas, reforçando a importância de ter servidores efetivos na rede. Como encaminhamento, ele sugeriu que a Comissão aprove o envio de indicação ao Executivo para que o número de vagas no próximo edital seja equivalente ao número de contratos temporários e vagas desocupadas. Além disso, vai requerer formalmente os dados sobre as UPAs apresentados pelos participantes e disponibilizá-los para análise, bem como enviar outras sugestões colhidas durante a reunião, como a oferta de residências médicas nas unidades.
Falta de profissionais
Pediatra da UPA Nordeste, Yuri Figueiredo denunciou que a crise na especialidade se arrasta há anos e a falta de estrutura é responsável pela baixa fixação dos profissionais. Para ele, faltam incentivos, garantias e um bom plano de carreira para que o pediatra atenda na UPA "com o prazer que precisa, porque é um trabalho duro”. O médico destacou ainda que o atendimento a crianças requer um cuidado especial e atualmente não existe tempo hábil para o acolhimento ser feito com calma. Sobre o novo concurso, Yuri pediu que o edital seja revisto, pois o número de vagas ofertadas não condiz com a realidade da demanda. Marine Soares, pediatra da UPA Barreiro, confirmou que no último concurso da área foram oferecidas somente quatro vagas para pediatria, com a restrição de serem chamados no máximo cinco vezes esse número. “Só na minha UPA tivemos 12 aposentados, então não cobriu nem a nossa demanda”, declarou. Ela apontou ainda que o quantitativo de profissionais efetivos da pediatria está menor e o quadro vem sendo completado por generalistas recém-formados, que não estão prontos. O colega fez coro à afirmação, acrescentando que médicos novatos e inexperientes internam pacientes sem necessidade, por insegurança, o que sobrecarrega ainda mais a ala.
A gerente de Urgência e Emergência da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA), Kenya Vidal, afirmou que atualmente não há déficit de profissionais na especialidade. A gestora apresentou os números das equipes das UPAs, que somam 175 pediatras no total, sendo 50 efetivos e 125 com contratos administrativos. Ela reconheceu que o último certame ofereceu poucas vagas e que, no atual, sua Gerência participa de todas as discussões. Kenya citou as mudanças no edital que irão pontuar candidatos com mais experiência e qualificação na área. O secretário geral do Conselho Municipal de Saúde, William Marcos Ferreira, reiterou que o problema da pediatria é uma questão histórica não só da cidade, mas do próprio SUS. Ele também considera preocupante haver mais contratados que efetivos e anunciou que a construção do novo Plano Municipal de Saúde vai prever o aumento de trabalhadores nas unidades. Paulo Borges, presidente de conselhos distrital, destacou o esforço conjunto para melhorar a vida tanto dos profissionais como dos usuários. “Sou otimista e serei ainda mais quando todas as vagas forem preenchidas”, declarou, referindo-se à perspectiva do novo concurso.
A defasagem do serviço de radiologia por falta de técnicos nas unidades de Pronto Atendimento também foi apontada. Atualmente, somente um profissional atende como plantonista por 12 horas nos equipamentos. Carla Cunha, que trabalha na UPA Nordeste, afirmou que a categoria há muitos anos vem demandando a contratação de um segundo técnico. “Ao longo desses anos sentimos a falta de empatia com a categoria e principalmente com o usuário”, lamentou Carla, esclarecendo que o atendimento humanizado depende de mais profissionais. A técnica também denunciou casos de agressão e ameaças por pessoas que ficaram impacientes com o tempo de espera ao ter que aguardar o horário de almoço dos trabalhadores, por exemplo. Ela convidou os vereadores a fazer uma visita técnica para acompanhar a jornada do técnico em radiologia durante o plantão e constatar as dificuldades enfrentadas.
Poucas unidades e falta de incentivos
Outra especialidade que preocupa pela dificuldade em atender a demanda é a ortopedia, que atualmente é oferecida em somente quatro das nove UPAs do município. A conselheira distrital da UPA Norte, Maria das Graças Nascimento, relatou a falta de médicos e cirurgiões ortopedistas, principalmente nos fins de semana. A UPAs, segundo ela, têm perdido bons profissionais, que “estão sendo descartados como mercadorias vencidas”, e que é preciso fazer mais para mantê-los; além do incentivo financeiro, deve ser pensada a questão da “humanização”. Para Maria das Graças, a proibição de recém-formados nas salas de urgência e emergência precisa ser revista, já que médicos experientes estão ficando escassos e os novatos podem atuar com o suporte de veteranos. Dr. Bruno Pedralva acrescentou que é preciso um esforço do setor para oferecer residências médicas nas UPAs, que são espaços muito ricos de aprendizado, e que a presença do residente qualificaria o atendimento e o cuidado.
A representante da SMSA disse que, no total, existem apenas três vagas desocupadas na ortopedia e que a maioria dos profissionais são contratos administrativos. Kênia ponderou, no entanto, que nem todos os selecionados em concursos se apresentam para ocupar a vaga. Ela esclareceu que na área de cirurgia geral, por exemplo, de fato existe defasagem no quadro de profissionais e que a Secretaria está com dificuldades de cobrir as necessidades de todas as unidades; mas, que na última chamada de cirurgiões, nenhum dos quatro nomeados se apresentou. Ela admitiu que um dos motivos pode ser a falta de atrativos para o profissional, e que, com o número reduzido, há sobrecarga de trabalho para os médicos, que precisam atender a demanda de mais de um equipamento. A gerente disse que foi realizada uma reunião com os cirurgiões-gerais para apurar as principais necessidades da categoria, e que o mesmo seria feito com os ortopedistas.
Problemas estruturais
A precariedade das estruturas das UPAs, com destaque para Norte e a Nordeste, também foi abordada. A conselheira distrital da UPA Norte explicou que o equipamento fica numa área de muita vulnerabilidade e que, mesmo tendo problemas irreversíveis, a infraestrutura precisa melhorar. Yuri Figueiredo fez coro com Maria das Graças e relatou que a situação precária da UPA Norte sobrecarrega a UPA Nordeste, já que, quando a primeira está lotada, os atendentes orientam pacientes a procurarem a unidade da regional vizinha.
Rosemery Felipe, presidente do Conselho Distrital Nordeste, disse que a UPA da região tem vários problemas e, lembrando que duas empresas que executariam obras no lugar desistiram, questionou qual o prazo para a reforma começar. Segundo ela, o local é precário, precisa de ar condicionado, ventiladores e cadeiras novas, há paredes com rachaduras e a unidade não tem ortopedista por falta de uma sala para o atendimento. A conselheira enfatizou a necessidade de mais empatia com os profissionais da saúde, pois seu trabalho tem de ser feito com muito amor. Em resposta, a SMSA informou que até março de 2025 devem começar as obras nas unidades Nordeste, Oeste e Barreiro; em janeiro na de Venda Nova e em fevereiro na da Pampulha.
Sobre a UPA Centro-Sul, o presidente do Conselho Distrital da região, Sergio Hirle de Souza, pediu apoio para conseguir novos equipamentos. Dr. Bruno Pedralva reforçou o apelo, explicando que essa é a única unidade que ainda não tem um aparelho de raio-x digital, mais moderno, e que também irão lutar para conseguir aparelhos de ultrassom para as salas de emergências.
Tempo de espera
O representante da UPA Barreiro chamou atenção para o fato de os indicadores no Plano Municipal de Saúde e no Relatório Anual de Gestão mostrarem que o tempo de espera nas UPAs, que era de cinco horas em 2022, passou para sete horas em 2023, e que é preciso investigar os motivos. Jadir apontou ainda que a maioria dos pacientes nas UPAs recebem pulseiras verdes (que indicam pouca urgência para o atendimento), e que é necessário saber por que isso acontece, se os centros de saúde não estão comportando a demanda.
Hernane Ferreira Leandro, conselheiro do Centro de Saúde Noraldino de Lima, opinou que a qualificação dos usuários que compõem os conselhos também é importante para a resolução dos problemas. Ele acredita que tudo o que foi apontado decorre da inexistência de um plano integrado de comunicação para mobilização social, e que os dados apresentados durante a discussão são importantes para a definição de metas e para que “se saia da mesmice”.
Assista à reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional