EDUCAÇÃO BÁSICA

Pais de alunos querem exceções claras para restrição de uso de celular

Preservação de direitos e alinhamento de conduta nas instituições foram alguns dos temas abordados em audiência pública

quarta-feira, 26 Março, 2025 - 16:15
Celular em cima de livreto

Fotos: Rafaella Ribeiro/CMBH

Vereadores, pais de alunos e representantes de associações civis demonstraram preocupação com a proibição total do uso de celulares em escolas durante audiência pública realizada nesta quarta-feira (26/3) pela Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo. A interpretação mais radical da Lei Federal 15.100, de 2025, que restringe o uso de aparelhos eletrônicos em instituições públicas e privadas de educação básica, impediria os estudantes de fazer contato externo durante emergências ou filmar situações consideradas abusivas ou excessivas. O idealizador do encontro, Uner Augusto (PL), se comprometeu a enviar uma indicação à administração pública para que as escolas tenham cartazes informando quais são as situações em que o aluno pode utilizar o celular.

Ruído de comunicação

De acordo com Uner, o principal objetivo da audiência foi deixar claro quais são os direitos e deveres dos estudantes e professores dentro da nova lei. Segundo o autor do requerimento que solicitou a reunião, apesar da lei dizer sobre a “regulamentação do uso de aparelhos eletrônicos”, a maioria das pessoas acha que a legislação proíbe a utilização desses objetos em qualquer circunstância. No entanto, a norma prevê algumas exceções para a regra, que são: situações de estado de perigo; necessidade ou caso de força maior; e para garantir acessibilidade, inclusão, direitos fundamentais e atender questões de saúde. Uner também relatou que, em visitas a escolas municipais, encontrou cartazes fixados nas paredes com o desenho de um celular dentro do símbolo de proibido, mas não havia nenhum informativo sobre situações em que o aluno poderia utilizar o aparelho.

A advogada da Rede de Profissionais Pró-Família, Dra. Marilia Rodrigues Araújo, fez uma breve explicação sobre as três primeiras exceções citadas na lei, usando exemplos que poderiam acontecer nas salas de aula e que demandariam o uso do celular, como incêndios, desastres naturais, ameaça de violência, entre outros. A convidada citou ainda o Decreto Federal 12.385, que pretende regulamentar a Lei 15.100, porém, com a “proibição do uso” dos aparelhos. Para Marília, o decreto não tem validade, porque contradiz a lei, que por hierarquia normativa prevalece sobre ele.

Integrante da Confederação Nacional das Associações de Pais de Alunos (Confenapais), Adriana Marra afirmou que, no projeto original, quando começaram as discussões no Conselho Nacional de Educação, não existiam exceções sobre o uso dos dispostivos. Segundo ela, o Confenapais e outras instituições se manifestaram solicitando que fosse incluídas ressalvas indicando quando o celular era permitido, diante da preocupação com situações que podem gerar riscos ao estudante.

Proteção de direitos fundamentais

Um dos cenários em que o celular é permitido é para assegurar os direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal, como direito à vida, liberdade, segurança e igualdade. Caso o jovem tenha alguma dessas prerrogativas desrespeitadas, ele poderia gravar um vídeo ou áudio, por exemplo, ou chamar por ajuda. Sobre isso, a Dra. Marília Araújo informou sobre uma portaria da Secretaria Municipal de Educação (Smed) que determina que os telefones fiquem desligados e guardados na mochila durante a aula. A advogada pontuou que essa restrição poderia impedir que o estudante se defenda no caso de violação dos direitos.

Flávia Borja (DC) expressou sua preocupação com o dispositivo, afirmando que defende o direito da família educar o filho de acordo com seus princípios e que até hoje situações em que isso foi desrepeitado só vieram à tona através de gravações pelo celular. A vereadora concorda que é preciso restringir o uso durante a aula, porém, acredita que o aparelho é uma ferramenta importante para provar “abusos e excessos” nas escolas.

Além disso, outra preocupação manifestada foi em relação à segurança dos estudantes. A presidente da Associação Guardiões da Infância e da Juventude, Luciana Haas, apresentou dados sobre violência nas escolas, argumentando que as instituições de ensino não são ambientes completamente seguros, e que os jovens precisam poder utilizar aparelhos eletrônicos para se defender. A convidada reforçou que a lei é clara sobre o uso, e, portanto, ao determinar que os celulares fiquem desligados, as escolas estariam contrariando o texto.

Representante da Smed, César Eduardo de Moura afirmou que a secretaria vai avaliar internamente a possibilidade de rever a obrigatoriedade dos celulares desligados. Ele ponderou que medidas da envergadura da Lei 15.100 são muito complexas já que é necessário lidar com um grande número de atores, e que muitas vezes as pessoas se apropriam de maneiras diferentes de um mesmo dispositivo legal, gerando divergência de interpretações.

Orientação das escolas

Mãe de dois adolescentes, Adriana Martins relatou um caso em que seu filho teve o celular apreendido por fazer uso do aparelho dentro da escola, antes do horário de aula. O jovem mandou uma mensagem para a mãe, em uma rápida interação, mas que foi suficiente para que o porteiro o repreendesse e para que seu aparelho fosse confiscado. Na ocasião, Adriana foi chamada no estabelecimento e a coordenadora solicitou sua assinatura em documento que dizia que a mãe estava ciente de que o filho havia cometido uma transgressão. Adriana questionou a abordagem, afirmando que o tratamento era desproporcional à situação.

Uner também citou casos em que estudantes precisaram sair da escola para pedir transporte por aplicativo por conta da proibição do celular. O vereador disse que, por meio de relatos como esses e de Adriana, percebe-se que a orientação geral “é proibir e pronto”, por desconhecimento das exceções previstas, e que isso pode prejudicar os alunos. Tileléo (PP), que acompanhou a reunião, afirmou que é preciso discutir a capacitação de professores, coordenadores e diretores, com uma metodologia de implantação da lei nas escolas. “O que está acontecendo é um desencontro das informações", acentuou. Luciana Haas concordou com o vereador, citando que o Ministério da Educação (MEC) possui um guia chamado “Celulares e escolas”, em que a orientação é que as consequências para quem desrespeitar as regras tenham caráter educativo, sem punições excessivas, priorizando o aprendizado.

A chefe de gabinete da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), Rosa Vani Pereira, esclareceu que a orientação da pasta é que o trato deve ser didático, principalmente com adolescentes, que tendem a ser mais resistentes.”Quando você faz isso de forma dialogada, os próprios adolescentes viram guardiões da regra”, reiterou.

Uso pedagógico

Representantes da Smed apontaram que a proibição do uso de celulares durante a aula existe no Regimento Interno da Rede Municipal desde 2015. Segundo César de Moura, a grande novidade da lei é a abordagem pedagógica da questão, dizendo da necessidade de trabalhar a educação midiática, o desenvolvimento de competências dos estudantes para lidarem com redes sociais e o problema do excesso de telas. Para Rosa Vani, o desafio é utilizar essas tecnologias a favor da educação. Ela acredita que “não há como fugir” da presença dos aparelhos eletrônicos, e que é preciso refletir sobre seu uso de forma que eles contribuam com a formação dos estudantes.

Encaminhamentos

Uner Augusto afirmou que fará uma indicação à Prefeitura solicitando que sejam fixados nas escolas cartazes com as situações em que os estudantes podem utilizar dispositivos eletrônicos. O vereador também disse que vai se reunir com os representantes da pasta de educação que participaram da audiência para que possam elaborar uma estratégia de implementação da lei que seja efetiva e atenda a famílias, alunos e instituições. Para ele, o melhor caminho é a parceria das famílias com as escolas, que devem permanecer em diálogo constante.

Assista à reunião completa.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública - Finalidade: Discutir a Lei Federal nº 15.100, de 13 de janeiro de 2025, que dispõe sobre a utilização, por estudantes, de aparelhos eletrônicos portáteis pessoais nos estabelecimentos públicos e privados de educação básica